Reforma tributária: Entenda as regras de transição para o IBS e a CBS

Aprovada no ano de 2023, a reforma tributária busca trazer a simplificação do sistema tributário do país, com a instituição do IVA Dual. Composto pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o IVA Dual substituirá os atuais tributos ISS, ICMS, IPI, PIS e Cofins. Outro tributo que passará a ser cobrado é o Imposto Seletivo (IS). Mas até a total aplicação da reforma, um longo caminho se dará: o chamado período de transição. A transição vai exigir do governo e das empresas diversas adaptações, como de sistema e controle. Na prática, serão oito anos em que ambos terão que lidar, ao mesmo tempo, com o sistema tributário antigo e o novo. E essa fase para a implantação da reforma, conforme a Emenda Constitucional nº 132, já se inicia no ano que vem. Para esclarecer os principais pontos desse período, os advogados Gabriel Caldiron e Renata Colafêmina, sócios do Machado Associados, explicam quais deverão ser seus principais desafios e oportunidades em seis perguntas e respostas: 1. Como será o período de transição até a total implementação da reforma tributária? Segundo determinado na pela Emenda Constitucional n°132/2023, a implementação da reforma tributária será gradual com um longo período de transição até 2033, durante o qual coexistirão o atual e o novo sistema tributário. A partir de 2026, o IBS terá uma alíquota de 0,1% e a CBS de 0,9%, sendo dispensado o recolhimento de quem cumprir as obrigações acessórias previstas na legislação. Eventual montante recolhido poderá ser compensado com PIS/Cofins ou, em não havendo débitos suficientes a serem compensados, com quaisquer outros tributos federais, ou ressarcido em espécie. Em 2027, o PIS e a Cofins serão extintos, dando lugar à cobrança efetiva da CBS, bem como entra em vigor o Imposto Seletivo. Além disso, o IPI passará a ter alíquota zero, exceto para os produtos industrializados na Zona Franca de Manaus. Em 2027 e 2028, o IBS será cobrado à alíquota de 0,1% e a CBS será reduzida em 0,1 ponto percentual. De 2029 a 2032, as alíquotas de ICMS e de ISS serão reduzidas em 10% ao ano, com cobrança gradual de IBS. A partir de 2033, o novo sistema tributário estará plenamente implementado. 2. Quais os desafios para a transição da reforma tributária? Em razão das profundas alterações na tributação sobre o consumo, os desafios para os negócios são inúmeros. Vão desde a compreensão da nova legislação à implementação dos novos tributos, considerando a internalização deles na precificação, negociações com clientes e fornecedores, adaptação de rotinas fiscais etc. Em termos de carga tributária, deverá ser criada uma nova mentalidade acerca da forma de tributação sobre o consumo, abandonando-se os paradigmas antigos em detrimento dos novos princípios de simplicidade, neutralidade e sistema de créditos amplos. Assim, por exemplo, diante do amplo direito a créditos, não se deverá observar apenas eventual aumento nominal de carga tributária de fornecedores, sem considerar que esta poderá ser inteiramente neutra. Também não se poderá ter medo de discutir com clientes o aumento de tributos sobre preços, sem considerar que, a depender do caso, tais tributos serão inteiramente recuperados pelo adquirente. Contudo, é certo que um dos maiores desafios reside no período de transição, pois, além das dificuldades de internalização e operacionalização de novas regras, os contribuintes terão que conviver até 2033 com dois sistemas de tributação sobre o consumo completamente diferentes entre si. Assim, os contribuintes deverão compatibilizar os desafios da implementação do novo sistema com os percalços do atual sistema. Por outro lado, considerando que a “cobrança teste” do IBS e da CBS se iniciará em 2026, há muita preocupação em relação à ausência de definição quanto à implementação prática desses tributos, dada a ausência, até o momento, da instituição das obrigações acessórias e outros aspectos práticos. Com efeito, teme-se que os contribuintes não tenham tempo hábil para adaptar sistemas e rotinas para cumprir com a nova legislação tributária. Além disso, diante da ausência de definição das alíquotas do IBS e da CBS, há muita insegurança quanto à previsibilidade para um planejamento preciso de atividades, negociações, precificações etc. 3 – Quais as recomendações para as empresas melhor se prepararem para a transição? Um ponto importante é a necessidade de as empresas ajustarem seus sistemas de gestão tributária para, além das alíquotas e obrigações acessórias ainda em curso até o final da vigência do ISS, do ICMS e do PIS e da COFINS, contemplarem gradativamente também as novas alíquotas do IBS e da CBS, destacadas de forma “por fora” nas notas fiscais. Além disso, é fundamental que os sistemas estejam preparados para registrar e controlar os créditos financeiros mais amplos em relação às aquisições realizadas, considerando o princípio da não cumulatividade plena, que em linhas gerais permite o aproveitamento de créditos sobre toda a cadeia de custos e despesas relacionados à atividade empresarial. É recomendável que as empresas realizem simulações financeiras para avaliar se a nova sistemática resultará em maior custo tributário, considerando a complexidade, o fim dos benefícios fiscais e as peculiaridades de cada atividade econômica. Sugere-se, ainda, que sejam revistos os contratos vigentes, avaliando os efeitos da reforma e evitando ambiguidades e conflitos. Quanto aos novos contratos, também se faz providencial a inclusão de cláusula que acomodem a implementação da reforma tributária. 4 – O PL 108, que ainda não foi aprovado pelo Congresso, poderá impactar o período de transição? Sim. A efetiva estruturação e operacionalização da fiscalização e cobrança do IBS estão condicionadas à aprovação do PLP nº 108/2024 pelo Congresso Nacional. Esse projeto dispõe sobre aspectos essenciais, incluindo a instituição do Comitê Gestor – órgão central responsável pela administração e fiscalização do IBS –, a distribuição do produto da arrecadação entre os entes federativos, as regras de transição do ICMS para o IBS, bem como a definição de infrações, penalidades, encargos moratórios e o contencioso administrativo do referido tributo. Destaca-se que, embora a fase inicial de testes para a cobrança do IBS e da CBS esteja prevista para janeiro de 2026 e a aprovação do PLP deva ocorrer até meados deste ano, persistem lacunas regulatórias relacionadas à apuração, fiscalização e cobrança desses tributos. Tal cenário pode comprometer a efetividade e tempestividade da transição para o novo sistema tributário, em conformidade com as disposições da Emenda Constitucional nº 132/2023 e da Lei Complementar nº 214/2025. 5 – Como será se o contribuinte quiser questionar uma autuação fiscal nesse período? Há risco de multa? No modelo de IVA Dual aprovado, a competência para a fiscalização e cobrança do IBS é compartilhada entre Estados, Distrito Federal e municípios, enquanto a CBS permanece sob competência exclusiva da União. Caso aprovado pelo Congresso Nacional, o PLP nº 108/2024 disciplinará as infrações, penalidades e o contencioso administrativo do IBS, enquanto o contencioso da CBS seguirá regido pela legislação federal já existente sobre processo administrativo e penalidades. Entretanto, mesmo com a aprovação do PLP nº 108/2024, subsistem pendências regulatórias fundamentais para a efetivação do lançamento de ofício do IBS e da CBS. Dentre essas, destacam-se a necessidade de regulamentação das obrigações acessórias aplicáveis a ambos os tributos, a definição dos mecanismos de compartilhamento de informações entre as administrações tributárias estaduais, distrital, municipais e a Receita Federal, bem como a normatização dos procedimentos relativos à fundamentação e à produção de provas no âmbito do contencioso administrativo fiscal. Além disso, a partir de 2026, o período de transição para o novo sistema tributário prevê a implementação de uma “cobrança teste” de 1% para o IBS e a CBS, com dispensa do pagamento caso sejam observadas as obrigações acessórias correspondentes. Assim, embora não se possa afastar a possibilidade de autuações fiscais em razão do descumprimento de obrigações principais ou acessórias já a partir desse período, é imprescindível que os contribuintes atentem para as disposições legais e regulamentares que disciplinarão o contencioso tributário. Tal diligência é essencial para assegurar o pleno conhecimento das regras do processo administrativo fiscal e das penalidades aplicáveis, resguardando, de forma efetiva, o direito ao contraditório e à ampla defesa na tutela de seus interesses. 6 – Mesmo com essa transição, a reforma resultará em aumento de tributos? Neste momento ainda não há uma definição das alíquotas de IBS e CBS, apesar de se falar extraoficialmente em torno de 28%. Numa primeira vista, pode-se parecer que a reforma tributária resultará numa tributação demasiadamente elevada. Contudo, o que faz é escancarar a elevada carga tributária que o Brasil já possui e que, por vezes, fica disfarçada por regimes diferenciados, benefícios fiscais e inúmeras distorções que geram custos tributários, além dos próprios custos de conformidade. Evidentemente, analisando-se apenas a alíquota incidente sobre a operação, pode parecer que haverá um aumento de carga tributária, como ocorre, por exemplo, com serviços, em que há uma tributação nominal de até 5% de ISS e 9,25% de PIS e Cofins. Por outro lado, a reforma tributária implementou uma sistemática ampla de créditos para o IBS e CBS, de forma que virtualmente todas (com poucas ressalvas) as aquisições de bens e serviços gerarão créditos a serem descontados do IBS e da CBS devidos. Isso impactará significantemente nos custos de aquisições, visto que atualmente diversas compras não geram créditos, resultando em custos tributários não recuperáveis. Além disso, para determinados produtos que podem, por exemplo, se sujeitar ao IPI de 5%, ICMS de 18% e PIS e COFINS de 9,25%, tem-se que, em termos nominais, uma alíquota efetiva de 28% pode representar uma redução de carga tributária. Portanto, considerando que a reforma tributária representa uma verdadeira revolução de paradigma, tanto do ponto de vista da tributação de saída como da recuperação de custos tributários nas compras, o efetivo impacto de carga tributária depende de uma análise detalhada da dinâmica de atividades de cada contribuinte.

Fonte: Valor

Data da Notícia: 23/04/2025 00:00:00

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