Receita prepara projeto de lei para ampliar programas fiscais
Por Beatriz Olivon — Brasília
A Receita Federal está preparando um projeto de lei para ampliar a possibilidade de adesão ao “Confia”, programa de conformidade fiscal em fase de testes com grandes contribuintes, e estabelecer o “Sintonia”, voltado a todas as empresas. A proposta deverá ser apresentada e enviada ao Congresso Nacional neste mês, junto com anúncio de resultados do Confia, segundo a superintendente da Receita Federal em São Paulo, Marcia Meng.
O Confia, afirma a superintendente, precisa ter mais vantagens do que o Sintonia. “Se a empresa está em um relacionamento em que ela se compromete mais com a Receita, a Receita também precisa se comprometer mais com ela”, diz.
Uma das diferenças entre os programas está na contrapartida exigida dos contribuintes. No Confia, se o auditor verifica que há alguma inconsistência fiscal, comunica a empresa antes de lavrar a autuação, para que possa solucionar o problema. No Sintonia, não haverá esse contato tão próximo.
A superintendente lembra que, no Confia, um dos primeiros pedidos das empresas foi para ter essa aproximação com a Receita e a melhoria no procedimento de retirada da Certidão Negativa de Débitos (CND) — necessária para negociações com fornecedores, bancos e licitações, por exemplo. Ela esperava outras solicitações, como redução de multa e celeridade, e ficou surpresa com o pedido de proximidade com a fiscalização.
“Pediram CND automática. Para mim, não fazia sentido, porque ela é retirada na internet”, afirma a auditora. Ela acrescenta, porém, que as empresas explicaram que não conseguiam eliminar com agilidade algumas pendências burocráticas que acabavam travando a emissão on-line. “Com auditores acompanhando de perto as empresas no Confia, a regularização ficou mais ágil.”
Mas um dos aspectos discutidos e que, portanto, pode constar no texto do projeto de lei, são descontos na cobrança de multas. “É uma coisa que queremos que aconteça [previsão de redução de multas], mas serão necessários parâmetros objetivos dentro da lei para dar segurança ao auditor”, afirma Meng. Apesar de ter sido objeto de discussão, a auditora não confirma se esse ponto estará na proposta.
A ideia é que o projeto de lei contemple todos os programas de conformidade da Receita, o que também inclui o Operador Econômico Autorizado (OEA). O programa é dirigido a empresas que atuam com comércio exterior. Ainda não inclui medidas de conformidade fiscal, concentrando-se na segurança logística da carga.
O OEA surgiu em 2010, com viés de segurança logística da carga, para evitar contaminação por drogas e mercadorias contrafeitas. A ideia é que no projeto de lei haja evolução para um programa de conformidade tributária. “O OEA Segurança gerou em paralelo o OEA Conformidade”, diz Meng.
A auditora explica que, ao ter mais contato com o contribuinte para tratar de questões de segurança, é natural que também possam ser abordadas questões de conformidade. Mas, acrescenta, falta norma com essa previsão.
A conformidade é uma aposta para reduzir o contencioso tributário. De acordo com o relatório publicado pelo Núcleo de Tributação do Insper em dezembro de 2020, dentro do Observatório do Contencioso Tributário, em 2019 o contencioso administrativo e judicial brasileiro na esfera tributária somava 75% do PIB. Dos R$ 5,44 trilhões de estoque de processos tributários, R$ 4,01 trilhões (74% do total) estavam envolvidos em disputas nos tribunais federais e estaduais.
“É um sistema que faliu”, afirma Pablo Cesário, presidente executivo da Abrasca, que participa do programa Confia na fase de testes. “O Confia é o que há de mais importante em termos de modernização no processo administrativo.” Para ele, é necessário mudar a forma de tributar, levando à autorregularização com pagamento facilitado.
O presidente executivo destaca que a questão de ter algum abatimento seria importante, porém seria injusto reduzir o Confia à questão das multas. Cesário reforça que, para as empresas, o programa é muito relevante, por, por exemplo, facilitar a obtenção de certidão fiscal.
“Defendemos que o contribuinte que usa o não pagamento de tributo como modelo de negócio precisa ser mais punido e quem atua na conformidade, ser tratado de forma diferente”, afirma ele, destacando que o Confia requer um nível de participação maior tanto por parte da Receita quanto da estrutura exigida do contribuinte.