Proposta de reforma tributária, uma falácia
Roberto Vertamatti
Diretor de Finanças da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac)
A reforma tributária está voltando novamente ao noticiário de todos os dias, já que o Congresso Nacional entende que o início de 2009 é o momento ideal para essa discussão. Os discursos vão se repetir indicando que a reforma não será suficientemente ampla, mas satisfatória.
É evidente que muitos legisladores comentarão que a reforma vai simplificar o sistema tributário – idéia que é uma primeira grande falácia. Vale observar que o Congresso é um grande aproveitador de ocasiões oportunas para fazer valer a sua vontade, ainda que não seja a da maioria do povo brasileiro.
A proposta de criação de um Valor Agregado Federal (IVA-F) para substituir PIS, Cofins, salário-educação e Cide deve ampliar o trabalho dos contribuintes de forma burocrática e preocupante, a exemplo do que ocorre em relação ao ICMS atualmente – imposto que receberá o nome de IVA estadual.
A propalada simplificação que a reforma pretende trazer ao povo brasileiro não deixa, com certeza, de ser uma propaganda mentirosa. Na verdade, simplificação aconteceria se reduzíssemos os cerca de 80 tributos, que nos massacram, para dez, no máximo – incluindo taxas e contribuições.
Todos criticam que há muita sonegação e que os bons contribuintes acabam pagando demais. Ora, da maneira como estamos procedendo e, se aprovado o atual projeto de reforma tributária, vamos continuar com o gigantesco emaranhado de tributos – entendido por poucos e que facilita sobremaneira a corrupção decorrente da confusão causada pela legislação e da carga absurdamente alta que muitos não conseguem pagar.
A carga tributária no Brasil, no final de 2008, chegou ao astronômico valor de R$ 1.060 trilhão, montante que corresponde a cerca de 38% do nosso Produto Interno Bruto (PIB). Muitos poderão dizer que essa carga está nivelada à maioria dos países desenvolvidos, o que é outra grande falácia.
Segundo estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI), os países industrializados têm uma carga tributária da ordem de 38% do respectivo PIB. Mesmo assim, no grupo de nações ricas, há vários países que apresentam carga tributária inferior à brasileira: Estados Unidos com 26%, Japão com 27% e Austrália com 31%.
Se analisarmos a carga tributária nos países de mesmo nível de desenvolvimento do Brasil (países do chamado Bric), teremos algo da ordem de 28%, portanto, 10% inferior à brasileira. Essa simples comparação de percentuais é um importante referencial. Vamos ficar ainda mais assustados e perplexos se analisarmos o que realmente importa para o contribuinte, que é o retorno que os impostos devem propiciar aos cidadãos.
A Suécia e a Bélgica, por exemplo, têm cargas tributárias da ordem de 50% e 47% do PIB, respectivamente. Isto é, bem acima da carga brasileira. No entanto, analisando o retorno dos impostos nesses países, ficamos mais uma vez tremendamente frustrados com o Brasil.
Na Suécia, os contribuintes têm os serviços de alta qualidade: escola, estradas, saúde e segurança. A população sueca realmente tem o retorno em serviços a partir do pagamento dos impostos. Nada mais justo. Já no Brasil, se necessitamos de tais serviços, temos que pagar para ter qualidade, pois os oferecidos pelo Estado são sofríveis, praticamente inexistentes. Assim, se computarmos esse custo adicional aos cidadãos, custos que deveriam ser suportados pelo Estado, vamos constatar que nossa carga tributária é, sim, uma das mais caras do mundo.
Os próprios deputados e senadores governistas já comentam que a carga não vai ser alterada com a reforma. Infelizmente, esse discurso vem sendo apenas levemente criticado pela oposição, que, ao que parece, não acredita que o fardo não vá aumentar.
Os discursos não são verdadeiros e a carga tributária tende, sim, a aumentar. Já se comenta que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição), aprovada pela comissão especial, permite que a arrecadação do IVA-F, em seus dois primeiros anos de vigência, represente um aumento real (além da inflação) de até 5% ao ano, na comparação com a receita obtida no ano anterior. Aliás, no início de mandato do atual presidente, ouvimos que a carga tributária não aumentaria. Pois é, a carga passou de 32% sobre o PIB em 2002 para 38% atualmente. Quem acredita?
Desde a propalada “Constituição Cidadã”, que assim foi chamada por engano, o Congresso fala em uma reforma tributária, como realmente deveria ser: simplificação, diminuição real da carga, aumento da arrecadação com a parcela de contribuintes sonegadores e desoneração de tributos de todos os produtos essenciais para as classes mais necessitadas da população, especialmente alimentos. Enfim, que seja justa, pois absolutamente não é.
Sabemos que temos que pagar impostos, nada mais correto. Mas, se o que pagamos não retorna honestamente para a população, quem é desonesto?
A reforma tributária, tão necessária, é apenas a parte visível do iceberg, como são os juros exorbitantes deste país. Não veremos a solução de nenhum deles se o Estado realmente não passar a ser mais eficiente e parar com o desperdício, começando pelo elevado número de deputados e senadores.
As entranhas dos nossos problemas estão no próprio Estado mastodonte e paquiderme. Se não atacarmos o cerne do problema, não teremos nenhuma solução. Talvez a mais premente das reformas não seja a tributária, mas sim a política, para mudar o regime de “aparentemente presidencialista” para parlamentarista, no qual mudaremos o governo quando ele errar, até um dia aprendermos.
Diretor de Finanças da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac)
A reforma tributária está voltando novamente ao noticiário de todos os dias, já que o Congresso Nacional entende que o início de 2009 é o momento ideal para essa discussão. Os discursos vão se repetir indicando que a reforma não será suficientemente ampla, mas satisfatória.
É evidente que muitos legisladores comentarão que a reforma vai simplificar o sistema tributário – idéia que é uma primeira grande falácia. Vale observar que o Congresso é um grande aproveitador de ocasiões oportunas para fazer valer a sua vontade, ainda que não seja a da maioria do povo brasileiro.
A proposta de criação de um Valor Agregado Federal (IVA-F) para substituir PIS, Cofins, salário-educação e Cide deve ampliar o trabalho dos contribuintes de forma burocrática e preocupante, a exemplo do que ocorre em relação ao ICMS atualmente – imposto que receberá o nome de IVA estadual.
A propalada simplificação que a reforma pretende trazer ao povo brasileiro não deixa, com certeza, de ser uma propaganda mentirosa. Na verdade, simplificação aconteceria se reduzíssemos os cerca de 80 tributos, que nos massacram, para dez, no máximo – incluindo taxas e contribuições.
Todos criticam que há muita sonegação e que os bons contribuintes acabam pagando demais. Ora, da maneira como estamos procedendo e, se aprovado o atual projeto de reforma tributária, vamos continuar com o gigantesco emaranhado de tributos – entendido por poucos e que facilita sobremaneira a corrupção decorrente da confusão causada pela legislação e da carga absurdamente alta que muitos não conseguem pagar.
A carga tributária no Brasil, no final de 2008, chegou ao astronômico valor de R$ 1.060 trilhão, montante que corresponde a cerca de 38% do nosso Produto Interno Bruto (PIB). Muitos poderão dizer que essa carga está nivelada à maioria dos países desenvolvidos, o que é outra grande falácia.
Segundo estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI), os países industrializados têm uma carga tributária da ordem de 38% do respectivo PIB. Mesmo assim, no grupo de nações ricas, há vários países que apresentam carga tributária inferior à brasileira: Estados Unidos com 26%, Japão com 27% e Austrália com 31%.
Se analisarmos a carga tributária nos países de mesmo nível de desenvolvimento do Brasil (países do chamado Bric), teremos algo da ordem de 28%, portanto, 10% inferior à brasileira. Essa simples comparação de percentuais é um importante referencial. Vamos ficar ainda mais assustados e perplexos se analisarmos o que realmente importa para o contribuinte, que é o retorno que os impostos devem propiciar aos cidadãos.
A Suécia e a Bélgica, por exemplo, têm cargas tributárias da ordem de 50% e 47% do PIB, respectivamente. Isto é, bem acima da carga brasileira. No entanto, analisando o retorno dos impostos nesses países, ficamos mais uma vez tremendamente frustrados com o Brasil.
Na Suécia, os contribuintes têm os serviços de alta qualidade: escola, estradas, saúde e segurança. A população sueca realmente tem o retorno em serviços a partir do pagamento dos impostos. Nada mais justo. Já no Brasil, se necessitamos de tais serviços, temos que pagar para ter qualidade, pois os oferecidos pelo Estado são sofríveis, praticamente inexistentes. Assim, se computarmos esse custo adicional aos cidadãos, custos que deveriam ser suportados pelo Estado, vamos constatar que nossa carga tributária é, sim, uma das mais caras do mundo.
Os próprios deputados e senadores governistas já comentam que a carga não vai ser alterada com a reforma. Infelizmente, esse discurso vem sendo apenas levemente criticado pela oposição, que, ao que parece, não acredita que o fardo não vá aumentar.
Os discursos não são verdadeiros e a carga tributária tende, sim, a aumentar. Já se comenta que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição), aprovada pela comissão especial, permite que a arrecadação do IVA-F, em seus dois primeiros anos de vigência, represente um aumento real (além da inflação) de até 5% ao ano, na comparação com a receita obtida no ano anterior. Aliás, no início de mandato do atual presidente, ouvimos que a carga tributária não aumentaria. Pois é, a carga passou de 32% sobre o PIB em 2002 para 38% atualmente. Quem acredita?
Desde a propalada “Constituição Cidadã”, que assim foi chamada por engano, o Congresso fala em uma reforma tributária, como realmente deveria ser: simplificação, diminuição real da carga, aumento da arrecadação com a parcela de contribuintes sonegadores e desoneração de tributos de todos os produtos essenciais para as classes mais necessitadas da população, especialmente alimentos. Enfim, que seja justa, pois absolutamente não é.
Sabemos que temos que pagar impostos, nada mais correto. Mas, se o que pagamos não retorna honestamente para a população, quem é desonesto?
A reforma tributária, tão necessária, é apenas a parte visível do iceberg, como são os juros exorbitantes deste país. Não veremos a solução de nenhum deles se o Estado realmente não passar a ser mais eficiente e parar com o desperdício, começando pelo elevado número de deputados e senadores.
As entranhas dos nossos problemas estão no próprio Estado mastodonte e paquiderme. Se não atacarmos o cerne do problema, não teremos nenhuma solução. Talvez a mais premente das reformas não seja a tributária, mas sim a política, para mudar o regime de “aparentemente presidencialista” para parlamentarista, no qual mudaremos o governo quando ele errar, até um dia aprendermos.