O Refis III e os crimes tributários
Por José Luis Oliveira Lima e Rodrigo Dall’Acqua
Após vetar o projeto anterior, considerado muito benevolente com os devedores, o governo federal instituiu o programa de parcelamento de débitos tributários conhecido como Refis III, criado pela medida provisória nº 303, de 2006, publicada em junho passado. Os contribuintes com débitos junto à Secretaria da Receita Federal, Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e INSS poderão ingressar neste novo programa até o dia 15 de setembro de 2006 e quitar a dívida em até 130 meses.
Ao contrário dos dois programas anteriores – o Refis I e o Refis II, mais conhecido como Paes – o Refis III não apresenta, explicitamente, nenhum benefício para os contribuintes que se encontram respondendo ou na iminência de responder a uma ação penal por crime tributário. Relembrando, o primeiro Refis que veio com a Lei nº 9.964, de 2000 – previa a suspensão da pretensão punitiva do Estado, mas com a condição de que o início do parcelamento se desse antes do recebimento da denúncia criminal. O Paes – criado pela Lei nº 10.684, de 2003 -, por sua vez, alterou significativamente a matéria, permitindo a suspensão dos processos criminais em qualquer estágio, pouco importando que os pagamentos tenham se iniciado após a instauração da ação penal.
De início, é importante ressaltar que, diferentemente dos programas anteriores, que foram promulgados por força de lei federal, o Refis III foi instituído por medida provisória, e que o presidente da República está constitucionalmente impedido de legislar sobre matéria penal valendo-se de tal instrumento. Assim, qualquer previsão de benefício criminal na Medida Provisória nº 303 seria inconstitucional, devendo o Refis III ser interpretado, no âmbito penal, apenas como mais um programa de parcelamento tributário.
Contudo, ainda que o Refis III não proclame efeitos criminais para seus inscritos, o simples ingresso em um programa de parcelamento tributário já acarreta benefícios penais para o contribuinte. A primeira previsão de benefício penal é encontrada no artigo 34 da Lei nº 9.249, de 1995, que afirma que o parcelamento e o posterior pagamento final do tributo irá acarretar a extinção da punibilidade, mas desde que a quitação se inicie antes do recebimento da denúncia. O parcelamento somente trará efeitos penais caso se realize antes da instauração do processo criminal. Destaca-se que, na aplicação desta lei, parte da jurisprudência entende que o deferimento do parcelamento do débito cria uma nova obrigação, equivalendo a uma novação da dívida tributária, retirando-lhe o seu caráter criminal e transformando-a em mero ilícito civil. Para a extinção da punibilidade, basta a adesão ao parcelamento, ainda que o pagamento não seja integralmente realizado.
A legislação vigente e a jurisprudência garantem a suspensão e futura extinção da punibilidade
Em face dos termos da Lei nº 9.249, o contribuinte que aderir ao Refis III antes do recebimento de denúncia criminal terá sua punibilidade suspensa enquanto perdurar o pagamento e, ao final, julgada extinta com a quitação total do débito. Ainda nessa linha, para alguns julgadores, o simples ingresso no Refis III acarretará a extinção da punibilidade criminal, pouco importando que não seja feita a quitação total da dívida.
O Refis III aproveita-se, ainda, dos benefícios penais previstos na Lei nº 10.684, que instituiu o Paes e preceitua que o parcelamento do débito irá suspender e extinguir a punibilidade, mesmo que a adesão ocorra depois do recebimento da denúncia. A norma penal trazida pelo Paes, segundo entendimento jurisprudencial consolidado, se aplica a todos os crimes tributários e a qualquer modalidade de parcelamento, incluindo, por certo, o novo regime de quitação trazido pelo Refis III.
A principal característica do Paes, que deve ser também aplicada para os optantes do Refis III, é que os benefícios criminais de suspensão e extinção da punibilidade podem ser aplicados em qualquer fase processual, mesmo que já tenha ocorrido o recebimento da denúncia. Portanto, o contribuinte que estiver sendo processado ou até mesmo cumprindo pena por crime tributário poderá solicitar a suspensão da punibilidade após regular ingresso no Refis III. O processo ou a execução da pena ficará suspenso enquanto estiver em curso o parcelamento, julgando-se extinta a punibilidade com o pagamento integral da dívida.
Portanto, apesar de o Refis III não oferecer, em seus próprios termos, nenhum benefício criminal, a legislação vigente e a jurisprudência garantem ao contribuinte que optar pelo parcelamento do débito a suspensão e futura extinção da punibilidade, eximindo-o dos percalços do processo e da sanção penal.
São iniciativas práticas como esse Refis que promovem o bem comum e o desenvolvimento. O contribuinte não se torna inadimplente por vocação ou pirraça, mas porque não teve alternativa. Ao possibilitar o pagamento do débito de forma facilitada, o governo recebe o que lhe é devido; o contribuinte regulariza sua situação e, como benefício adicional, alivia a carga do Judiciário que, livre dessa carga enorme de contenciosos, pode-se dedicar a causas mais importantes – já que a maior parte dos litígios que hoje entope o Poder Judiciário são exatamente as execuções fiscais.
José Luis Oliveira Lima e Rodrigo Dall’Acqua são advogados criminais e sócios do escritório Oliveira Lima, Hungria, Dall´Acqua & Furrier Advogados
Após vetar o projeto anterior, considerado muito benevolente com os devedores, o governo federal instituiu o programa de parcelamento de débitos tributários conhecido como Refis III, criado pela medida provisória nº 303, de 2006, publicada em junho passado. Os contribuintes com débitos junto à Secretaria da Receita Federal, Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e INSS poderão ingressar neste novo programa até o dia 15 de setembro de 2006 e quitar a dívida em até 130 meses.
Ao contrário dos dois programas anteriores – o Refis I e o Refis II, mais conhecido como Paes – o Refis III não apresenta, explicitamente, nenhum benefício para os contribuintes que se encontram respondendo ou na iminência de responder a uma ação penal por crime tributário. Relembrando, o primeiro Refis que veio com a Lei nº 9.964, de 2000 – previa a suspensão da pretensão punitiva do Estado, mas com a condição de que o início do parcelamento se desse antes do recebimento da denúncia criminal. O Paes – criado pela Lei nº 10.684, de 2003 -, por sua vez, alterou significativamente a matéria, permitindo a suspensão dos processos criminais em qualquer estágio, pouco importando que os pagamentos tenham se iniciado após a instauração da ação penal.
De início, é importante ressaltar que, diferentemente dos programas anteriores, que foram promulgados por força de lei federal, o Refis III foi instituído por medida provisória, e que o presidente da República está constitucionalmente impedido de legislar sobre matéria penal valendo-se de tal instrumento. Assim, qualquer previsão de benefício criminal na Medida Provisória nº 303 seria inconstitucional, devendo o Refis III ser interpretado, no âmbito penal, apenas como mais um programa de parcelamento tributário.
Contudo, ainda que o Refis III não proclame efeitos criminais para seus inscritos, o simples ingresso em um programa de parcelamento tributário já acarreta benefícios penais para o contribuinte. A primeira previsão de benefício penal é encontrada no artigo 34 da Lei nº 9.249, de 1995, que afirma que o parcelamento e o posterior pagamento final do tributo irá acarretar a extinção da punibilidade, mas desde que a quitação se inicie antes do recebimento da denúncia. O parcelamento somente trará efeitos penais caso se realize antes da instauração do processo criminal. Destaca-se que, na aplicação desta lei, parte da jurisprudência entende que o deferimento do parcelamento do débito cria uma nova obrigação, equivalendo a uma novação da dívida tributária, retirando-lhe o seu caráter criminal e transformando-a em mero ilícito civil. Para a extinção da punibilidade, basta a adesão ao parcelamento, ainda que o pagamento não seja integralmente realizado.
A legislação vigente e a jurisprudência garantem a suspensão e futura extinção da punibilidade
Em face dos termos da Lei nº 9.249, o contribuinte que aderir ao Refis III antes do recebimento de denúncia criminal terá sua punibilidade suspensa enquanto perdurar o pagamento e, ao final, julgada extinta com a quitação total do débito. Ainda nessa linha, para alguns julgadores, o simples ingresso no Refis III acarretará a extinção da punibilidade criminal, pouco importando que não seja feita a quitação total da dívida.
O Refis III aproveita-se, ainda, dos benefícios penais previstos na Lei nº 10.684, que instituiu o Paes e preceitua que o parcelamento do débito irá suspender e extinguir a punibilidade, mesmo que a adesão ocorra depois do recebimento da denúncia. A norma penal trazida pelo Paes, segundo entendimento jurisprudencial consolidado, se aplica a todos os crimes tributários e a qualquer modalidade de parcelamento, incluindo, por certo, o novo regime de quitação trazido pelo Refis III.
A principal característica do Paes, que deve ser também aplicada para os optantes do Refis III, é que os benefícios criminais de suspensão e extinção da punibilidade podem ser aplicados em qualquer fase processual, mesmo que já tenha ocorrido o recebimento da denúncia. Portanto, o contribuinte que estiver sendo processado ou até mesmo cumprindo pena por crime tributário poderá solicitar a suspensão da punibilidade após regular ingresso no Refis III. O processo ou a execução da pena ficará suspenso enquanto estiver em curso o parcelamento, julgando-se extinta a punibilidade com o pagamento integral da dívida.
Portanto, apesar de o Refis III não oferecer, em seus próprios termos, nenhum benefício criminal, a legislação vigente e a jurisprudência garantem ao contribuinte que optar pelo parcelamento do débito a suspensão e futura extinção da punibilidade, eximindo-o dos percalços do processo e da sanção penal.
São iniciativas práticas como esse Refis que promovem o bem comum e o desenvolvimento. O contribuinte não se torna inadimplente por vocação ou pirraça, mas porque não teve alternativa. Ao possibilitar o pagamento do débito de forma facilitada, o governo recebe o que lhe é devido; o contribuinte regulariza sua situação e, como benefício adicional, alivia a carga do Judiciário que, livre dessa carga enorme de contenciosos, pode-se dedicar a causas mais importantes – já que a maior parte dos litígios que hoje entope o Poder Judiciário são exatamente as execuções fiscais.
José Luis Oliveira Lima e Rodrigo Dall’Acqua são advogados criminais e sócios do escritório Oliveira Lima, Hungria, Dall´Acqua & Furrier Advogados