O Estado e os limites da tributação

As mudanças na legislação tributária de MT, propostas pelo governador Silval Barbosa (PMDB), no projeto de Lei 349/2010, que tramita em regime de urgência na Assembléia Legislativa desde 25 de novembro, espelham reflexões que podem ser analisadas sob vários ângulos. Por um lado, é bastante salutar, quando passa a permitir que o contribuinte acerte espontaneamente suas pendências com o Fisco. Proceder a uma redução das multas é bom senso nestes tempos de estabilidade econômica. No entanto, o projeto de lei em questão, camufla entre poucas medidas que beneficiam o contribuinte, uma série de afrontas ao ordenamento jurídico. Tem como pano de fundo, três pontos centrais: a) fortalecimento do poder executivo frente à prerrogativa da Assembléia de legislar sobre matéria tributária; b) exclusão da participação direta da sociedade civil organizada nos processos de recursos administrativos tributários solicitados pelos contribuintes; e c) enfraquecimento da carreira dos Fiscais de Tributos Estaduais (FTE). Quanto ao primeiro ponto, o poder executivo propõe a extinção da lei 8.797/2008, que regulamenta o processo administrativo tributário e institui o Conselho Estadual de Contribuintes como segunda instância de julgamento. Com sua extinção, o executivo passa a deter o poder exclusivo de regulamentação do processo administrativo tributário e o fará por meio de legislação infra-legal, isto é, aquela feita por atos e decretos do executivo, sem precisar passar pelo legislativo. A participação direta da sociedade nos processos de recursos administrativos tributários se dá no Conselho Estadual de Contribuintes. Composto por várias entidades, como OAB, CRC, Fiemt e Fecomércio, é a entidade responsável pelo julgamento em segunda instância dos débitos tributários questionados pelos contribuintes. O governo nega que o Conselho será extinto. Porém, propõe a inclusão de dispositivos nos artigos 39 e 39-B da lei 7.098/1998 (que regulamenta o ICMS) limitando o recurso administrativo tributário do contribuinte a um único julgamento que será processado na unidade da receita que lavrou o ato questionado. Desta maneira, não deixa alternativa ao contribuinte para recorrer ao Conselho que é o órgão responsável pelo julgamento em segunda instância. Por último, ressalta-se que o governo tenta enfraquecer a carreira de FTE, com diversas medidas trazidas no projeto de lei 349/2010. Entre elas, suprime os termos “de tributos estaduais” do artigo 36 da lei 7.098/98. Transfere, assim, competência privativa dos integrantes desta carreira, para quaisquer servidores do executivo nominados como “Fiscais”, ferindo a Constituição Federal e o Código Tributário Nacional. Outra ação que enfraquece a carreira de FTE é a proposta de inclusão de novo artigo, o 39-D, e alterações no artigo 36, na lei do ICMS. Nas alterações, o governo transfere competências exclusivas do FTE (autoridade administrativa) para unidades da receita. Isto é um retrocesso, uma vez que essas competências estão definidas em leis (federal e estadual). Já as unidades da receita são disciplinadas por decretos e regimentos internos, o que fere as prerrogativas dos legislativos estadual e federal. Vale lembrar que a carreira de fiscais de tributos em todo o país foi instituída como forma estratégica de consolidar uma política fiscal e tributária. É uma das principais carreiras típicas do Estado, seus integrantes são responsáveis por garantir a legalidade e imparcialidade na função de tributar do Estado. Espera-se que os parlamentares tenham bom senso e revejam esses pontos, sob pena, de estarem assinando uma carta em branco, que outorga ilegalmente e inconstitucionalmente sua função de legislar sobre tributação ao poder executivo, que o fará a bel prazer e sem qualquer participação popular ou da sociedade civil organizada.

Data da Notícia: 16/12/2010 00:00:00

Gostou do notícia? Compartilhe em suas redes sociais

Depo 25 Bonus 25

Depo 25 Bonus 25