Nunes Marques pede vista e suspende julgamento bilionário da Vale sobre tributação de lucros no exterior
Por Marcela Villar, Valor — São Paulo
Após o placar virar a favor da União, o ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista e suspendeu um julgamento tributário bilionário que foi retomado hoje, no Plenário Virtual. Trata-se da discussão sobre validade da incidência de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL sobre empresas nacionais a partir dos lucros auferidos por coligadas e controladas no exterior em países que têm tratados com o Brasil.
O caso envolve a Vale e pode ter impacto de R$ 22 bilhões para a União, segundo estimativa do anexo de riscos fiscais do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) para o ano de 2025. O processo havia voltado hoje à pauta, com o voto de desempate do ministro Alexandre de Moraes a favor da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), acompanhando a divergência inaugurada pelo ministro Gilmar Mendes. Moraes havia pedido vista em outubro, suspendendo o julgamento.
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O relator, o ministro André Mendonça, entendeu que a matéria seria infraconstitucional, ou seja, não caberia ao STF analisar. Mas disse, no voto, que se ficasse vencido neste ponto, seria a favor da companhia. O processo não tem repercussão geral, ou seja, não vincula todo o Judiciário, mas a decisão dos ministros será um forte precedente sobre o tema.
A discussão chegou à Justiça por um mandado de segurança da Vale contra a Receita Federal a fim de afastar a incidência da “tributação automática” pelo IRPJ e pela CSLL sobre os lucros auferidos por sociedades controladas na Bélgica, na Dinamarca, em Luxemburgo e nas Bermudas.
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No Supremo, os ministros analisam um recurso da PGFN contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que afastou a cobrança dos tributos. O tribunal entendeu que a legislação brasileira não pode se sobrepor a tratados que visam evitar a bitributação. Mas o governo alega que o STJ não seguiu a jurisprudência do Supremo e tornou mais vantajosa para o contribuinte a manutenção de ativos no exterior em comparação àqueles existentes no Brasil.
Para Mendonça, os tratados inviabilizam a tributação dos valores no Brasil. “Ao se afastarem os efeitos do artigo 7º desses tratados, além do inadimplemento unilateral do pacto, frustra-se a confiança dos contribuintes que estruturaram suas operações à luz da legislação e da interpretação sobre ela vigentes ao tempo de suas operações. Dessarte, e por qualquer ângulo que se possa visualizar a questão, não colhe razão ao recurso da União”, diz o relator, no voto.
O ministro Gilmar Mendes divergiu, pois entende que o acréscimo patrimonial com o lucro das empresas no exterior é incorporado pela sociedade controladora ou coligada, no Brasil, antes da distribuição dos lucros. Por isso, não se trata de interpretação de tratados internacionais – eles seriam inaplicáveis ao caso. “O que ocorre é uma tributação de um investimento auferido por meio de uma entidade relacionada no exterior a uma alíquota máxima brasileira ou estrangeira (a que for maior). Afinal, como o Brasil admite o crédito dos tributos pagos no exterior no limite dos valores devidos no Brasil, o que efetivamente é pago de imposto de renda e CSLL é a diferença entre a tributação estrangeira (caso ela seja inferior) e a brasileira”, afirma Mendes em seu voto.