Norma geral antielisiva do CTN não impede o planejamento tributário, diz STF
Por Danilo Vital
A norma geral antielisiva prevista no artigo 116 do Código Tributário Nacional não proíbe o contribuinte de buscar, pelas vias legítimas, planejamento e economia fiscal. Seu objetivo é conferir efetividade aos princípios da legalidade tributária e da lealdade tributária.
Com esse entendimento, o Plenário virtual do Supremo Tribunal Federal declarou constitucional a regra do artigo 116 do CTN, que confere ao Fisco poderes para desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo.
A regra impacta a ocorrência da elisão fiscal, que ocorre quando o contribuinte faz um planejamento tributário para pagar menos impostos de forma legal e legítima.
Com isso, é possível encontrar formas de reduzir a base de cálculo de tributos, evitar a incidência do fator gerador dos mesmos ou ainda postergar o pagamento deles sem penalização.
Incluído no CTN pela Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2001), o artigo 116 desde sempre é alvo de críticas por, na teoria, impedir o planejamento tributário dos contribuintes.
Autora da ação direta de constitucionalidade, a Confederação Nacional do Comércio (CNC) defendeu a inconstitucionalidade do dispositivo por permitir que o Fisco decida tributar fato gerador não ocorrido, embora previsto em lei.
Segundo a CNC, a norma introduz “interpretação econômica” no direito tributário brasileiro e amplia a tributação por analogia: o agente fiscal ganha liberdade para lacunas legais com a cobrança de tributos, como se legislador fosse.
O Supremo Tribunal Federal rejeitou a inconstitucionalidade, por maioria de votos. Prevaleceu a posição da relatora, ministra Cármen Lúcia. Ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Alexandre de Moraes.
Legalidade tributária
A ministra Cármen Lúcia destacou em seu voto que a aplicação do artigo 116 está limitada aos atos ou negócios jurídicos praticados com intenção de dissimulação ou ocultação do fato gerador do tributo.
“Faz-se necessária, assim, a configuração de fato gerador que, por óbvio, além de estar devidamente previsto em lei, já tenha efetivamente se materializado, fazendo surgir a obrigação tributária”, disse.
Assim, a norma não autoriza a tributação com base na intenção do que poderia estar sendo supostamente encoberto por um forma jurídica, como defendeu a CNC. “Autoridade fiscal estará autorizada apenas a aplicar base de cálculo e alíquota a uma hipótese de incidência estabelecida em lei e que tenha se realizado”, explicou.
A relatora ainda afirmou que o artigo 116 visa conferir máxima efetividade aos princípios da legalidade tributária e da lealdade tributária.
Em voto-vista, o ministro Dias Toffoli acompanhou esse entendimento ao ressaltar que a o Fisco, ao invocar o artigo 116 do CTN, tem que demonstrar a efetiva ocorrência do fato gerador previsto em lei ou a presença dos elementos constitutivos da obrigação tributária.
“Além disso, tem de demonstrar a ocorrência de atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência desse fato gerador ou a natureza dos citados elementos”, acrescentou.
Divergência
Abriu a divergência o ministro Ricardo Lewandowski, por entender que não caberia ao Fisco, em ato próprio, desconsiderar a ocorrência desses negócios jurídicos que tenham sido praticados para dissimular a ocorrência do fato gerador tributário. Essa função só poderia ser do Poder Judiciário.
“Ora, por ser uma medida extrema e de gravosas consequências, a nulidade ou mesmo a desconsideração de atos e negócios jurídicos dissimulados, precisa sempre amoldar-se aos parâmetros e limites indicados em lei”, disse o voto divergente.
Ao tratar da invalidade de negócios jurídicos, o artigo 168 do Código Civil diz que as mesmas devem ser pronunciadas pelo juiz, quando identificadas as hipóteses de nulidade listadas no artigo 167.
“Assim, a decisão aludida no parágrafo único do artigo 116 do CTN caberá sempre a um magistrado togado, considerado o princípio da reserva de jurisdição, o qual, ao fim e ao cabo, se destina a resguardar os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos”, concluiu o ministro Lewandowski.ADI 2.446