Justiça nega liminares contra decreto do IOF
Por Beatriz Olivon — De Brasília
Pelo menos quatro pedidos de liminares para afastar os efeitos do decreto do IOF (nº 12.466, de 2025) já foram ajuizados, em meio à revisão da norma e a edição de medida provisória (MP) com propostas de compensação à perda de arrecadação. Todos foram negados. A expectativa dos advogados, porém, é que novas ações sejam ajuizadas mesmo depois das alterações.
O governo aumentou o IOF em diversas transações com o intuito de elevar a arrecadação e passou a classificar as operações de risco sacado (antecipação de recebíveis, adotada por varejistas para gerir fluxo de caixa), antes não tributadas, como operações de crédito, fazendo incidir alíquota de 3,5%, que agora poderá ser reduzida.
O tema já foi levado ao Supremo Tribunal Federal (STF), em ação do Partido Liberal (PL), que pede a suspensão liminar das alterações no IOF (ADI 7827), ainda sem decisão. O partido alega que o governo adotou a medida para aumentar a arrecadação, contrariando a natureza extrafiscal do tributo, o que deveria ser feito por meio de lei.
A Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep) também pediu, em mandado de segurança coletivo, o afastamento das alterações promovidas pelo decreto. A 4ª Vara Federal de Curitiba negou o pedido, alegando falta de urgência para conceder a liminar (processo nº 5029485-83.2025.4.04.7000). A entidade vai recorrer da decisão.
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Segundo o diretor da Fiep, Guilherme Hakme, a princípio o governo anunciou que não vai revogar totalmente as alterações do IOF, só calibrar as alíquotas, e manter a tributação sobre o risco sacado. “Então, iremos continuar a buscar no Judiciário a revogação desse decreto ilegal”, diz.
A Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF) ainda não definiu se vai judicializar a questão. Espera a edição de um novo decreto para tomar uma decisão, segundo seu presidente, Rodrigo Maia.
Mas a entidade entende, acrescenta o dirigente, que, no caso do risco sacado, por não se tratar de operação de crédito, como o governo quer caracterizar, não poderia haver alteração por decreto, seria necessário um projeto de lei. “Vamos aguardar o novo decreto porque, de fato, achamos que há uma inconstitucionalidade nisso”, afirma.
Na Justiça, as empresas discutem especialmente a tributação sobre operações de risco sacado. Os pedidos analisados até agora, porém, foram negados. Em Florianópolis, o juiz Eduardo Didonet Teixeira, da 9ª Vara Federal, negou liminar à fabricante de embalagens Copobras (processo nº 5020466-35.2025.4.04.7200).
Pedido de liminar feito pela Sodexo para não incidência do IOF sobre operações de risco sacado também foi negado pela 7ª Vara Cível Federal de São Paulo. A empresa alegou, no processo, que para o pagamento dos bens e serviços adquiridos de diversos fornecedores, firma convênios com banco para a realização de operações de “risco sacado” ou “forfait”.
A Sodexo explica, na ação, que para os fornecedores (pequenas e médias empresas, em geral) não valerá mais a pena a realização da operação de risco sacado e, assim, a relação existente entre a empresa os fornecedores se fragilizará (processo nº 5015254-62.2025.4.03.6100).
Na decisão, a juíza Julia Cavalcante Silva Barbosa afirma que foram feitas “alegações genéricas”, sem demonstração de prejuízo expressivo e irreparável, ou de difícil reparação até o julgamento de mérito. “As meras alegações de que estaria sujeita ao pagamento de valores que entende indevidos, durante o período, não é suficiente à configuração do risco necessário à análise da medida na atual fase processual”, diz.
No Rio de Janeiro, a 2ª Vara Federal negou a liminar pedida pela empresa Bemobi contra o decreto. O pedido alega desvio de finalidade da função extrafiscal do IOF, e também a inaplicabilidade do aumento de alíquotas a operações de crédito contratadas antes da publicação do decreto (processo nº 5055904-71.2025.4.02.5101).
Na decisão, o juiz Mauro Luis Rocha Lopes afirma que o IOF tem uma “nítida faceta extrafiscal” e o legislador constituinte permitiu que o administrador tivesse liberdade para aumentá-los ou reduzi-los por ato próprio, atendendo às emergenciais exigências da economia nacional.
“Ainda que em entrevistas as autoridades governamentais tenham verbalizado o impacto econômico que a majoração produzirá, não se pode afirmar que a medida tenha se distanciado dos objetivos das políticas monetária e fiscal, condição estabelecida na lei de tributação (Lei nº 8.894, de 1994) para a alteração de alíquota do imposto”, diz.
Para o advogado Ricardo Bolan, sócio de tributário do Lefosse, que fez o levantamento, se o governo editar novo decreto em que se mantenha a tributação por IOF da operação de risco sacado, ainda que com alíquota reduzida, haverá uma judicialização “enorme”. De acordo com ele, o escritório já recebeu diversas consultas sobre judicialização. Espera-se apenas, acrescenta, o desenrolar do assunto.
O advogado aponta que, do ponto de vista jurídico, incomoda por não ser uma operação de crédito, mas uma compra de recebível. “Não é o banco dando crédito para alguém”, afirma ele, acrescentando que essa hipótese de incidência não poderia ser tratada por lei ordinária, muito menos por decreto.
Procuradas pelo Valor, Sodexo e Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional não deram retorno até o fechamento da edição. Representantes da Copobras e Bemobi não foram localizados.