Insegurança tributária foi causada pelas empresas, e não pelo STF, dizem ministros
O Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, no último dia 8/2, que uma decisão tributária definitiva perde seus efeitos caso a corte altere o entendimento. O julgamento provocou reação negativa de contribuintes e tributaristas pela falta de segurança jurídica, mas ministros do STF defendem que não houve prejuízo às empresas — a não ser os que foram causados por elas mesmas.
A decisão vale apenas para tributos recolhidos de forma continuada — ou seja, cuja cobrança é renovada periodicamente —, como a CSLL. Nos casos de tributos cobrados uma única vez, como o ITBI, os efeitos da sentença transitada em julgado permanecem mesmo após decisão contrária do Supremo.
De acordo com o ministro Luís Roberto Barroso, que conduziu a tese vencedora no julgamento, uma decisão que considere determinado tributo continuado como inconstitucional perde eficácia após o STF reconhecer sua validade.
Assim, a retomada do pagamento passa a ser obrigatória, até mesmo para contribuintes que já tinham decisões definitivas de outras instâncias contrárias ao recolhimento. Mesmo assim, a cobrança só ocorre para frente, ou seja, a partir da nova decisão do STF.
O direito adquirido a partir de uma decisão judicial sem possibilidade de recursos é chamado de coisa julgada. Segundo Barroso, a coisa julgada vale enquanto se mantiverem as condições fáticas e jurídicas que justificaram a decisão. Se houver alteração desse cenário, os efeitos da decisão anterior podem deixar de se produzir.
Assim, quando o Supremo decide que um imposto é devido, todos precisam pagá-lo a partir daquele momento. Caso contrário, na visão do ministro, os contribuintes com decisão definitiva favorável antiga teriam uma vantagem competitiva em relação aos seus concorrentes.
Caso concreto
Em 1992, algumas empresas conseguiram na Justiça o direito de não pagar a CSLL. O caso transitou em julgado. Já em 2007, o STF afirmou, de forma definitiva, em julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade, que a contribuição é constitucional.
No julgamento do início do mês, o Supremo voltou a discutir o caso da CSLL, validou novamente sua cobrança e fixou a tese de repercussão geral, que vale para todos os casos semelhantes.
Para Barroso, nenhuma empresa foi pega de surpresa com o julgamento mais recente. Isso porque, desde 2007, todas já deveriam ter começado a pagar o tributo, ou ao menos reservado recursos para isso.
Assim, a nova decisão da corte não criou insegurança jurídica. “A insegurança jurídica foi criada pela decisão de, mesmo depois da orientação do Supremo de que era devido, continuar a não pagar e a não provisionar”, explicou o minitro. Ele indicou que a opção das empresas por não pagar a CSLL até o novo julgamento foi uma aposta.
Estratégia deliberada
Na última semana, o ministro Gilmar Mendes publicou artigo com o mesmo teor. Ele explicou que, mesmo após o acórdão de 2007, as empresas adotaram a estratégia de protocolar novas ações para pedir a isenção da CSLL, com o argumento de que o tributo seria inconstitucional.
“Se há insegurança, ela foi gestada por quem se colocou em risco, ao ajuizar ação cujo efeito prático pretendido era tornar-se imune ao julgado de 2007, que possui eficácia geral (erga omnes) e que, por isso, requer observância de todas as empresas brasileiras”, assinalou o magistrado.
De acordo com Gilmar, “o STF notou que, por trás de um culto à ‘coisa julgada’, se escondia o objetivo de alguns atores econômicos de eternizar privilégios tributários inexplicavelmente concedidos por magistrados recalcitrantes”. Para ele, “os que buscaram manter um privilégio foram aqueles que contrataram a insegurança”.
Mesmo assim, o Supremo não obrigou o pagamento retroativo da CSLL. Ou seja, quem tinha o privilégio de não recolher o tributo antes de 2007 continuará sem ter de pagar nada — “nem ao Fisco, nem aos pequenos, médios e grandes empresários que fecharam as portas em decorrência de uma verdadeira concorrência desleal”, como apontou Gilmar.
Pelo entendimento firmado no início deste mês, haverá ainda um período de adaptação: se o tributo considerado constitucional for um imposto, só será cobrado no ano seguinte à decisão; se for uma contribuição, será cobrado após três meses.
Como o Supremo já tinha decisão inequívoca sobre a CSLL, não houve modulação com relação a este tributo. Por isso, foi determinado o recolhimento de valores passados, com respeito ao prazo de prescrição.