Download de filme digital paga imposto de importação
A Superintendência da Receita Federal da 8ª Região Fiscal (São Paulo) emitiu um entendimento polêmico: em solução de consulta do final do ano passado, definiu que incide imposto de importação na aquisição de filmes digitais transferidos do exterior ao adquirente nacional por meio eletrônico. Essa foi a primeira vez que o fisco se manifestou sobre a incidência do tributo para downloads de filmes feitos pela internet, mas a orientação pode ter sua base legal questionada e eficácia comprometida na prática.
Na solução de consulta nº 42, a Receita novamente se manifestou sobre a não incidência do Imposto de Importação (II) no download de softwares, já que, no caso, não existe suporte físico (uma mídia, como o CD, DVD ou Película) nem desembaraço aduaneiro, exigências feitas pela legislação que disciplina o tributo. Em outras palavras, o software tem tratamento específico: o imposto incide sobre o suporte e não sobre o programa em sim, que não é considerado uma mercadoria e sim um serviço, com incidência de Imposto sobre Serviços (ISS).
O Supremo Tribunal Federal (STF) presidido pelo ministro Cezar Peluso, em decisão do ano passado entendeu que o Estado do mato Grosso pode cobrar imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre softwares comercializados por download.
“Entretanto, a Receita Federal aplicou a regra excepcional dos softwares (incidência sobre suporte físico), para chegar á conclusão de que, como não existe previsão de incidência somente sobre a mídia de filmes (que, como os CDs de música, são considerados mercadorias e não serviços), deve haver a incidência do imposto sobre tudo, ainda que a aquisição seja, sem desembaraço aduaneiro)”, explica o advogado Mauricio Barros, do Gaia, Silva, Gaede & Associados.
Segundo ele, como não há regra pela incidência de impostos para filmes baixados como há previsão para softwares, foi feita uma interpretação distorcida para cobrar algo que não é devido. “O entendimento é de que o II recai sobre o totó, sem diferença entre suporte e conteúdo. Mas é preciso ter mercadoria, um bem tangível, o que não existe no download de filmes”, diz.
Para Barros, é difícil antecipar o desenrolar da solução, especialmente porque o download de filmes pagos, oferecidos por grandes empresas, é feito por pessoas físicas. “Duvido que a Receita vá atrás disso. Não há na legislação dizendo como o II deve ser cobrado e em que momento nesses casos”, diz o especialista.
De acordo com o advogado, empresas como revendedoras ou redes de compartilhamento pago de filmes podem ser fiscalizadas e sofrer impactos. “Mas o contribuinte está aparelhado para derrubar uma possível atuação. A argumentação é muito frágil.” Mauricio Barros afirma que o download de filme não deve ter incidência de nenhum tributo.
Rogério Zarattini Chebabi, do Braga&Marafon Consultores e Advogados, analisa que a solução não esclarece uma dúvida: já que há incidência de importo de importação sobre dados, ainda que contenham músicas, filmes ou análogos, porém sem meio físico, como calcular alíquota do II se não há como executar a classificação fiscal desdes produtos na Tarifa Externa Comum (TEC).
“Todo produto importado, para ser tributado, tem que ser previamente classificado. Para tanto é preciso analisar as notas explicativas do sistema harmonizado (NESH), e ela em hipótese alguma explícita que é possível tributar filmes sem que estejam em meio físico”, afirma Chebabi. Assim, não há como classificar a incidência e não há como saber qual a alíquota.
“Tanto a TEC quando a NESH não acompanharam a inovação criada pela possibilidade de downloads de filmes e músicas, e precisam urgentemente modificadas sob pena de impossibilidade de incidência do II nestes casos e eficácia incompleta da solução de consulta”, completa Chebabi, lembrando que a solução pode ser mudada.
A Receita, na solução de consulta, analisou literalmente o Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009). O artigo 81, citado como base legal, diz que o valor aduaneiro de suporte físico que contenha dados ou inscrições para equipamento de processamento de dados (computadores) será determinado unicamente o custo do valor do suporte propriamente dito. O parágrafo 3º do mesmo artigo, utilizando para justificar a incidência do II, coloca que as gravações de som, cinema ou vídeo não seguirão a mesma sistemática. Ou seja, segundo Chebabi, o físico entendeu que esses produtos, baixados, fogem da regra da não incidência de imposto de importação.