Código está ultrapassado
O Código Tributário Nacional (CTN) completará 43 anos de existência em outubro próximo sem motivos para ser comemorado. Mapeamento realizado pelo Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) mostrou que os dispositivos da norma estão ultrapassados. Com uma redação imprecisa ou omissa, os artigos mais questionados naquela corte – do total de 218 que compõem o conjunto normativo – mostram-se, na maioria das vezes, destoantes do Código Civil de 2002 e, principalmente, da Carta Magna de 1988.
O coordenador da pesquisa e doutor em Direito Tributário, professor Eurico Marcos Diniz de Santi, explicou que não são poucos os dispositivos da lei questionados no STJ. Segundo Diniz de Santi, essa enxurrada de ações tem explicação na própria história do Código Tributário Nacional. Com a chamada Constituição Cidadã, a União se tornou a principal responsável pelo desenvolvimento das políticas sociais. Isso sem a definição clara de onde viria o dinheiro para financiar as medidas na área. De acordo com ele, essa é uma das razões que explicam a instituição de diversos impostos, sobretudo a partir de 1988.
Nesse sentido, Diniz de Santi lembra que a carga tributária, em 1988, não era superior a 19% do Produto Interno Bruto (PIB). Com o tempo, o peso dos impostos no PIB cresceu. Em 1998, a participação chegava a 24,5% e em 2005 a 38,9%. “A partir da nova ordem constitucional começou uma queda de braço entre União, estados e municípios, que começaram a instituir tributos. Então, a partir da Constituinte de 1988, começamos a sentir um aumento efetivo da carga tributária, afinal a União tinha que realizar suas despesas. Nessa pressão sobre a carga tributária, a saída que o contribuinte encontrou foi discutir no Judiciário a legalidade desses tributos”, afirmou.
Diniz de Santi explicou que os contribuintes passaram a procurar imprecisões ou omissões na lei para questionar a legalidade de determinada cobrança. “Percebemos que no decorrer desses 20 anos desde a promulgação da Constituição e com a pressão do aumento da carga tributária, houve maior resistência do contribuinte. Dentro da Justiça tenho uma espécie de desenho da batalha entre fisco e contribuinte”, disse o professor, citando exemplos. Entre eles, o frequente questionamento acerca do artigo 3, que trata justamente do conceito de tributo e registra 152 decisões no STJ.
Outro dispositivo a exemplificar esse questionamento é o de número 150, que já soma 1.214 decisões na corte superior. O dispositivo estabelece o prazo para o Fisco cobrar a obrigação tributária. “Segundo o artigo, o prazo é de cinco anos a contar da extinção do crédito. Daí, porém, surge a dúvida: quando se extingue o crédito? Então, tudo parte de uma simples interpretação acerca da extinção”, afirmou o professor.
De acordo com ele, outro dispositivo com frequentemente questionado é o de número 135, que já contabiliza 873 decisões no STJ. O inciso 3º desse artigo diz que “são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados por excesso de poder, infração de lei, contrato social, ou estatutos: os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”.
Segundo afirmou, por essa redação, a conclusão é que o sócio não é obrigado a responder pelas dívidas das pessoas jurídicas. “Com isso, cria-se um problema, porque o Código Civil é claro ao responsabilizar os sócios. E a tendência da jurisprudência também vai no sentido de se responsabilizar o sócio”, disse Diniz de Santi, criticando a falta de sintonia entre o código tributário, o civil e a Constituição.
Artigo também questionado é o 43, que soma 1.283 decisões no STJ. O dispositivo estabelece que “o imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica”. O artigo 97, com 1.041 determinações na corte, também se destaca. Ele estabelece o conceito de legalidade tributária.
Um dispositivo também com frequente ocorrência no STJ é o de número 77, que estabelece o conceito de taxas a serem cobradas pelo Poder Público, a partir do uso efetivo ou potencial do serviço público.
E acrescentou: “A sociedade brasileira se sujeita a um Código Tributário Nacional repleto de lacunas e contradições que incrementam a discórdia, a litigiosidade e a insegurança em torno da lei que rege a tributação em todos os níveis de governo. Isso tem reflexo nos custos das empresas, das Administrações Tributárias e no Custo-Brasil.”
A pesquisa da FGV não está concluída. O Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas fez o levantamento de todo o Código Tributário Nacional para saber quais dispositivos eram mais questionados. Agora, o órgão irá analisar as decisões e seus significados. A idéia do estudo é possibilitar a elaboração de um projeto de lei a ser encaminhado ao Congresso para sanar as lacunas e omissões da lei atual. “Temos um código que não está alinhado com a Constituição e com o Código Civil. A norma está obsoleta”, afirmou o pesquisador.
GISELLE SOUZA
O coordenador da pesquisa e doutor em Direito Tributário, professor Eurico Marcos Diniz de Santi, explicou que não são poucos os dispositivos da lei questionados no STJ. Segundo Diniz de Santi, essa enxurrada de ações tem explicação na própria história do Código Tributário Nacional. Com a chamada Constituição Cidadã, a União se tornou a principal responsável pelo desenvolvimento das políticas sociais. Isso sem a definição clara de onde viria o dinheiro para financiar as medidas na área. De acordo com ele, essa é uma das razões que explicam a instituição de diversos impostos, sobretudo a partir de 1988.
Nesse sentido, Diniz de Santi lembra que a carga tributária, em 1988, não era superior a 19% do Produto Interno Bruto (PIB). Com o tempo, o peso dos impostos no PIB cresceu. Em 1998, a participação chegava a 24,5% e em 2005 a 38,9%. “A partir da nova ordem constitucional começou uma queda de braço entre União, estados e municípios, que começaram a instituir tributos. Então, a partir da Constituinte de 1988, começamos a sentir um aumento efetivo da carga tributária, afinal a União tinha que realizar suas despesas. Nessa pressão sobre a carga tributária, a saída que o contribuinte encontrou foi discutir no Judiciário a legalidade desses tributos”, afirmou.
Diniz de Santi explicou que os contribuintes passaram a procurar imprecisões ou omissões na lei para questionar a legalidade de determinada cobrança. “Percebemos que no decorrer desses 20 anos desde a promulgação da Constituição e com a pressão do aumento da carga tributária, houve maior resistência do contribuinte. Dentro da Justiça tenho uma espécie de desenho da batalha entre fisco e contribuinte”, disse o professor, citando exemplos. Entre eles, o frequente questionamento acerca do artigo 3, que trata justamente do conceito de tributo e registra 152 decisões no STJ.
Outro dispositivo a exemplificar esse questionamento é o de número 150, que já soma 1.214 decisões na corte superior. O dispositivo estabelece o prazo para o Fisco cobrar a obrigação tributária. “Segundo o artigo, o prazo é de cinco anos a contar da extinção do crédito. Daí, porém, surge a dúvida: quando se extingue o crédito? Então, tudo parte de uma simples interpretação acerca da extinção”, afirmou o professor.
De acordo com ele, outro dispositivo com frequentemente questionado é o de número 135, que já contabiliza 873 decisões no STJ. O inciso 3º desse artigo diz que “são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados por excesso de poder, infração de lei, contrato social, ou estatutos: os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”.
Segundo afirmou, por essa redação, a conclusão é que o sócio não é obrigado a responder pelas dívidas das pessoas jurídicas. “Com isso, cria-se um problema, porque o Código Civil é claro ao responsabilizar os sócios. E a tendência da jurisprudência também vai no sentido de se responsabilizar o sócio”, disse Diniz de Santi, criticando a falta de sintonia entre o código tributário, o civil e a Constituição.
Artigo também questionado é o 43, que soma 1.283 decisões no STJ. O dispositivo estabelece que “o imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica”. O artigo 97, com 1.041 determinações na corte, também se destaca. Ele estabelece o conceito de legalidade tributária.
Um dispositivo também com frequente ocorrência no STJ é o de número 77, que estabelece o conceito de taxas a serem cobradas pelo Poder Público, a partir do uso efetivo ou potencial do serviço público.
E acrescentou: “A sociedade brasileira se sujeita a um Código Tributário Nacional repleto de lacunas e contradições que incrementam a discórdia, a litigiosidade e a insegurança em torno da lei que rege a tributação em todos os níveis de governo. Isso tem reflexo nos custos das empresas, das Administrações Tributárias e no Custo-Brasil.”
A pesquisa da FGV não está concluída. O Núcleo de Estudos Fiscais da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas fez o levantamento de todo o Código Tributário Nacional para saber quais dispositivos eram mais questionados. Agora, o órgão irá analisar as decisões e seus significados. A idéia do estudo é possibilitar a elaboração de um projeto de lei a ser encaminhado ao Congresso para sanar as lacunas e omissões da lei atual. “Temos um código que não está alinhado com a Constituição e com o Código Civil. A norma está obsoleta”, afirmou o pesquisador.
GISELLE SOUZA