As leis complementares para a efetivação da reforma tributária. Entenda
Por Valor — São Paulo
Com a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária no Senado, especialistas apontam os temas que – por requerer maior análise – deverão surgir por meio de projetos de lei complementar. Dentre eles estão: a transição para o novo sistema de impostos sobre bens e serviços (IBS), a cesta básica, o Imposto Seletivo, o Fundo de Desenvolvimento Regional, o Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas e o Conselho Federativo.
“A reforma tributária exige a promulgação de leis complementares para sua completa efetivação, conforme preceitua o ordenamento constitucional brasileiro”, afirma o advogado Leonardo Roesler, sócio da RMS Advogados.
No Senado, foram computados 53 votos favoráveis e 24 contrários ao texto em dois turnos. Como houve alterações na versão aprovada pela Câmara dos Deputados, a proposta volta à Casa Legislativa.
Segundo Roesler, o aprofundamento em relação às leis complementares será o principal desafio para o avanço da reforma tributária no país. “A integralidade e a eficácia da reforma tributária estão condicionadas à edição de leis complementares, que desempenharão papel fundamental na concretização dos objetivos almejados pela PEC, consubstanciando os preceitos constitucionais e as exigências de um sistema tributário mais justo e eficiente”, ressalta.
Abaixo, Roesler detalha os sete pontos que deverão aparecer nas leis complementares da reforma tributária:
1 – Bens e serviços
Um dos pontos a ser contemplado nas leis complementares é o IBS. Ele consiste em um tributo unificado elaborado nos moldes do Imposto sobre Valor Agregado (IVA). A discussão centra-se na adequação das alíquotas para assegurar a neutralidade fiscal sem prejudicar a capacidade de arrecadação dos entes federativos e, ao mesmo tempo, sem aumentar a carga tributária sobre o cidadão.
Roesler acredita que a legislação complementar precisa determinar as alíquotas desse imposto, a fim de “preservar a capacidade arrecadatória do Estado, evitando desequilíbrios fiscais e respeitando os princípios da isonomia e capacidade contributiva”. Ele ainda destaca que a lei deverá estabelecer a metodologia de revisão e ajuste dessas alíquotas, permitindo que sejam adequadas às dinâmicas econômicas e às necessidades fiscais do país.
2 – Cesta básica
A reforma tributária propõe manter a isenção para alguns itens da cesta básica nacional, além da criação de uma cesta básica estendida, com o mecanismo de cashback, o que devolveria parte do tributo pago para a população mais pobre.
Roesler adverte que a lei complementar deverá elencar os produtos que vão usufruir de isenção tributária. “Essa medida, além de ser um instrumento de política fiscal, é também uma ferramenta de política social, devendo ser delineada de modo a beneficiar as camadas mais vulneráveis da população”, afirma ele.
Também deverá ser detalhado como funcionará o cashback.
3 -Imposto Seletivo
A introdução do Imposto Seletivo, ou o “Imposto do pecado”, é outro vetor de controvérsia. Ele será usado como desincentivo ao consumo de produtos e serviços prejudiciais à saúde, como bebidas e cigarros, armas e munições.
Para Roesler, sua implementação “suscita inquietações acerca da eficácia regulatória e da potencial regressividade, afetando desproporcionalmente as camadas menos abastadas da população, que tradicionalmente consomem tais produtos”.
4 – Fundo de Desenvolvimento Regional
O Fundo de Desenvolvimento Regional, criado com o propósito de promover a equidade entre as diferentes regiões do país a partir de repasses feitos anualmente pelo Estado, requer que a lei complementar defina claramente os critérios de distribuição dos recursos.
Representantes das regiões Norte e Nordeste defenderam um modelo de distribuição que favoreça os estados com menor Produto Interno Bruto (PIB) per capita, visando a uma política de redistribuição que fomente o equilíbrio regional. “Esse ponto é de suma importância para assegurar que o desenvolvimento econômico e social seja fomentado de maneira equitativa e justa, em consonância com os objetivos federais de redução das disparidades regionais”, explica Leonardo Roesler.
5 – Tributos especiais
A legislação complementar também deve abordar os regimes tributários especiais concedidos a determinados setores da economia, como saneamento, turismo, futebol e indústria automotiva.
“É fundamental que estes regimes sejam estabelecidos de forma a não distorcer a concorrência nem onerar excessivamente outros setores, mantendo a coerência do sistema tributário e respeitando os princípios da livre iniciativa e da justa competição econômica”, alerta o especialista.
6 – Fundo Amazonas
A criação do Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica do Estado do Amazonas é outro tema que necessitará de regulamentação complementar. “Assim, podem ser estabelecidos os mecanismos de financiamento, gestão e controle dos recursos a ele destinados, garantindo que os objetivos de desenvolvimento sustentável sejam atingidos”, explica o tributarista.
Segundo Roesler, a inclusão da Zona Franca de Manaus no texto também gerou polêmica, com a proposição de um Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica para o Amazonas. “A proposta foi vista por alguns como uma concessão excessiva, enquanto outros a defendiam como essencial para a manutenção da competitividade da região”, compara.
7 – Conselho Federativo
Também cabe à lei complementar a tarefa de definir as regras de funcionamento do Conselho Federativo, que, de acordo com Roesler, terá papel central na administração dos impostos estaduais e municipais.
“Será também necessário estabelecer os critérios para a distribuição do produto da arrecadação dos novos impostos, assegurando uma repartição justa e equitativa dos recursos tributários”, acrescenta.