Substituição tributária no estado de São Paulo: o zumbi que assombra
Fernando Quércia
A substituição tributária (ST) é um mecanismo de arrecadação de tributos utilizado pelos Estados e pelo Distrito Federal criada para facilitar e agilizar a cobrança de impostos, principalmente o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
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Trata-se de um regime pelo qual a responsabilidade pelo pagamento do imposto devido em toda a cadeia produtiva ou de distribuição é atribuída a um contribuinte específico. Isso significa que uma empresa, geralmente o fabricante ou distribuidor, é responsável por recolher antecipadamente o imposto devido por todos os elos subsequentes da cadeia até o consumidor final.
No estado de São Paulo, a ST é amplamente utilizada para a cobrança do ICMS. O processo funciona da seguinte maneira: o governo estipula uma margem de valor agregado (MVA) para determinados produtos, que serve como base para calcular o imposto que será cobrado antecipadamente pelo substituto tributário. Esse cálculo leva em conta uma estimativa do preço final ao consumidor.
A substituição tributária foi instituída com o objetivo de combater a sonegação fiscal e simplificar a arrecadação de tributos. Ao centralizar a cobrança do imposto em um ponto da cadeia comercial, reduz-se o número de contribuintes obrigados a recolher o ICMS, facilitando a fiscalização pelo Estado.
Porém, principalmente na última década a substituição tributária tem gerado debates sobre seus impactos nas empresas, especialmente em São Paulo, um dos maiores centros econômicos do país.
– Competitividade: empresas paulistas enfrentam desafios ao competir com produtos de estados que oferecem benefícios fiscais, como Minas Gerais e Goiás. A ST pode elevar o custo final, além do fator de antecipação de pagamento (caixa) dos produtos, afetando em muito a competitividade, fortalecendo a debandada para outros Estados. O exemplo mais próximo que temos é a cidade de Extrema, na divisa de São Paulo e Minas Gerais, que vem experimentando um crescimento astronômico em sua economia uma vez que possui as benesses oferecidas pelo Governo mineiro principalmente na redução de ICMS, e se encontra localizada a aproximadamente 120 quilômetros da cidade de São Paulo, ou seja, com uma logística excelente.
– Fluxo de caixa: o recolhimento antecipado do imposto afeta o fluxo de caixa das empresas, que precisam pagar o ICMS antes mesmo da venda ao consumidor final.
– Complexidade administrativa: a gestão tributária torna-se mais complexa, exigindo um acompanhamento detalhado das legislações e das obrigações acessórias. E ao final da operação, o contribuinte ainda experimenta uma dificuldade extrema quando possui créditos tributários oriundos da operação, visto que o MVA utilizado para calculo do tributo, muitas vezes acaba extrapolando o valor real da operação, gerando um crédito que, para ser ressarcido demanda quase que uma intervenção divina.
De outro lado a tecnologia, nestes últimos anos, ampliou extremamente a capacidade de fiscalização da Receita, permitindo um controle mais efetivo sobre as operações das empresas. Então o principal argumento utilizado para a criação, hoje não se sustenta para a defesa da manutenção da ST, uma vez que a sonegação fiscal se torna mais difícil com o avanço dos sistemas de controle e interação com sistemas financeiros.
A recente reforma tributária, com a extinção do ICMS e criação de novos tributos no Brasil trará mudanças profundas no sistema de impostos, incluindo a provável extinção da substituição tributária.
Persiste, contudo, para os defensores da ST o argumento de que a mesma traz um adiantamento dos valores recolhidos ao caixa do governo, porém devemos lembrar que o estado de São Paulo possuí uma situação financeira diferenciada e estável, e por conta disso vale a pena o questionamento se ainda há necessidade de manter a ST, especialmente considerando os desafios enfrentados pelas empresas paulistas.
A reforma tributária quis simplificar o sistema, reduzindo a complexidade e o custo de conformidade para as empresas, além de acabar com a chamada guerra fiscal entre os Estados, unificando as alíquotas e cobranças dos novos impostos criados.
A insistência em manter a substituição tributária neste período de transição criado pela reforma tributária continuará a custar caro as empresas paulistas, como já vem fazendo a anos, pois cria-se um verdadeiro zumbi que, já morto pela nova legislação, persevera em caminhar entre nós, enfraquecendo nossas industrias e varejo, afugentando empresas, repelindo novos investimentos e com isso enfraquecendo São Paulo.
Cabe ao governo do estado de São Paulo hoje trabalhar de forma rápida e eficaz o encerramento deste ciclo, se antecipando ao que fatalmente irá ocorrer, oxigenando com isso as empresas e os empregos paulistas, fortalecendo o ambiente de negócios em nosso Estado, incentivando o crescimento econômico e a competitividade. Certamente isso trará benefícios a todos, inclusive ao próprio governo que, diante do fortalecimento das empresas paulistas certamente irá experimentar um aumento de arrecadação de tributos.
Fernando Quércia
advogado.