Responsabilidade de sócio e processo tributário
Moacyr Pinto Junior
A evolução e consolidação de jurisprudência a respeito de responsabilidade de sócio por crédito tributário de sociedade impõe defesa específica em processo administrativo tributário e, conforme o caso, em face de inscrição do débito em dívida ativa e de execução fiscal.
Refere-se, aqui, à responsabilidade pessoal atribuída aos sócios pelo artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN) em caso de “obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos”.
Até 1988, o Supremo Tribunal Federal (STF), que tinha competência para julgar interpretação divergente de lei federal, entendia que a responsabilidade de sócio prevista no artigo 135 do CTN era objetiva, isto é, existia mesmo sem culpa, dolo ou outro motivo de fato (RE 113.852-1/RJ). A Constituição de 1988 outorgou a referida competência para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) que manteve o entendimento do STF sobre responsabilidade tributária de sócio até 1996, quando começou a mudar a jurisprudência sobre o assunto (REsp 86.439/ES), a qual ficou consolidada em 1998 (REsp 100.739/SP). Em 2000 a Primeira Seção do STJ confirmou o entendimento das turmas (EREsp 100.739/SP).
Desde então, a jurisprudência é pacífica: a hipótese do artigo 135 do CTN é de responsabilidade subjetiva e compete a autoridade autora de lançamento de tributo comprovar a prática de ato “… com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos …” do qual resultou a obrigação tributária respectiva.
Tenha-se em conta que a Primeira Seção do STJ também consolidou entendimento segundo o qual “a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, nem em tese, circunstância que acarreta a responsabilidade subsidiária do sócio, prevista no art. 135 do CTN.” Segundo a referida decisão, “É indispensável, para tanto, que tenha agido com excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto da empresa.” (REsp 1.101.728/SP).
Mas, o STJ também firmou jurisprudência no sentido de que a Certidão de Dívida Ativa (CND) goza de presunção de certeza e liquidez: Se constar nela o nome do sócio ele poderá sofrer execução fiscal por débito da sociedade e será dele o ônus de provar, por meio de embargos à execução, que não ocorreram os requisitos para atribuição de responsabilidade previstos pelo CTN; caso contrário, isto é, se o nome do sócio não constar na CND, o ônus da prova compete ao sujeito ativo, ou seja, à fazenda pública (EREsp 702.23).
Na medida em que a referida jurisprudência foi sendo consolidada, a Receita Federal do Brasil e, depois, a maioria das secretarias estaduais de fazenda passaram a incluir, já no auto de infração ou notificação de lançamento, um rol de sócios da pessoa jurídica contribuinte atribuindo-lhes a qualidade de responsáveis por eventual débito tributário. E tal inclusão ocorre mesmo sem a discriminação e as provas, indispensáveis, de atos praticados “… com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos …” dos quais resultou a obrigação tributária lançada. Atualmente, na verdade, faz parte da maioria dos formulários para notificação de lançamento de ofício – auto de infração ou notificação – tal relação de sócios. Essa providência das receitas federal e estaduais tem por objetivo incluir em uma futura CND o nome dos sócios da pessoa jurídica contribuinte o que possibilitará alcançar seus patrimônios, se for o caso, em uma eventual execução fiscal. Nesta hipótese, o encargo de provar que a obrigação tributária não decorreu de excesso de poder ou de infração de lei, contrato social ou estatutos é dos sócios e somente poderá ser cumprido após a garantia do juízo por meio de embargos do devedor.
A jurisprudência consolidada e a prática administrativa das fazendas públicas apontadas anteriormente exigem de pessoas jurídicas contribuintes, no caso de auto de infração ou notificação de lançamento de tributo, verificar se os seus sócios foram relacionadas como responsáveis nos formulários fiscais e se o processo administrativo tributário contém as provas necessárias e suficientes para as suas responsabilizações.
Outrossim, além de impugnar o lançamento o contribuinte também deverá impugnar, no processo administrativo tributário, a imputação de responsabilidade feita aos sócios. A matéria também deverá ser objeto de recurso para o Conselho de Contribuintes se a impugnação for julgada improcedente. Se a responsabilização não for expressamente afastada e os sócios forem incluídos na CND, deve-se avaliar a hipótese de contestar a inclusão judicialmente, antes mesmo do início da execução fiscal, isto é, imediatamente após a inscrição do débito em dívida ativa, para prevenir penhora de bens de sócios durante execução fiscal posterior.
Moacyr Pinto Junior
Advogado, Especialista em Direito Tributário, Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental.