Reforma tributária: A integração dos contenciosos do IBS e da CBS

Eduardo Salusse

O governo federal apresentou o projeto de lei complementar (PLP) nº 108/24 que, dentre outros temas, regulamentou o contencioso administrativo do IBS sem qualquer previsão sobre a “integração” com o contencioso do CBS prevista no artigo 156-B, §8º, da emenda constitucional (EC) nº 132/23. É louvável o empenho e a qualidade do material produzido por todos os integrantes dos grupos de trabalho criados para estruturar a proposta, assim como são importantes os debates públicos e as críticas sempre construtivas.

Para relembrar, este dispositivo prevê que lei complementar poderá prever a integração do contencioso administrativo relativo aos tributos previstos nos artigos 156-A (IBS) e 195, V (CBS) da EC nº 132/23.

Chama a atenção que, tanto no referido dispositivo, quanto no artigo 156-B, III, que prevê o contencioso do IBS, há a utilização da palavra “integração” pela EC nº 132/23. Poderia o legislador ter escolhido palavra distinta, como harmonização, combinação, compatibilização, adequação ou outra. E isso suscita alguma reflexão.

Sabe-se que, no latim, a expressão “in” significa “não”, tal como podemos identificar em inúmeras palavras de uso cotidiano, como impossível, indevido, imprestável e outras. No mais, a expressão “tangere” significa “tocado”. Um bem intangível, por exemplo, é um bem que não pode ser tocado. Há a preservação de uma unidade e, logo, indivisível.

O leite integral ou o período integral não comportam a ideia de fracionamento, eis que, se não mantiverem a sua higidez, integral não serão. Estaríamos diante de algo semi-integral ou parcialmente íntegro. Na própria Constituição Federal, a utilização das expressões “integro”, “integrado” ou integral” surge em contextos que não admitem fracionamento ou parcialidade. O contencioso integrado do IBS e CBS não deve ser fracionado, mas deve ser único desde a sua instalação com a impugnação ao lançamento de ofício.

Temos, por exemplo, a assistência jurídica gratuita integral (art. 5º, LXXIV), décimo terceiro salário com base na remuneração integral (art. 7º, VIII), integração dos trabalhadores domésticos à previdência social (art. 7º parágrafo único), territórios federais integram a União (art. 18, § 2º), os Estados podem instituir regiões metropolitanas para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum (art. 25, §3º), dentre inúmeros outros exemplos.

A expressão “integrado” trazida no §8º, do artigo 156-B, da EC nº 132/23, não parece comportar uma integração parcial, pois, assim sendo, integral não será.

A primeira impressão, portanto, é no sentido de que o legislador determina um novo contencioso integrado, comportando discussões que envolvam o IBS e a CBS, sem a possibilidade de fracionamento em diversos órgãos de julgamento administrativo, ainda que prevista a existência de uma instância uniformizadora de divergências.

Sabe-se que o contencioso administrativo inicia com a impugnação ao lançamento, ainda em primeira instância. E parece que desde esse momento, o contencioso administrativo deve estar integrado, sob pena de afronta aos artigos 156-B, III e §8º, da EC nº 132/23.

A prevenção ao litígio tributário é o alvo da última década, reconhecendo-se a incapacidade dos mecanismos atuais de oferecer a adequada pacificação à sociedade. Não adianta simplificar o sistema tributário sem o oferecimento de métodos de solução de conflitos igualmente eficientes.

A CBS e o IBS são tributos idênticos, com mesmos fatos geradores, bases de cálculo, hipóteses de não incidência e sujeitos passivos; mesmas hipóteses de imunidade; mesmos regimes específicos, diferenciados ou favorecidos de tributação; e mesmas regras de não cumulatividade e de creditamento (art. 149-B). Pretende-se que sejam destacados no mesmo documento fiscal, com escrituração comum e recolhidos na mesma guia de pagamento.

Podem, todavia, ser objeto de exigência por dois autos de infração idênticos. A coexistência de dois processos administrativos tributários para decidir causas que envolvam interpretação de fatos e do direito aplicável a dois tributos idênticos (CBS e IBS) pode, inexoravelmente, acarretar em soluções distintas. A mera previsão de um órgão uniformizador no âmbito do IBS não dá a solução necessária.

Imagine a lavratura de dois autos de infração em face de uma interpretação do contribuinte que aplicou, por exemplo, alíquotas reduzidas às operações com bens ou serviços devido a uma interpretação técnica envolvendo a sua atividade. Ambos os lançamentos (CBS e IBS) sujeitar-se-ão a duas impugnações e dois processos administrativos distintos. É possível que haja a perda de um prazo em um deles, provocando o trânsito em julgado de uma decisão de forma contraditória à conclusão do outro processo. É possível que o contribuinte sustente a sua defesa em laudo técnico por ele contratado e anexado a destempo em ambos os processos, sendo que em um dos casos decreta-se a preclusão e no outro aceitem a juntada extemporânea à luz da verdade material.

Ao final e sem possibilidade processual de alcançar o órgão de uniformização por força dos distintos caminhos processuais, pode-se reconhecer a obrigação de pagar apenas um dos tributos, ao mesmo tempo em que se reconhece a inexigibilidade do outro. Sem medo de errar, pode-se dizer que isso ocorrerá no modelo proposto.

O sistema processual vigente repele a prolação de decisões contraditórias ao proibir a litispendência, a concomitância ou ao obrigar a reunião de causas por conexão e continência para julgamento conjunto. Há inegável preocupação legislativa com a segurança jurídica, a estabilidade, a coerência, a isonomia e outros alicerces do sistema. Estes percalços não poderão ser evitados da forma como o processo administrativo foi apresentado no PLP nº 108/24.

A equalização de todos os valores constitucionais é complexa e o sistema deve oferecê-la no contexto de sua função estabilizadora, construindo soluções normativas dentro dos limites do próprio ordenamento jurídico.

Mais um detalhe: há os que apontam que a expressão “poderá” no §8º, do art. 156-B, da EC nº 132/23, definiria uma faculdade ao legislador complementar. Assim não penso.

A norma jurídica tem sempre a mesma estrutura lógica, qual seja, “se o antecedente, então deve-ser o consequente”. O conectivo deôntico “dever-ser” conecta o sujeito de direitos (legislador complementar) ao consequente comportamental (prever a integração do contencioso administrativo relativo ao IBS e CBS).

De forma distinta às normas naturais que interligam o antecedente e consequente em uma relação de causa e efeito, as normas jurídicas entrelaçam o antecedente e o consequente a partir de uma dedução lógica. Logo, se o legislador complementar puder integrar os contenciosos de CBS e IBS, temos que a expressão “poderá” não representa uma faculdade, mas uma obrigação decorrente de uma norma que lhe atribuiu competência para tal. Em outras palavras, se o sistema exigir a integração dos contenciosos da IBS e CBS, então a consequência dela não deve desviar.

O functor “dever-ser” é neutro. Não tem outro papel senão conectar o antecedente ao consequente da norma, podendo resultar nos modos “permitido”, “proibido” ou “obrigatório” de acordo com implicação lógica dentro do sistema no qual está inserido.

Mais do que isso, é um conectivo presente em uma norma de competência, não havendo a prescrição comportamental senão a outorga de poderes ao legislador complementar para disciplinar a matéria. Quer-se dizer que o legislador ordinário não pode. O poder executivo também não pode. A EC nº 132 define que é o legislador complementar quem pode legislar no sentido de integrar os contenciosos do IBS e CBS.

Na norma de competência, o deôntico sempre aparece no modo “obrigatório”, eis que não compete ao Estado omitir-se dos comandos constitucionais que lhe outorgam competência, ainda que nelas surjam como “poderá” ou “deverá”.

O sentido lógico do disposto no §8º, do art. 156-B, da EC nº 132/23 parece restar claro à luz dos princípios da segurança jurídica, da harmonização, da simplificação, da cooperação, da neutralidade e da coerência inerentes à reforma tributária.

A conclusão pode ser tomada às avessas, na medida em que decisões contraditórias em processos distintos envolvendo ambos os tributos representarão a constituição definitiva de créditos tributários de forma também contraditória. E parece um consenso que contradição remete à insegurança, desarmonia, não isonomia e tantas outras violações a preceitos constitucionais.

Os rumos podem ser ajustados na fase de tramitação legislativa, impulsionados pelos debates técnicos e pelas críticas construtivas, ainda que, se necessário, mediante nova emenda constitucional.

Eduardo Salusse

Sócio fundador do escritório responsável pela área de direito tributário. Responsável executivo de pesquisa no Núcleo de Estudos Fiscais da FGV DIREITO SP. Professor em direito tributário no IBET, APET, FGV Direito e outras instituições. Conselheiro Honorário e atual Presidente do MDA – Movimento de Defesa da Advocacia. Colunista no Jornal Valor Econômico (Fio da Meada).

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