Reforma da qualidade do sistema tributário

Bernard Appy, Eurico Marcos Diniz de Santi, Isaias Coelho, Nelson Machado

Simplicidade, transparência, neutralidade e equidade são instrumentos para realizarmos nosso processo civilizatório, rumo à igualdade que dignifica e justifica a própria noção de direito.

1. Princípios para a reforma da qualidade do sistema tributário brasileiro: simplicidade, transparência, neutralidade e equidade

O momento de crise institucional é oportuno para propor nova perspectiva de futuro para a reforma da qualidade do sistema tributário brasileiro. Simplicidade, transparência, neutralidade e equidade são as diretrizes estratégicas que devem orientar a formação de consenso entre cidadãos, empresas e o Estado na conformação do sistema tributário.

Simplicidade indica facilidade e segurança jurídica para o contribuinte pagar seus tributos e cumprir suas obrigações acessórias, reduzindo as divergências na interpretação da legislação, que são a causa principal do contencioso tributário. Transparência para que os contribuintes saibam quanto estão pagando de impostos, dando visibilidade à complexa relação entre direito, economia e política, de modo a empoderar o verdadeiro titular do ônus da carga tributária – o cidadão – e aprofundar o exercício da cidadania fiscal nas eleições. Neutralidade para que a tributação sobre o consumo não crie distorções no ambiente de negócios, permitindo a eficiente alocação do investimento e prevenindo a entropia do planejamento tributário.

Enfim, a Equidade do sistema tributário indica que a tributação deve garantir o tratamento equivalente de pessoas e negócios em situações semelhantes. Afinal, simplicidade, transparência, neutralidade e equidade são instrumentos para realizarmos nosso processo civilizatório, rumo à igualdade que dignifica e justifica a própria noção de direito.

2. Características da CGC como paradigma de qualidade para orientar a reforma da tributação sobre o consumo

Os vários tributos que no Brasil oneram o consumo de bens e serviços (ICMS, IPI, PIS/COFINS, ISS) são complexos, descoordenados, cumulativos, repletos de obrigações acessórias e focos geradores de enorme contencioso. Tal situação degrada o ambiente de negócios, implica perda da competitividade nacional e dificulta o controle político da carga tributária, pois a falta de transparência acaba por iludir a percepção do cidadão sobre os tributos embutidos nos preços dos bens e serviços.

O rumo da tributação sobre o consumo no Brasil, nos últimos 50 anos, induziu guerra fiscal, sedimentou privilégios legais que comprometem a neutralidade e a livre concorrência e fomentou bilionário contencioso tributário que destruiu a segurança jurídica. O modelo atual de tributação sobre o consumo enfraqueceu a federação e reduziu a arrecadação.

A proposta desse texto é a criação de uma contribuição geral sobre o consumo (CGC) paradigma de qualidade que, paulatinamente construindo segurança jurídica, poderá substituir o PIS/COFINS, uniformizando a tributação federal sobre o consumo e criando novo cenário de futuro para o empreendedorismo no Brasil, sem prejuízo da arrecadação.

A falta de confiança entre fisco e contribuinte é um dos maiores gargalos para a mudança do sistema tributário. Há a necessidade, portanto, de construir confiança através da aplicação de novo paradigma prático de tributação que ofereça fluxo consistente de informações que irá retroalimentar o debate democrático para a transição da qualidade da tributação sobre o consumo.

O CCiF propõe que a Contribuição Geral sobre o Consumo (CGC), tenha por referência as boas práticas internacionais: alíquota única, não-cumulatividade plena e aplicação uniforme, conforme descrito a seguir.

1ª O principal objetivo da CGC deve ser ARRECADAR. A principal função de um moderno tributo sobre o consumo é arrecadar. Este tipo de imposto não deve ser utilizado com outras finalidades. Vivemos, nos últimos 50 anos, a destruição da base tributável sobre o consumo através da corrupção normativa do IPI, do PIS/COFINS, do ICMS e do ISS mediante o uso de incentivos, desonerações, guerra fiscal e politização da disputa pela base tributável. Não se deve fazer política industrial ou redistribuição de renda com tributação sobre o consumo. Qualquer distinção jurídica implica proporcional corrupção sistêmica da qualidade legal do tributo. A regra geral da CGC é arrecadar, sem atrapalhar as empresas ou o consumidor.

2ª A CGC deve ser NÃO-CUMULATIVA. O modelo proposto para a CGC é o de um tributo sobre o valor agregado (IVA), no qual a contribuição devida pelas empresas corresponde à diferença entre os débitos incidentes sobre suas vendas e os créditos relativos à contribuição incidente em suas compras. Num tributo com estas características, as empresas são meros sujeitos intermediários do tributo, que incide efetivamente sobre os consumidores.

3ª A NÃO-CUMULATIVIDADE deve ser PLENA. Na CGC, o crédito deve ser financeiro e irrestrito. Toda a CGC paga pelo contribuinte de direito (empresa) constitui seu crédito, aplicável contra a CGC que se deve pagar sobre os bens e serviços vendidos. Extingue-se a anomalia do “crédito físico”. Deve-se garantir devolução imediata dos créditos acumulados, qualquer que seja a sua origem. Modernas tecnologias fiscais como o SPED e a NF-e devem ser utilizadas para simplificar a vida do contribuinte responsável pela retenção e a translação da CGC.

4ª A CGC deve incidir sobre uma BASE AMPLA. A base de incidência da CGC deve alcançar toda universalidade de bens e serviços e todas as formas de organização da atividade econômica, seja esta realizada por pessoas jurídicas, seja por pessoas físicas.

5ª A alíquota da CGC deve ser UNIFORME. Alíquota uniforme significa alíquota única para todos os bens e serviços, pois a tributação não deve depender da classificação de bens e serviços. A alíquota única garante o empoderamento do cidadão no debate político sobre carga tributária. Quando houver necessidade de aumentar a receita tributária, aumenta-se a alíquota, sem afetar os preços relativos dos bens e dos serviços. Os preços nominais podem subir ou descer uniformemente, como a maré do oceano levanta ou abaixa igualmente todos os navios.

6ª A CGC deve desonerar completamente as exportações. As exportações de bens e serviços devem ser completamente desoneradas, garantindo-se a manutenção integral do crédito (tributação no destino).

7ª A CGC não deve onerar o investimento. O investimento deve gerar crédito integral e, caso não haja débitos suficientes, o crédito acumulado deve ser imediatamente ressarcido.

8ª A base de cálculo da CGC deve ser a receita líquida de impostos. A CGC não admite a chamada tributação “por dentro”, prática de fazer o imposto integrar a própria base, nem tampouco a inclusão em sua base de cálculo de outros tributos sobre o consumo. Tais práticas, que caracterizam o atual sistema tributário brasileiro, são frontalmente contrárias aos princípios da simplicidade e transparência.

Em síntese, um tributo com estas características atende às diretrizes que devem orientar a conformação de um bom sistema tributário:

a) É um tributo NEUTRO, pois não afeta os preços relativos nem faz distinções entre setores ou forma de organização da produção, incentivando a livre e eficiente alocação do investimento. A tributação do valor adicionado é neutra para as empresas, que são meras intermediárias entre o Estado arrecadador e os consumidores.

b) É um tributo SIMPLES, pois a tributação do valor agregado é a forma mais simples de tributação que não compromete a neutralidade. Esta simplicidade oferece segurança jurídica para o contribuinte de direito cumprir suas obrigações, reduzindo significativamente o risco de vir a ser autuado por divergências de interpretação com o fisco.

c) É um tributo TRANSPARENTE, pois a alíquota paga pelo consumidor corresponde exatamente a todo tributo recolhido ao longo da cadeia de produção e comercialização. Isso permite que os contribuintes de fato (os consumidores) sejam empoderados política, econômica e juridicamente pelo ônus tributário.

3. Estratégia de uso da cgc para a transição do PIS/COFINS

O CCiF entende que a reforma da qualidade da tributação do consumo no Brasil deve iniciar-se pelo PIS/COFINS, cuja legislação atual é extremamente complexa e disfuncional. Adicionalmente, a transformação do PIS/COFINS em um tributo de qualidade sobre o consumo pode servir de referência para uma futura reforma do ICMS e do ISS.

O objetivo final da proposta é a transformação do PIS/COFINS em uma CGC. O CCiF entende que a melhor forma de atingir este objetivo é a criação de um novo tributo, que substituiria gradualmente o PIS/COFINS. Esta estratégia justifica-se pela grande contaminação do PIS/COFINS por isenções, incentivos e regimes especiais. Justifica-se também pela possibilidade de fazer a transição em um prazo relativamente longo, permitindo que as empresas se ajustem e que as políticas de incentivo sejam redesenhadas através do uso de instrumentos mais apropriados.

Propõe-se que a CGC seja criada com uma alíquota inicial de 1%, reduzindo-se compensatoriamente as alíquotas do PIS/COFINS, de forma a manter estável o nível da arrecadação. A vigência inicial da CGC com alíquota de 1% permitiria avaliar adequadamente o funcionamento deste tributo e estimar seu potencial de arrecadação.

A segurança jurídica para os contribuintes e para a União exige período longo de transição que garanta expectativas normativas, contratos pré-fixados e adaptação de sistemas. Neste contexto, propõe-se que a alíquota da CGC seja progressivamente elevada e as alíquotas do PIS/COFINS sejam progressivamente reduzidas, de forma a que a transição seja concluída em cinco anos, garantindo-se a estabilidade da receita ao longo de toda a transição.

Em princípio, a substituição do PIS/COFINS pela CGC se daria em três etapas:

1ª ETAPA/2016 – FORMULAÇÃO DA LEGISLAÇÃO DA CGC: definição da legislação da CGC visando sua entrada em vigor no início de 2017;

2ª ETAPA/2017 – VIGÊNCIA DA CGC COM ALÍQUOTA DE 1%: o ano de 2017 seria destinado à avaliação do funcionamento e da arrecadação da CGC;

3ª ETAPA/2018-2022 – TRANSIÇÃO DO PIS/COFINS PARA A CGC: substituição progressiva do PIS/COFINS pela CGC, com aumento gradativo da alíquota geral da CGC combinada com a redução das alíquotas do PIS e da COFINS, que seriam extintos ao final da transição.

A introdução desse novo paradigma traria grande avanço à tributação do consumo. Reduz a insegurança jurídica. Elimina a cumulatividade. Acaba com as práticas de cálculos “por dentro” e retenção indevida de créditos acumulados. Incentiva a livre concorrência e melhora o ambiente de negócios, promovendo o exercício da cidadania fiscal rumo à responsabilidade dos governantes negociada, democraticamente, nas urnas.

É jogo tipo ganha-ganha, construindo o futuro do Brasil.

Bernard Appy, Eurico Marcos Diniz de Santi, Isaias Coelho, Nelson Machado

*Bernard Appy é diretor do Centro de Cidadania Fiscal - CCiF. Bacharel em economia. Foi Secretário Executivo e Secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, consultor econômico (LCA Consultores) e diretor da BM&FBOVESPA.

*Eurico Marcos Diniz de Santi é diretor do Centro de Cidadania Fiscal - CCiF. Professor de direito Tributário da Direito SP (Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas) e coordenador do NEF - Núcleo de Estudos Fiscais da FGV.

*Isaias Coelho é diretor do Centro de Cidadania Fiscal - CCiF. Doutor em economia. Coordenador e professor no programa GVlaw da Escola de Direito de São Paulo, pesquisador sênior do NEF e consultor internacional em tributação. Foi Secretário Adjunto da Secretaria da Receita Federal e chefe das divisões de administração e política tributária do Fundo Monetário Internacional.

*Nelson Machado é diretor do Centro de Cidadania Fiscal - CCiF. Doutor em contabilidade e controladoria. É professor e consultor na Escola de Economia de São Paulo (FGV). Foi Ministro de Estado da Previdência, Secretário Executivo do Ministério da Fazenda e Secretário Executivo do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão.

Gostou do artigo? Compartilhe em suas redes sociais

dafabet

iplwin

iplwin login

iplwin app

ipl win

depo 25 bonus

slot deposit pulsa

1win login

indibet login

bc game download

10cric login

fun88 login

rummy joy app

rummy mate app

yono rummy app

rummy star app

rummy best app

iplwin login

iplwin login

dafabet app

https://rs7ludo.com/

dafabet

dafabet

crazy time A

crazy time A

betvisa casino