Programa Remessa Conforme: tratamento tributário e controle aduaneiro

Leonardo Branco

A Instrução Normativa RFB nº 2.146/2023 fez importantes alterações sobre o tratamento tributário e o controle aduaneiro das remessas internacionais ao instituir o “Programa Remessa Conforme” (PRC), com a finalidade de conferir maior agilidade e previsibilidade ao fluxo do comércio internacional, harmonizando esses objetivos com uma fiscalização adequada desse fluxo crescente de mercado.

Sugere-se a leitura prévia de dois artigos desta coluna, merecedores de elogios: “Faz sentido tributar compras pequenas de plataformas internacionais?”, de Fernanda Kotzias, publicado em 31/5/2022 (aqui), e “Cross-border e-commerce, descaminho digital e algumas reflexões”, de Fernando Pieri Leonardo, publicado em 25/4/2023 (aqui), e o artigo “Ausência de responsabilidade legal na remessa e desigualdade tributária”, de Thális Andrade, publicado em 20/7/2023 (aqui).

Entre os requisitos exigidos das empresas de comércio eletrônico para serem passíveis de certificação no programa, está a determinação para que exibam para o comprador, no site de oferta do produto, se a mercadoria se encontra no exterior e será importada, e a discriminação em separado do valor da mercadoria, do frete internacional, do seguro, da tarifa postal no caso de remessa postal, do imposto de importação, do ICMS e das demais despesas, se houver.

A priori, parece-nos que tais informações devem estar de acordo com a Declaração de Importação de Remessa (DIR), sob pena de a detecção da informação inconsistente gerar notificação de exigência ao destinatário acompanhadas não apenas da interrupção do despacho no Siscomex-Remessa, mas também potencial descredenciamento da empresa no PRC.

Outro ponto relevante é a obrigatoriedade do repasse dos valores dos impostos cobrados do destinatário para o responsável pelo registro da DIR no Siscomex Remessa tem por implicação o fato de que o imposto de importação (tarifa) e o ICMS devem ser coletados pela empresa de comércio eletrônico, junto ao comprador.

A hipótese em que o legislador determina que, verificada uma determinada conduta praticada pelo contribuinte, outra pessoa terá a obrigação de recolher o tributo é denominada substituição tributária. Este o posicionamento defendido por Thális Andrade ao afirmar que “(…) a mesma norma infralegal produzida na esfera federal atribui a figura do substituto tributário para o ICMS, tributo que não é de sua competência” (aqui), de quem passamos a, respeitosamente, discordar.

Apesar da construção, a operação proposta pelo “Programa Remessa Conforme” é diversa, uma vez que o recolhimento deverá ser feito “em nome” do contribuinte (comprador), assemelhando-se muito mais a uma relação de mandato. De fato, apenas a lei poderá atribuir a responsabilidade pelo crédito tributário a um terceiro, e com a exigência de que este substituto apresente um vínculo com o fato gerador da obrigação, e neste sentido a IN RFB nº 2.146/2023 estaria a se imiscuir em matéria estadual, em clara ofensa à distribuição de competências. Não é o caso.

A empresa de comércio eletrônico deve “repassar os valores dos impostos cobrados do destinatário para o responsável pelo registro da DIR no Siscomex Remessa”. Assim, será cobrado do comprador o valor cheio, repassado ao vendedor a parcela líquida de impostos e demais despesas aduaneiras a serem recolhidos “em nome do comprador” pelo operador responsável pelo desembaraço.

Assim, não há o pressuposto da reconfiguração da relação jurídico-tributária, não há substituição. Decorrência disso é que a eventual retenção dos valores coletados, sem repasse para o operador da importação, poderá configurar apropriação indébita tributária, desde que se comprove, por evidente, contumácia da conduta e o dolo específico de apropriação dos recursos. Sob o escólio clássico de Brandão Machado, na construção do raciocínio pioneiro de Ernst Blumenstein, o substituto é o devedor que assume a posição de sujeito passivo [1], e o PRC não alcança, e nem poderia alcançar, tal pretensão.

Esse programa será importante para dar agilidade aos milhões de importações submetidas ao Regime de Tributação Simplificada (RTS), instituído em 1980. Sob tal regime, a tarifa (direito aduaneiro em sentido estrito) incidirá a uma alíquota de 60% sobre o valor aduaneiro da totalidade dos bens contidos na remessa internacional, no total de até US$ 3.000,00 (preço de aquisição, acrescido de custo do seguro e do transporte pago aos correios, empresas de courier, ou companhias aéreas).

Sob esse regime simplificado, é possível a classificação genérica dos bens importados em um ou mais grupos, aplicando-se alíquotas constantes ou progressivas em função do valor das remessas, conforme ato do Ministério da Fazenda que, em 1999, que também estabeleceu a isenção para os bens que integrem remessa postal internacional no valor de até US$ 50, desde que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas, disposição estendida às empresas de comércio eletrônico cadastradas no PRC pela Portaria MF nº 612/2023.

Sobre este particular, a partir de levantamento realizado em dezembro de 2021, a Global Express Association, nova denominação da IECC (International Express Carriers Conference) de Genebra, elaborou um guia de referência sobre custos envolvidos na importação em diferentes países.

O catálogo contém informações sobre o valor mínimo de mercadorias abaixo do qual não são cobrados encargos aduaneiros, teto conhecido como “de minimis”, bem como informações sobre acordos informais e formais de importação em diferentes países, e de acordo com o tipo de remessa.

Por meio do documento, é possível se descobrir que os Estados Unidos têm o valor mais alto da lista, com um limite de US$ 800 para remessas privadas [1], enquanto o Canadá optou por impor um limite relativamente baixo, de CAD 40 (cerca de US$ 31), e alguns países europeus, como a França e a Alemanha, estabeleceram € 150 (cerca de US$ 175).

O Brasil, assim como o México, estabeleceu um valor de “de minimis” de US$ 50 para remessas de pessoas físicas, valor acima dos US$ 30 escolhido pelo Chile, mas abaixo dos US$ 100 escolhidos por Bolívia e Paraguai, ou dos US$ 200 praticados por seus vizinhos Peru e Uruguai.

Como explicitado por Fernanda Kotzias, “(…) países com uma visão mais liberal e de integração ao comércio internacional tendem a apostar em tetos mais altos, ao passo que países mais protecionistas tendem a restringir mais os valores e tipo de uso desse mecanismo. Outro fator relevante na determinação e atualização do teto de minimis nos últimos tempos tem sido a questão do fomento ao comércio eletrônico” (aqui).

O caso dos Estados Unidos é sintomático da busca de redução de sobrecarga do trabalho das alfândegas no caso de importações menores. Sob esta justificativa, em 2016 o Congresso americano aprovou, por meio da “Trade Facilitation and Trade Enforcement Act” (TFTEA) uma emenda ao Tariff Act de 1930 aumentando o limite do de minimis de US$ 200 para US$ 800. A mudança, aliada à pandemia, exacerbou uma mudança de mercado que levaria o “Customs and Border Protection” (CBP) a reportar um acréscimo de 21% nas importações de produtos isentas entre 2020 e 2021, levando a preocupações sobre a segurança e a proteção dos direitos humanos ao longo da cadeia de valor.

De volta ao caso brasileiro, há de se levar em conta novidades também no âmbito estadual. O ICMS-Importação tem sua base de cálculo fixada pela Lei Kandir, consistente na soma do valor da mercadoria ou bem acrescido, entre outros, do II, do IPI-Importação, do IOF-Câmbio, além do próprio ICMS-Importação, “(…) quaisquer outros impostos, taxas, contribuições e despesas aduaneiras”, seguros, juros e frete.

Em 23/6/2023, sob este contexto, foi celebrado o Convênio ICMS nº 81/2023, ratificado nacionalmente, visando a uniformizar a carga tributária estadual em 17%, linearmente, não importando a classificação da mercadoria, nos casos em que a encomenda internacional tenha sido submetida, no âmbito federal, ao RTS, o que implicará novos desafios de implementação às empresas de comércio eletrônico.

As recentes alterações no panorama das importações e a preocupação com o exercício do controle aduaneiro sobre o comércio eletrônico têm a difícil tarefa de fiscalizar a contento as encomendas de baixo valor que, no ano de 2022, somaram 176,3 milhões de pacotes recebidos nas fronteiras brasileiras.

[1] MACHADO, Brandão. Adicional do imposto de renda dos Estados. Repertório IOB de Jurisprudência nº 18, p. 294.

Leonardo Branco

Conselheiro titular e vice-presidente de Turma no Carf, doutorando, mestre e especialista em Direito Tributário pela Faculdade de Direito da USP, com estágio doutoral na Westfälische Wilhelms-Universität (WWU-Münster) como bolsista DAAD, coordenador do curso "Direito Aduaneiro e Tributação do Comércio internacional" no IBDT e do curso "Tributação do Mercado Financeiro e de Capitais" no IBDT e na Apet, professor de Direito Tributário e Aduaneiro no IBDT, Ibet, FGV, FIA, Fipecafi, Inova e IDP (pós-graduação) e FK-Partners (exame CFP). Pesquisador do Núcleo de Estudos Fiscais da FGV-Direito/SP.

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