O que fazer para reduzir o valor dos parcelamentos de dívidas de ICMS

Raul Haidar

O Estado é o tipo de organização que, apesar de fazer grandes coisas de forma errada, faz mal às coisas pequenas também. (John Kenneth Galbraith)

Em coluna de 8 de maio com o título de Parcelamentos podem ser armadilhas se incluirmos neles o que não devemos registrei:“Como é público e notório, burocratas da administração fazendária e demais servidores públicos possuem o hábito de alterar, ampliar ou restringir o alcance de normas legais, quando as deveriam apenas regulamentar ou editar atos necessários à sua execução, tornando-as mais simples e práticas.”

Rotulei como armadilhas as possibilidades de que nos parcelamentos os contribuintes pudessem ser obrigados a aceitar acréscimos legalmente indevidos, sofrer interpretações equivocadas por parte da administração fazendária ou mesmo pagar dívidas prescritas.

Recomendo a todos a leitura de notícia aqui divulgada no sábado, dia 21, sobre liminar concedida pelo Dr. Heraldo Garcia Vitta, juiz da 6ª Vara Cível da Justiça Federal em São Paulo, relacionada com parcelamentos de débitos fiscais.

O que mais me chamou a atenção na matéria foi um trecho da decisão: “Não se pode atribuir ao contribuinte todos os ônus decorrentes da intempérie política e econômica enfrentada pelo país, sob risco de violação dos princípios da Constituição que regem a ordem econômica.”

Ouvi de um colega que os pedidos de parcelamento, sendo confissão de dívidas líquidas e certas, cujos valores ficariam consolidados nessa ocasião, tornam-se “atos jurídicos perfeitos”, não podendo mais ser discutidos.

Todavia, a Constituição Federal, no artigo 5º, incisos XXXV e XXXVI ordena que:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

Há inúmeros casos de autos de infração onde são cobradas multas com efeitos confiscatórios e juros calculados ao arrepio da lei. Tais lançamentos representam lesão ao direito dos contribuintes.

Outras garantias são asseguradas pelo artigo 150 da Constituição, que em seu inciso IV proíbe “utilizar tributo com efeito de confisco;”

Sobre tal assunto, peço aos leitores que leiam minha coluna de 19 de setembro de 2011, com o título: “Multas absurdas devem ser canceladas pelo Judiciário.”

Nesse trabalho informei que embora esse inciso IV faça referência a tributo, “a jurisprudência e a doutrina entendem perfeitamente aplicável às multas a mesma limitação.”

O STF na ADI-MC 1075/DF (DJU 24/11/2006, página 59) decidiu que não é possível multa com efeito nitidamente confiscatório. Na Medida Cautelar, o voto do relator, ministro Celso de Mello registra que:

É inquestionável, Senhores Ministros, considerando-se a realidade normativa emergente do ordenamento constitucional brasileiro, que nenhum tributo – e, por extensão, nenhuma penalidade pecuniária oriunda do descumprimento de obrigações tributárias principais ou acessórias – poderá revestir-se de efeito confiscatório. Mais do que simples proposição doutrinária, essa asserção encontra fundamento em nosso sistema de direito constitucional positivo, que consagra, de modo explícito,a absoluta interdição de quaisquer práticas estatais de caráter confiscatório, com ressalva de situações especiais taxativamente definidas no próprio texto da Carta Política (art. 243 e seu parágrafo único).

Em relação aos juros o fisco paulista já lançou taxa de 0,33% ao dia, muito superior à taxa Selic e àquela de 1% ao mês a que se refere o artigo 161 do Código Tributário Nacional.

Na coluna de 24 de julho último, sob o título Juros ilegais cobrados nas dívidas fiscais, o leitor encontra os fundamentos que podem justificar que seja afastada a cobrança de juros pela forma como a lei paulista determina.

Não existe nenhum “direito adquirido” que à luz dos princípios constitucionais vigentes, autorize alguém a cobrar o indevido ou confiscar o que não lhe pertence. Também não se pode considerar “ato jurídico perfeito” aquele que possa legitimar um crime. Nessa hipótese, o crime de excesso de exação.

Há casos de multas de ICMS cujos valores superam mais de 10 vezes o valor do imposto devido. Nos autos de infração há lançamentos onde os juros extorsivos são calculados sobre multas confiscatórias.

A criação de multas nesses patamares remonta à época da inflação descontrolada da década de 1990, quando atingimos a mais de 2.200% num ano. Nesse tempo havia quem pudesse compensar o risco dessas multas com os rendimentos obtidos na agiotagem descontrolada do over night ou do mercado negro das moedas estrangeiras. Havia, ainda, a ensandecida remarcação das maquininhas que no comércio agiam diuturnamente. No supermercado o que pela manhã se vendia a um preço, no fim da tarde já o ostentava com aumento. Esqueceu-se o Fisco que a inflação é outra…

Portanto, podem e devem os contribuintes que estão pagando o parcelamento do ICMS pleitear judicialmente a retificação dos respectivos valores, afastando as cobranças de multas confiscatórias e de juros extorsivos e ilegais. A isso dá-se o nome de Justiça Tributária!

Raul Haidar

Jornalista e advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

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