O julgamento da ‘tese do século’ pelo STF e a reação da Receita Federal
Morvan Meirelles
O Supremo Tribunal Federal encerrou recentemente a discussão acerca da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Pasep e Cofins, também conhecida como a “tese do século”. Dentro da expectativa daqueles envolvidos com o tema, a Corte Superior confirmou que o ICMS a ser excluído das contribuições é o destacado em nota fiscal emitida pelo contribuinte. Também decidiu que os efeitos da respectiva declaração de inconstitucionalidade se darão a partir da data original de julgamento do leading case, ou seja, 15/3/2017, salvaguardados os contribuintes que ajuizaram discussão sobre o tema até essa data.
Em decorrência dos impactos esperados na arrecadação federal, inclusive com notícias de recorde de compensações efetuadas pelos contribuintes nos últimos períodos de apuração de tributos federais, já há discussão sobre possível “reação” da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
Especificamente, haveria indicativos de possível adoção, por parte da autoridade fiscal, de limitação na geração dos créditos de PIS/Pasep e Cofins no regime de apuração não-cumulativo dessas contribuições, particularmente, com a exclusão do ICMS também nesses casos.
Ocorre que, ainda que fosse possível argumentar pela neutralidade dessa sistemática ajustada de apuração de créditos escriturais daquelas contribuições — contrapondo-se, como argumentos, o fato de que esse tema não foi abordado pelo STF e a legislação que regulamenta a apuração não-cumulativa das contribuições não indicar essa possibilidade de restrição — há algo inerente à sistemática não-cumulativa do PIS/Pasep e Cofins que afasta por completo qualquer possibilidade nesse sentido.
Ora, diferentemente do ICMS e IPI, em que o crédito “aproveitável” pelo agente econômico que sucede cada incidência corresponde exatamente ao tributo pago na etapa anterior — daí a necessidade de seu destaque em documento fiscal, na apuração daquelas contribuições —, os créditos são gerados em regime de “base contra base”. Vale dizer: o crédito escritural é gerado em função da “despesa” assumida pelo adquirente da mercadoria ou serviço.
E, considerando que inegavelmente o ICMS destacado na nota de saída de mercadoria adquirida pelo contribuinte daquelas contribuições será por ele pago, ainda que não represente “receita” do remetente, não há sequer como se cogitar a possibilidade de exclusão desse valor para fins de apuração dos créditos de PIS/Pasep e Cofins passíveis de aproveitando pelo primeiro.
Daí porque qualquer tentativa nesse sentido, inclusive e principalmente por intermédio de normativo infralegal, representaria inegável afronta a diversos princípios constitucionais. É possível citar, por evidente, o princípio da legalidade; afinal, conforme acima, não há previsão em lei quanto à possibilidade de limitação de geração de créditos escriturais nesses casos; e da isonomia, já que, por exemplo, a geração “integral” de créditos daquelas contribuições na aquisição de qualquer mercadoria ou serviço não sujeito ao ICMS acabaria por criar critérios de diferenciação entre contribuintes em situação objetivamente igual.
Fonte Conjur
Morvan Meirelles
Advogado especialista em Direito Tributário, LLM em Direito Tributário Internacional e sócio do escritório Meirelles Milaré Advogados.