Modernização da legislação tributária
Robson Rodolfo Silveira Santos.
A cada dia surgem novas abordagens sobre o arcabouço tributário brasileiro que impõe aos contribuintes e à sociedade de um modo geral uma carga de complexidades, custo financeiro e mesmo psicológico.
Por isso é um desafio buscar um novo enfoque para reflexão sobre o tema que deve compreender, não só as disposições constitucionais e infraconstitucionais como, também, as normas procedimentais.
Justamente sobre essas pretendemos fazer uma breve consideração.
Há um flagrante descompasso entre o ordenamento jurídico vigente conhecido como sistema tributário nacional e a realidade sobre a qual é aplicado.
A norma jurídica (dever-ser) não acompanha pari passu a realidade (ser) e nem poderia ser diferente, pois o casuísmo não deve existir no estado de direito, pelo contrário, a segurança jurídica também decorre exatamente da normatização de determinada conduta, amplamente divulgada pelos meios oficiais a tempo de todos tomarem conhecimento da sua existência e cumpri-la.
A distância entre a norma e a realidade deve ser muito bem calibrada e na dose certa. Caso contrário haverá uma desconexão completa entre a situação normatizada e a situação real a ponto de tornar a norma inservível ou inaplicável.
Nas relações comerciais o descompasso entre a norma tributária e as situações que ela pretende disciplinar atingiu um nível tal que já inviabiliza muitos contratos ou, se não chega a tanto, dificulta certas operações, causa prejuízos, repercute em toda a economia e nos interesses do próprio Fisco na medida em que, como inibidor da atividade econômica, terá menor arrecadação.
Para o responsável pelo gerenciamento de riscos de qualquer companhia, um dos assuntos que mais demanda cuidado é a necessidade de realizar a atividade fim da empresa sem incorrer em penalidades fiscais por descumprimento da legislação.
O empreendedor procura utilizar as melhores e mais modernas técnicas e ferramentas de gestão, com foco na redução de custos, otimização de processos e maximização do lucro. Isso envolve uma série de questões inclusive aquelas relacionadas com logística, condições de contrato que, como quase tudo, estão interrelacionadas com a legislação fiscal.
São situações antagônicas em muitos casos, pois de um lado existe o objetivo social da empresa e por outro tem a legislação fiscal embaraçando ou impedindo a efetivação do negócio.
De acordo com essa legislação, uma mercadoria com saída de São Paulo para cliente localizado em Mato Grosso, se devolvida, mesmo com a possibilidade de refaturamento para cliente em Mato Grosso do Sul, deverá retornar fisicamente ao Estado de origem para posterior faturamento para o novo cliente. Não existe na legislação estadual nenhuma disposição permitindo que a mercadoria ao invés de retornar a São Paulo, fique em Mato Grosso do Sul. Quando muito, para simplificar e desonerar a logística, é possível pleitear ao Fisco um regime especial cuja concessão nem sempre é líquida e certa.
Nessa hora a conta passa a ser outra já que envolve vários aspectos tais como prazo de entrega, condições das estradas, custo de frete adicional, etc.
As empresas hoje precisam se adaptar a um procedimento prescrito na segunda metade do século passado, cuja dinâmica de negócios naquela época era bem diferente da que temos nos dias atuais.
Com o advento do comércio eletrônico e outras tantas modalidades de vendas, acirramento da concorrência, inclusive dos produtos estrangeiros, um diferencial que permite ao contribuinte concretizar o negócio vai esbarrar em procedimentos fiscais ultrapassados pela velocidade dos fatos.
Se mesmo assim a empresa decidir realizar a venda, terá também que assumir eventuais riscos e fazer o provisionamento em consonância com as regras contábeis.
É preciso não somente reduzir a carga tributária em toda a cadeia, como também modernizar a legislação que trata dos procedimentos fiscais já que esses resultam em maior ônus para todos e particularmente para os consumidores pois, desde que criaram a figura do repasse, "não existe almoço de graça" segundo dizia Milton Friedman.
Estamos discutindo como realizar uma reforma tributária cujo sucesso depende, primordialmente, de acertos políticos mesmo com pano de fundo na questão financeira da repartição do bolo, pois ninguém admite perder a arrecadação atual.
Não seria o caso de estabelecer como objetivo no curto prazo a modernização da legislação fiscal?
Atualmente existem mais de 30 modelos de documentos fiscais somente na legislação estadual. Além de inúmeros procedimentos que exigem injustificadamente várias notas fiscais como, por exemplo, Venda à Ordem, Faturamento com Entrega Futura, Industrialização por Encomenda, Consignação, Demonstração e etc.
Um choque de modernização e de racionalidade nessa legislação já possibilitaria uma considerável redução dos custos na gestão tributária das empresas.
Essa ação não depende do Congresso Nacional e de negociações políticas de complicada equação.
Com a anuência dos Estados, Distrito Federal, Ministério da Fazenda e entidades de classe, os técnicos poderiam se reunir no âmbito da Comissão Técnica Permanente (Cotepe), órgão que assessora as decisões do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), para deliberar sobre matéria estritamente relacionada com procedimentos fiscais sem qualquer ingerência na arrecadação e/ou na repartição tributária.
Seria um passo a mais para elevar o Brasil no ranking da competitividade global.
Robson Rodolfo Silveira Santos.
Bacharel em Direito, Advogado, especializado em legislação tributária, consultor e instrutor de cursos na área fiscal.