Inadimplemento reiterado de obrigação tributária e redirecionamento da execução fiscal ao sócio administrador.

Eduardo M.L. Rodrigues de Castro

Uma releitura do Enunciado nº 430 da súmula do Superior Tribunal de Justiça

Os sócios administradores não responderão pessoalmente pelos tributos devidos pelas empresas, salvo comprovação de atuação dolosa caracterizadora de infração à lei, contrato social ou estatuto, ou mesmo quando da prática de crime contra a ordem tributária.

1. Introdução
Ao longo dos últimos anos, a jurisprudência pátria, capitaneada pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ, consolidou o entendimento de que “o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”1.

Tal entendimento encontra fundamento na presunção de boa-fé dos administradores e, na maioria das vezes, na inexigibilidade de conduta diversa por parte do gerente. Acredita-se sempre, a princípio, na efetiva dificuldade econômico-financeira da empresa de pagar seus tributos sem prejuízo de outras obrigações, como os débitos trabalhistas, por exemplo.

Infelizmente, o posicionamento supra vem sendo adotado de maneira superficial e indiscriminada pelos Tribunais pátrios. De fato, independentemente da análise da situação concretamente posta em juízo, não se verificando uma das hipóteses já sedimentadas de redirecionamento da execução fiscal ao sócio administrador, como, por exemplo, a dissolução irregular da empresa ou mesmo a verificação de crime contra a ordem tributária, os magistrados têm ignorado a responsabilidade do gerente em caso de reiterado não pagamento de tributos pela empresa.

A verdade é que, em muitos casos, como será mais detidamente analisado adiante, o não pagamento de tributos faz parte de ardil e astuciosa estratégia negocial levada a cabo pelos sócios gerentes, tudo sempre sob a alcunha do planejamento tributário. Tal expediente, além de extremamente lesivo aos cofres públicos e, consequentemente, à sociedade, traz graves desequilíbrios ao mercado, pois as empresas inadimplentes acabam por enfraquecer as concorrentes.

O que se vai demonstrar adiante é a importância da expressão “por si só” contida no enunciado sumular do Superior Tribunal de Justiça. Caso reste comprovado que o inadimplemento tributário é mera opção do sócio administrador, deverá este ser responsabilizado pelos valores devidos, tudo nos moldes do artigo 35, inciso III do Código Tributário Nacional – CTN.

Antes, no entanto, far-se-á estudo detalhado da evolução da jurisprudência no que diz respeito ao instituto da responsabilização do administrador que age de má-fé pelos débitos tributários da sociedade e do redirecionamento ao sócio gerente em sede de execução fiscal.

2. A responsabilidade do sócio gerente por dívidas da empresa. Aspectos materiais

2.1. Natureza da responsabilidade

A responsabilidade dos gerentes e administradores por dívidas tributárias assumidas pela sociedade está prevista no Código Tributário Nacional – CTN, mais precisamente em seu artigo 135, inciso III e artigo 138, caput e incisos. Muito embora outros diplomas legais também disponham sobre a matéria, como a Lei Complementar n. 123, de 23/04/20062, por exemplo, a jurisprudência brasileira tem entendido haver sempre a necessária aplicação conjunta dos enunciados legais extravagantes com os dispositivos do CTN3.

Nos termos dos dispositivos supra, o administrador responderá pelos débitos tributários em caso de violação de lei, contrato social ou estatuto, assim como quando agir com excesso de poder. Ademais disso, integrará o pólo passivo de execução fiscal nos casos de cometimento, em nome da empresa, de infração dolosa.
A primeira polêmica envolvendo o assunto diz respeito à natureza da responsabilidade do terceiro pelos débitos tributários da sociedade. Como a redação do Código Tributário Nacional não é precisa, e fala apenas em “responsabilidade pessoal”, três correntes doutrinárias ganharam força no país.

A primeira dessas correntes é a mais aceita tanto na doutrina quanto na jurisprudência4 e defende que, ao falar em responsabilidade pessoal, teria o legislador querido excluir a responsabilidade do contribuinte em desfavor daquele que praticara o ato ilícito. Trata-se de responsabilidade exclusiva de terceiros, que, nas palavras de Regina Helena Costa, “agem dolosamente e que, por isso, substituem o contribuinte na obrigação nos casos em que tiverem praticado atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos5”.

A teoria peca, data vênia, ao não diferenciar as condutas ilícitas perpetradas por gerentes e administradores, colocando todos eles na vala comum daqueles que agem em benefício próprio em detrimento dos interesses da sociedade.
Uma segunda corrente entende ser a responsabilidade dos sócios, prevista nos artigos 135 e 137 do CTN, meramente subsidiária6. Assim, mesmo em caso de ato praticado com abuso de poder ou violação legal, só responderiam administradores e representantes das sociedades contribuintes em caso de impossibilidade de pagamento por partes destas.

Mostra-se falho também referido posicionamento ao necessariamente excluir um dos 2 (dois) responsáveis legais pelo débito tributário. Verifica-se clara e injustificável punição à Fazenda Pública, que, mesmo tendo conhecimento das ilicitudes perpetradas pelos sócios administradores, só poderá adentrar o patrimônio individual após o esgotamento das buscas no patrimônio da sociedade.
A terceira corrente defende a responsabilidade solidária de sociedade contribuinte e sócio administrador. Sobre o assunto, é bastante claro o trecho abaixo colacionado, de lavra de Hugo de Brito Machado:

“A lei diz que são pessoalmente responsáveis, mas não diz que sejam as únicas. A exclusão da responsabilidade, a nosso ver, teria de ser expressa. Com efeito, a responsabilidade do contribuinte decorre de sua condição de sujeito passivo direto da relação obrigacional. Independe de disposição legal que expressamente a estabeleça. Assim, em se tratando de responsabilidade inerente à própria condição de contribuinte, não é razoável admitir-se que desapareça sem que a lei o diga expressamente. Isto, aliás, é o que se depreende do disposto no art. 128 do Código Tributário Nacional (…).”7

Esta última é a teoria defendia neste trabalho. Nada há na lei que permita concluir pela exclusão do dever da sociedade empresária de pagar aquilo que deve em virtude da concretização da hipótese de incidência tributária. Falar em responsabilidade pessoal, de maneira nenhuma, é o mesmo que falar em responsabilidade exclusiva. O fato de os sócios usarem a pessoa jurídica como escudo para a prática de condutas ilícitas não pode e nem deve retirar do fisco o direito de buscar a satisfação de seu crédito também no patrimônio da empresa.

Não se pode olvidar também que, na grande maioria dos casos, os sócios administradores são proprietários da maior parcela do capital social da empresa, de forma que, o prejuízo daquela quase inevitavelmente implica no prejuízo do sócio majoritário.

Ultrapassada a celeuma, passa-se agora ao exame dos casos mais usuais de responsabilização tributária de terceiro por atos ilegais.

2.2. Hipóteses de responsabilização do sócio gerente por débitos tributários

Conforme dito anteriormente, as hipóteses de responsabilidade do sócio administrador pelos tributos devidos pela empresa estão previstas, quase todas, no Código Tributário Nacional – CTN, mais especificamente nos art. 135, III e 137, I, II e III. Nessa toada, assim dispõe o CTN:

“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

I – as pessoas referidas no artigo anterior;
II – os mandatários, prepostos e empregados;
III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”
“Art. 137. A responsabilidade é pessoal ao agente:
I – quanto às infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções, salvo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito;
II – quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar;
III – quanto às infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo específico:
a) das pessoas referidas no artigo 134, contra aquelas por quem respondem;
b) dos mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou empregadores;
c) dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra estas.”

Haverá responsabilidade – solidária, repise-se – do sócio administrador por infração a contrato social ou estatuto empresarial quando, por exemplo, diretor de recursos humanos celebrar sucessivas transações comerciais em nome da empresa. Nessa situação, o ICMS só será exigível diretamente do gestor quando houver previsão expressa nos atos constitutivos da sociedade acerca de suas atribuições e proibições. O dispositivo deve ser interpretado com razoabilidade, a fim de não tornar engessado o ofício dos dirigentes.

Fala-se em violação à lei, por sua vez, quando o fato gerador da obrigação tributária não decorrer de infração, por parte do dirigente, à norma de natureza negocial. Muito embora o art. 135, inciso III, do CTN seja o fundamento maior para o redirecionamento em caso de infração legal, poucos são os casos concretos em que os gestores são chamados a integrar o polo passivo da lide fiscal. Na verdade, não estando o nome do sócio gestor incluído na Certidão de Dívida Ativa – por ocasião do lançamento tributário -, os magistrados só tem admitido sua responsabilidade tributária com base no art. 135, III, CTN, em uma hipótese, qual seja, a da dissolução irregular da empresa8.

Leandro Paulsen, René Bergmann Ávila e Ingrid Schroder Sliwka lecionam que:

“É predominante o entendimento no sentido de que a dissolução irregular estabelece a presunção de que o patrimônio da sociedade tenha sido dissipado em prejuízo dos credores, dentre eles, o credor preferencial (o próprio Fisco), e que, em razão disso, enseja o redirecionamento da execução, cabendo aos sócios-gerentes/diretores/administradores, em embargos, a demonstração de que não agiram com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. É preciso reconhecer, contudo, que a matéria tem sido tratada de maneira simplista, seja quanto ao enquadramento da hipótese no art. 135, III do CTN, seja quanto à dispensa de procedimento específico. A responsabilidade dos sócios pelo redirecionamento deveria seguir, isto sim, a legislação societária, aplicável subsidiariamente, tendo em conta a ausência de dispositivo próprio que trate do assunto no CTN.”9

Trata-se de presunção – relativa – de violação a dispositivo legal, mais precisamente, aos mandamentos do Código Civil de 2002 que versam acerca do procedimento de dissolução e liquidação da empresa.

Ainda nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ, “a presunção aí é a de que o patrimônio social foi distraído em benefício dos sócios, em detrimento dos credores10”, ou seja, entende-se que a empresa não honrou com seus últimos compromissos por ter destinado seus bens aos sócios. Em outras palavras, os administradores, por seus atos ilegais, tornaram impossível o pagamento dos créditos devidos à Fazenda pública, devendo, por isso, ser responsabilizados.

Importante salientar que o redirecionamento da execução fiscal nesses casos independe de prova cabal e inequívoca da dissolução ilegal. De fato, segundo entendimento jurisprudencial, meros indícios de fechamento irregular já são suficientes à inclusão do sócio no pólo passivo da lide, tais como “a ausência de bens para penhora, abandono do estabelecimento e cessação das atividades”11.

O procedimento ideal para a configuração da dissolução irregular da empresa, no entanto, é a certificação, pelo oficial de justiça, da situação de encerramento das atividades por lapso temporal razoável.

Uma das hipóteses mais comuns de responsabilidade tributária de sócio administrador se dará nos casos de prática de crime contra a ordem tributária. Nos ditames do art. 137, inciso I, do CTN, “a responsabilidade é pessoal ao agente quanto às infrações conceituadas como crimes ou contravenções (…)”. Nesse caso, não constando o nome do infrator na Certidão de Dívida Ativa, tem-se admitido o redirecionamento em sede de execução fiscal. Para tanto, basta ao ente fazendário a juntada aos autos da peça de denúncia devidamente protocolada pelo Ministério Público no juízo criminal e o pedido de inclusão do administrador no pólo passivo da ação.

Seria pouco razoável e atém mesmo ilógico que, em sendo processado por crime previsto na Lei Federal nº. 8.137/90, não respondesse o sócio administrador solidariamente à empresa pelas dívidas tributárias desta.

O sócio gerente responderá pela obrigação tributária também nos demais casos previstos no art. 137 do Código Tributário Nacional, que versa sobre responsabilidade por infrações.

Na primeira hipótese (Art. 137, II, a, CTN), a conduta dolosa é pressuposto da infração. Não basta que o agente tenha deliberadamente violado a lei, é preciso que o tipo legal preveja punição para condutas dolosas.

Diferente é a situação descrita no art. 137, II, b, do CTN. Aqui o sócio gerente responderá apenas quando comprovada e inequivocamente tiver agido com dolo, independentemente do que dispuser o tipo legal da infração. Assim, mesmo que a lei tributária narre como faltosa uma conduta meramente culposa, a responsabilidade pelo pagamento da multa eventualmente aplicada só será também dos administradores casos estes tenham procedido de maneira dolosa.

Por fim, quanto a responsabilidade do sócio por inadimplemento de tributos, por ora, tem-se a destacar a posição consolidada na jurisprudência pátria por meio do enunciado n. 430 do STJ, que diz que “o inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”.

A regra enunciada acima, no entanto, não pode ser aplicada de maneira absoluta, como, repita-se, vem fazendo os julgadores por todo o país. Há casos concretos em que se verifica de maneira clara que o não pagamento de tributos decorre não dos infortúnios próprios da atividade empresarial, mas de simples opção dos sócios administradores.
É sobre esse problema que serão tecidos maiores comentários nesta obra, não sem antes serem abordados assuntos de ordem processual relacionados à responsabilidade de terceiros por débitos tributários da empresa.

3. O redirecionamento da execução fiscal ao sócio gerente. Casos em que o administrador encontra-se ou não incluído na Certidão de Dívida Ativa

Muito embora seja exceção, casos há em que já no processo administrativo de lançamento é possível verificar, além da ocorrência do fato gerador, a existência de uma, ou até mesmo mais de uma das hipóteses discriminadas acima de responsabilidade tributária de mandatários das pessoas jurídicas de direito privado. Aqui, deve haver intimação das referidas pessoas para que apresente manifestação já na fase administrativa. Fracassada a defesa e constituído definitivamente o crédito tributário, deverá o nome do sócio administrador figurar na Certidão de Dívida Ativa – CDA.

Constando o nome do administrador na CDA, título executivo que torna possível a execução fiscal, tem-se a presunção – relativa, é bom que se diga – de que aquele é solidariamente responsável pela dívida e que agiu de má-fé contemporânea ou anteriormente à verificação do fato gerador da obrigação tributária. Esse é o posicionamento dominante na jurisprudência nacional, como faz prova acórdão de lavra do Superior Tribunal de Justiça – STJ abaixo ementado:

“TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ART. 135 DO CTN. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE. EXECUÇÃO FUNDADA EM CDA QUE INDICA O NOME DO SÓCIO. REDIRECIONAMENTO. DISTINÇÃO.

1. Iniciada a execução contra a pessoa jurídica e, posteriormente, redirecionada contra o sócio-gerente, que não constava da CDA, cabe ao Fisco demonstrar a presença de um dos requisitos do art. 135 do CTN. Se a Fazenda Pública, ao propor a ação, não visualizava qualquer fato capaz de estender a responsabilidade ao sócio-gerente e, posteriormente, pretende voltar-se também contra o seu patrimônio, deverá demonstrar infração à lei, ao contrato social ou aos estatutos ou, ainda, dissolução irregular da sociedade.

2. Se a execução foi proposta contra a pessoa jurídica e contra o sócio-gerente, a este compete o ônus da prova, já que a CDA goza de presunção relativa de liquidez e certeza, nos termos do art. 204 do CTN c/c o art. 3º da Lei n.º 6.830/80.

3. Caso a execução tenha sido proposta somente contra a pessoa jurídica e havendo indicação do nome do sócio-gerente na CDA como co-responsável tributário, não se trata de típico redirecionamento.

Neste caso, o ônus da prova compete igualmente ao sócio, tendo em vista a presunção relativa de liquidez e certeza que milita em favor da Certidão de Dívida Ativa.

4. Na hipótese, a execução foi proposta com base em CDA da qual constava o nome do sócio-gerente como co-responsável tributário, do que se conclui caber a ele o ônus de provar a ausência dos requisitos do art. 135 do CTN.

5. Embargos de divergência providos.” (EREsp 702.232/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/09/2005, DJ 26/09/2005)
Sobre o tema, confira-se também as palavras do professor Jaime Marins:
“Ao contrário dos outros títulos em que se manifesta a vontade do devedor (títulos extrajudiciais civis ou comerciais) ou o pronunciamento condenatório do Poder Judiciário (títulos judiciais), a Certidão de Dívida Ativa é manifestação da autotutela do Estado em matéria exatorial. (…)

“Submete-se a execução à prévia inscrição do débito em dívida ativa, que está a cargo da Fazenda Pública, que tem o dever de realizá-la. Então, observadas as formalidades necessárias para o reconhecimento pleno do crédito ao ser executado no âmbito administrativo, pode ter início a execução fiscal. É portanto limitada a execução ao que foi aferido no procedimento administrativo que ampara o ato de lançamento e onde dá-se o acertamento do crédito plasmado no título que instrumentaliza a execução. A CDA deve refletir de forma idônea o que se apurou no procedimento administrativo. Semelhante detalhe, por vezes, escapa à autoridade fiscal.”12

A regra, no entanto, é que nas Certidões de Dívida Ativa não conste o nome dos sócios, administradores ou mandatários das referidas entidades. Privilegia-se assim a autonomia da personalidade jurídica da empresa, cabendo apenas a esta, em regra, o cumprimento de suas obrigações, sendo meramente representada pelos sócios administradores.
Aqui, o chamado redirecionamento da execução ao sócio será mais dificultoso, sobretudo se levado em conta o fato de que a esse não fora dada a anterior oportunidade de manifestação e defesa. O fato é que a demonstração da configuração de uma das situações previstas em lei como caracterizadoras da responsabilidade deverá ser provada por meio de incidente cognitivo no processo de execução, asseguradas sempre as garantias do contraditório e da ampla defesa13.

Em tais situações – não inclusão do nome do sócio na CDA -, conforme explicado acima, o redirecionamento só tem sido admitido nos estritos casos já amplamente reiterados na jurisprudência pátria. Os magistrados têm usado a jurisprudência das Cortes Superiores como verdadeira cartilha, que deve ser fiel e rigidamente seguida. Lamentavelmente, parece não haver vontade de se perquirir, no caso concreto, a existência de má-fé, abuso de direito ou mesmo ilegalidade na conduta dos administradores cujos nomes não constem nas CDA.
A situação torna-se ainda mais difícil nos casos de tributo declarado e não pago, em que, a contar do vencimento, já se tem por considerado realizado o lançamento e constituído o crédito tributário. Isso se dá pelo fato de não haver propriamente um processo administrativo de lançamento, oportunidade em que são apuradas as responsabilidades de contribuintes e terceiros, mas mera homologação, quase sempre tácita, de pagamento.
É justamente com base nas dificuldades apontadas acima e no entendimento consolidado no enunciado número 430 do STJ que diversos administradores, sabedores da inexistência de risco de redirecionamento, têm optado pelo puro e simples não pagamento de tributos.
Tal situação só tomará novos rumos a partir do momento em que os magistrados começarem a tratar com maior zelo os incidentes cognitivos de reconhecimento de responsabilidade de terceiro apresentados em sede de execução fiscal.

4. A responsabilidade do sócio gerente pelo não pagamento de tributos

4.1. A posição do Superior Tribunal de Justiça

Durante algum tempo pairou, em doutrina e jurisprudência, controvérsia acerca da responsabilidade dos sócios administradores decorrente não pagamento de tributos pela empresa contribuinte. Aqueles que defendiam a responsabilização afirmavam que o simples fato de não cumprir uma obrigação decorrente de lei já seria mais do que suficiente para enquadrar o sócio nos termos do disposto no art. 135, III, do Código Tributário Nacional. Em outras palavras, não pagar tributos é violar a lei, e o administrador que viola a lei deve responder pessoalmente pelos débitos da empresa.
Doutrina e jurisprudência majoritárias, no entanto, sempre se posicionaram no sentido de conferir ao art. 135, III, do CTN, uma interpretação mais humanística, que levasse em consideração critérios outros além dos estritamente legais. Não seria justo nem tampouco razoável que, independentemente da situação concreta, os administradores fossem sempre responsáveis pelos tributos não pagos pela empresa.
A verdade é que, na maioria dos casos, o não pagamento de tributos pela empresa não decorre da vontade dos mandatários e gestores, mas de uma série de fatores, como, por exemplo, a não compreensão da complexa legislação tributária, as dificuldades econômico-financeiras suportadas pela empresa e pelo país ou mesmo o descumprimento das obrigações assumidas por devedores e fornecedores. Em suma, a regra é que não se paga tributo quando não é possível, independentemente da vontade dos administradores.

Foi com base nisso que o Superior Tribunal de Justiça – STJ consolidou o entendimento – já abordado -, por meio do enunciado nº. 430 de sua súmula de jurisprudência, de que o mero descumprimento da obrigação tributária pela empresa não culmina na responsabilidade do sócio gerente. Busca-se sempre garantir a presunção de boa-fé do gestor privado. O não pagamento de tributo, à primeira vista, deve ser encarado como um dissabor, decorrente das intempéries próprias da vida negocial. No momento de julgar, o magistrado deverá levar em consideração todas as dificuldades suportadas pelo empresariado brasileiro.

Lamentavelmente, a regra acima enunciada tem sido aplicada de maneira indiscriminada pelos diversos tribunais pátrios. Mesmo quando se mostra evidente que o não cumprimento da obrigação tributária decorre puramente da vontade do sócio gerente, têm os julgadores se recusado a admitir o redirecionamento da execução, tudo com amparo no supracitado enunciado sumular. O incidente cognitivo de responsabilização dos sócios tem sido simplesmente ignorado sob o argumento da dificuldade de provar a má-fé e o dolo na conduta do administrador.

4.2. Reiterado inadimplemento voluntário da obrigação tributária da empresa. Análise da expressão “por si só” do enunciado nº. 430 da súmula do Superior Tribunal de Justiça:

Fora dos estritos casos enunciados no tópico anterior, tem sido bastante raro encontrar julgados admitindo a responsabilidade do sócio gerente por atos praticados com abuso de poder ou mesmo violação legal. Na grande maioria das vezes, os julgadores têm trazido à tona toda sorte de empecilhos, como, por exemplo: a) a dificuldade de provar o abuso na conduta do gestor privado; b) o entendimento consolidado no enunciado n. 430 do Superior Tribunal de Justiça – STJ de que os sócios não respondem pelo mero inadimplemento de tributos. Em resumo, não se tem diferenciado o mero e esporádico inadimplemento tributário do reiterado e deliberado não pagamento de tributos.

Tal situação precisa ser encarada de outra forma. Os grandes e voluntários devedores devem ser tratados de maneira diferente dos pequenos. Não é justo nem tampouco razoável que apenas a empresa sofra constrições patrimoniais enquanto seus sócios administradores enriquecem às custas do prejuízo público. A verdade é que a todos tem sido conferida uma espécie de direito – quase inatingível – de não pagar tributos.

Diante do caso concreto, deve-se levar a efeito a prática do chamado distinguishing, ou seja, deve-se realizar a necessária diferenciação entre a situação concreta e aquela analisada pelo Superior Tribunal de Justiça quando da elaboração do precedente. Nas palavras de Fredie Didier Junior:

Apenas a título de exemplo, no Estado do Paraná, há empresas que chegam a passar 2 (dois) anos seguidos sem recolher o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação – ICMS. O mais impressionante disso é que não se tratam de pequenas sociedades em vias de extinção, mas sim alguns dos maiores conglomerados empresariais de toda a Região Sul do país. Nos moldes desse ardiloso planejamento tributário, é mais rentável deixar que o Estado realize a inscrição da dívida e posteriormente ajuíze ação judicial do que pagar o imposto no momento adequado.

Os maus administradores agem dessa maneira valendo-se, dentre outras motivos, da combalida estrutura do Poder Judiciário nacional e da facilidade encontrada para ocultar bens de quem quer que seja. De fato, incontáveis são as empresas que, mesmo possuindo faturamento anual da ordem de dezenas de milhões de reais, não têm um bem sequer a fim de garantir o crédito da Fazenda Pública. Não bastasse isso, os requerimentos de penhora on line dos montantes existentes nas contas bancárias das empresas devedoras têm-se mostrado quase sempre infrutíferos. Por maior que seja a sociedade, em regra, não se consegue localizar qualquer valor depositado.

Executivos fiscais aos montes são extintos em decorrência do advento da prescrição intercorrente. A situação agrava-se ainda mais depois do advento do arbitrário entendimento jurisprudencial de que a simples paralisação do processo por 6 (seis) anos, após diversas tentativas frustradas de localização de bens pela Fazenda Pública, acarreta a prescrição intercorrente do crédito tributário15.

Encoraja ainda as práticas narradas anteriormente a dificuldade de se conseguir a quebra do sigilo bancário das empresas devedoras e, sobretudo, de seus administradores. Como não estão no pólo passivo da relação processual, os magistrados não vêm admitindo a investigação mais detalhada das operações bancárias capitaneadas pelos maus gestores.
Mencione-se, por fim, os sucessivos programas governamentais de parcelamento de créditos tributário, em que, mediante o pagamento de uma única parcela, já é possível a obtenção de Certidões Negativas de Débitos junto à Fazenda. Muitas são as sociedades que preferem não pagar os impostos no momento certo esperando apenas o advento do benefício supracitado.

Mesmo diante desse quadro, tem-se indeferido os pleitos de redirecionamento da execução fiscal aos sócios, tudo sempre sob o argumento de que o inadimplemento da obrigação tributária não acarreta, por si só, a responsabilidade do sócio administrador. A posição omissa já consolidada na jurisprudência nacional traz péssimas conseqüências não só para o processo, mas também para toda a sociedade.

Em primeiro lugar, o reiterado e voluntário inadimplemento de tributos causa fortes desequilíbrios na concorrência. Por óbvio, uma empresa que não paga impostos terá melhor condição de se desenvolver e praticar preços mais baixos do que aquelas que seguem à risca o que determina a lei. Como consequência natural de tal conduta, após a eliminação das concorrentes, a sociedade sonegadora estará livre para elevar o preço de seus produtos.

Outra nefasta consequência do voluntário e reiterado não pagamento de tributos por parte das grandes empresas, levado a efeito via de regra por decisão seus sócios administradores, é o aumento do número de demandas judiciais no já abarrotado Poder Judiciário nacional. Centenas de milhares de execuções fiscais proliferam graças ao ilícito perpetrado pelos maus administradores. Com isso, resta prejudicada a qualidade dos serviços prestados àqueles que realmente necessitam da ajuda do Estado.
Em que pese isso tudo, o maior problema decorrente da prática ora versada é, sem dúvidas, a diminuição da arrecadação tributária.

Num país em que a desigualdade social alcança elevados patamares, como o Brasil, a distribuição de renda e a prestação dos serviços básicos à comunidade depende sobremaneira do valor arrecadado pelos entes federados junto aos contribuintes. Não se dá educação, saúde, segurança e outros direitos fundamentais básicos àqueles que precisam sem a necessária fonte dos recursos.

Em resumo, o lesivo planejamento tributário praticado por determinados sócios gerentes, baseado no voluntário e reiterado inadimplemento de tributos causa prejuízos à toda sociedade, sobretudo àqueles que mais necessitam dos serviços prestados pelo Estado.

Ora, se no caso de dissolução irregular da empresa se admite o redirecionamento ao sócio gerente por ter sido ele culpado pela impossibilidade de pagamento de tributos por parte do contribuinte, nada mais natural do que aplicar o mesmo entendimento no caso de voluntário e planejado inadimplemento de tributos. Aqui, a empresa não paga o que deve pura e simplesmente por culpa do sócio gestor. Tanto é assim que já há até mesmo alguns julgados admitindo o redirecionamento em caso de empresa inadimplente que distribui lucro entre seus sócios16

“Fala-se em distinguishing (ou distinguish) quando houver distinção entre o caso concreto (em julgamento) e o paradigma, seja porque não há coincidência entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles que serviram de base à ratio decidendi (tese jurídica) constante no precedente, seja porque, a despeito de existir uma aproximação entre eles, alguma peculiaridade no caso em julgamento afasta a aplicação do precedente. (…)
“Notando, pois, o magistrado que há distinção (distinguishing) entre o caso sub judice e aquele que ensejou o precedente, pode seguir um desses caminhos: (i) dar à ratio decidendi uma interpretação restritiva, por entender que peculiaridades do caso concreto impedem a aplicação da mesma tese jurídica outrora firmada (restrictive distinguishing), caso em que julgará o processo livremente, sem vinculação ao precedente; (ii) ou estender ao caso a mesma solução conferida aos casos anteriores, por entender que, a despeito das peculiaridades concretas, aquela tese jurídica lhe é aplicável (ampliative distinguishing).”14

4.3. A dificuldade do redirecionamento em caso de tributo declarado e não pago voluntariamente

Em momento anterior deste trabalho comentou-se acerca da dificuldade de inclusão do sócio administrador no pólo passivo da ação de execução fiscal. Conforme visto, só se tem admitido que o gestor seja, desde o início, réu no processo executivo quando seu nome constar também na Certidão de Dívida Ativa. Trata-se de concretização do princípio do contraditório. De fato, é bastante razoável que apenas àquele a quem fora dada chance de se defender na esfera administrativa possa ser imputada a responsabilidade pelo pagamento dos tributos devidos pela empresa.
O problema surge no caso dos tributos sujeitos ao chamado lançamento por homologação, em que, na maioria das vezes, o contribuinte declara os fatos jurídicos tributários e o Fisco apenas concorda com a declaração efetuada, não havendo necessidade de verdadeiro processo administrativo de lançamento. Aqui, não há como se aferir a prática de infração de lei, contrato social ou mesmo estatuto por parte do sócio gestor.

Sobre o tema, confira-se trecho do voto da Ministra Eliana Calmon, relatora do acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no Agravo Regimental em Recurso Especial n. 1.104.109, julgado em 03 de setembro de 2009:

“Nesse sentido, correta a jurisprudência quando entende prescindível a formação do processo administrativo se a Administração concorda com a declaração do contribuinte ou responsável porque a declaração expressa sua responsabilidade e a ocorrência do fato gerador. Porém, nessa declaração não há elementos que configurem a responsabilidade tributária de terceiro, principalmente por ato ilícito, ou contrário ao estatuto ou contrato social […]

“Do mesmo modo, a declaração do contribuinte em que reconhece seu débito tributário não vincula senão ele próprio ao Fisco. Para que o terceiro tenha sua eventual obrigação de responder pelo tributo formalizada, faz-se indispensável a verificação também do pressuposto específico de tal obrigação, a indicação do seu objeto próprio (nem sempre coincidente com o da obrigação do contribuinte) e a identificação do seu particular sujeito passivo[…]

“Note-se que quem não foi notificado para o procedimento do lançamento não poderá juridicamente figurar no Termo de Inscrição em Dívida Ativa, que decorre daquele procedimento, e nem na CDA, que reproduz os dados desse mesmo termo”.(STJ, AgRg no REsp 1.104.109/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2009, Dje 21/09/2009)

Não se quer aqui contradizer ou mesmo desmerecer o posicionamento exarado no julgado supra, pelo contrário, reconhece-se tratar de clara manifestação de lógica jurídica e valorização dos princípios que regem o ordenamento jurídico nacional. O que não pode ser admitido é que sócios gestores imbuídos de má-fé utilizem-se de tal entendimento com o fim único e exclusivo de lesar o Fisco.

Se é verdade que o nome do sócio não intimado em processo administrativo disciplinar não pode constar da Certidão de Dívida Ativa, é certo também que, após o ajuizamento da execução fiscal aparelhada com quantidade significativa de certidões de dívida decorrentes de tributos declarados e não pagos, deverá o magistrado reconhecer válido o incidente cognitivo de redirecionamento da execução ao gestor. Aqui, deve ser aberto prazo ao responsável tributário para que se manifeste e explique o real motivo dos reiterados inadimplementos.

É importante que a petição da Fazenda Pública traga elementos que demonstrem de maneira clara e inequívoca que o inadimplemento reiterado por parte da empresa decorre pura e simplesmente da vontade de seus administradores. Nas palavras de Leonardo Carneiro da Cunha:
“Estando o nome do sócio-gerente ou do diretor da empresa na Certidão de Dívida Ativa, a execução fiscal pode ser, desde logo, contra ele redirecionada, cabendo-lhe argüir a impossibilidade de redirecionamento em embargos do devedor ou em exceção de pré-executividade. Não estando, porém, seu nome na CDA, o redirecionamento somente será possível, se for, previamente, comprovado que o tributo não foi recolhido por dolo seu, em razão de fraude ou de exceção (sic) de poderes, com infringência da lei ou do estatuto social. (…)

“A responsabilidade do administrador, diretor ou sócio-gerente é, enfim, subjetiva, devendo ser comprovada a atitude dolosa, fraudulenta, culposa, irregular. Cumpre ao menos, ser imputada ao sócio-gerente uma conduta que denote sua responsabilidade subjetiva.”17

Isso pode ser feito mediante demonstrativo do número de novas filiais abertas no período referente ao não pagamento de tributos ou mesmo mediante análise da evolução do faturamento empresarial no período correspondente à prática ilícita. Deve ainda a Fazenda Pública, a quem incumbe o ônus da prova, demonstrar a relevância do sócio para o capital social da empresa (seu percentual de participação), a existência de distribuição de lucros entre os dirigentes das empresas inadimplentes ou mesmo o possível desequilíbrio de concorrência causado pelo reiterado e voluntário não cumprimento da obrigação tributária.

Tem-se sempre que conferir ao incidente cognitivo de redirecionamento da execução ao sócio gestor a importância que ele merece. Não importa o momento em que a prática ilícita foi verificada, mas sim o momento em que foi praticada. Assim, nada obsta que inclua o sócio administrador malicioso no polo passivo da execução fiscal.

5. CONCLUSÃO

Diante de tudo que se viu, conclui-se que:

1. Os sócios administradores não responderão pessoalmente pelos tributos devidos pelas empresas, salvo comprovação de atuação dolosa caracterizadora de infração à lei, contrato social ou estatuto, ou mesmo quando da prática de crime contra a ordem tributária, tudo nos moldes do Código Tributário Nacional, mais precisamente artigos 135 e 137.

2. Em que pese a existência de correntes contrárias, a responsabilidade do sócio gerente, nesses casos, deverá ser solidária à da empresa. A expressão responsabilidade pessoal não é sinônima de responsabilidade exclusiva ou mesmo subsidiária. Nada há na lei que permita concluir pela exclusão do dever da sociedade empresária de pagar aquilo que deve em virtude da concretização da hipótese de incidência tributária. O fato de os sócios usarem a pessoa jurídica como escudo para a prática de condutas ilícitas não pode e nem deve retirar do fisco o direito de buscar a satisfação de seu crédito também no patrimônio da empresa.

3. Poucos são os casos concretos nos quais a jurisprudência nacional vem admitindo a responsabilização do sócio gerente por dívidas da empresa – embora diversas sejam as hipóteses abstratas previstas em lei. Dentre as poucas situações de responsabilidade do sócio por infração à lei amplamente aceitas nos Tribunais pátrios destaca-se a de fechamento irregular da empresa. Argumenta-se aqui afronta às disposições do Código Civil de 2002 atinentes à dissolução e liquidação da pessoa jurídica.

4. A situação narrada acima torna-se ainda mais difícil na esfera processual, mais precisamente no curso do processo de execução fiscal. O entendimento dominante tem sido o de que o sócio gerente só responderá pela obrigação tributária inadimplida pela empresa quando seu nome constar na Certidão de Dívida Ativa Tributária. Fora disso, tem sido praticamente ignorado qualquer tipo de incidente processual cognitivo de verificação de prática violadora de lei contrato social ou estatuto por parte do administrador.

5. Com base no exposto no parágrafo anterior, e na presunção de boa-fé que deve nortear as relações negociais e a conduta dos administradores, o Superior Tribunal de Justiça, por meio de seu enunciado de súmula n. 430, pacificou o entendimento de que o mero inadimplemento de tributo não é suficiente para o deslocamento da obrigação tributária aos sócios. Levou-se em conta, de maneira sábia e bastante prudente, a existência de fatores externos outros que podem constituir óbices ao pagamento regular dos tributos, como a complexa estrutura burocrática e a elevada carga tributária do país.

6. Em seguida à publicação do enunciado supra, os magistrados passaram a reduzir ainda mais a importância do incidente cognitivo processual de reconhecimento da responsabilidade dos sócios. A expressão “por si só”, contida no verbete n. 430 do STJ não tem sido corretamente apreciada pelos Tribunais brasileiros.

7. Diversos são os casos de reiterado e voluntário inadimplemento de tributos decididos com base no verbete sumular em epígrafe. Os maus administradores agem dessa maneira valendo-se, dentre outras motivos, da combalida estrutura do Poder Judiciário nacional e da facilidade encontrada para ocultar bens de quem quer que seja. Executivos fiscais aos montes são extintos em decorrência do advento da prescrição intercorrente. Encoraja ainda as práticas narradas anteriormente a dificuldade de se conseguir a quebra do sigilo bancário das empresas devedoras e, sobretudo, de seus administradores.

8. Dentre as piores consequências do reiterado e voluntário inadimplemento de tributos, destaca-se: a) os fortes desequilíbrios na concorrência causados por tal prática; b) o aumento do número de demandas judiciais, mais especificamente de execuções fiscais ajuizadas em face das empresas inadimplentes; c) diminuição da arrecadação tributária e, consequentemente, da qualidade dos serviços prestados pelo Poder Público àqueles que realmente precisam.

9. Em resumo, o casual, esporádico e involuntário inadimplemento tributário não pode, de maneira alguma, ser tratado da mesma forma que o voluntário e reiterado inadimplemento. Tem-se, nesse último caso, planejamento tributário claramente ilegal e altamente lesivo à Fazenda Pública e, em última instância, à sociedade. Aqui, os sócios administradores infratores da lei devem ser chamados ao processo executivo fiscal e responder, ao lado da empresa, pelos valores devidos.

Notas
1 Enunciado n. 430 da súmula do Superior Tribunal de Justiça.
2 Art. 9º O registro dos atos constitutivos, de suas alterações e extinções (baixas), referentes a empresários e pessoas jurídicas em qualquer órgão envolvido no registro empresarial e na abertura da empresa, dos 3 (três) âmbitos de governo, ocorrerá independentemente da regularidade de obrigações tributárias, previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos administradores ou de empresas de que participem, sem prejuízo das responsabilidades do empresário, dos sócios ou dos administradores por tais obrigações, apuradas antes ou após o ato de extinção.

3 Nesse sentido: STJ, AgRg no Ag 1359231/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/0202011, Dje 28/04/2011; STJ, REsp 1216098/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/05/2011, Dje 31/05/2011; AgRg no REsp 1122807/PR, Rel. MINISTRO HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/04/2010, Dje 23/04/2010.

4 Nesse sentido: STJ, REsp 1104064/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/12/2010, DJe 14/12/2010.

5 COSTA, Regina Helena, Curso de Direito Tributário, São Paulo: Saraiva, 2009, p. 205.

6 CANAZARO, Fábio. A Responsabilidade Tributária dos Sócios e Dirigentes em Relação ao passivo tributário da Sociedade Cooperativa. RDDT n. 145. Outubro de 2007. p. 23.

7 MACHADO, Hugo de Brito, Curso de Direito Tributário, 30ª ed., São Paulo: Malheiros, 2009. p. 161.

8 Enunciado n. 435 da súmula do Superior Tribunal de Justiça: Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio gerente.

9 PAULSEN, Leandro, ÁVILA, René Bergmann e SLIWKA, Ingrid Schroder, Direito processual tributário (processo administrativo fiscal e execução fiscal à luz da doutrina e da jurisprudência), 7ª ed. São Paulo: Livraria do advogado, 2012. p. 285.

10 Nesse sentido: STJ, REsp. 153.441/RS, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/10/2001, DJe 04/02/2002.

11 TRF4, AG 0000584-98.2012.404.0000, Relator OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA, SEGUNDA TURMA, DJ. 05/03/2012.

12 MARINS, Jaime, Direito Processual Tributário (administrativo e judicial). São Paulo: Dialética, 2001. PP. 535-6.

13 Nesse sentido: STJ, AgRg no REsp 1.104.109/RJ, Rel. ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2009, DJe 21/09/2009 );
14 DIDIER JR., Fredie, BRAGA, Paulo Sarno e OLIVEIRA, Rafael, Curso de Direito Processual Civil- Volume 2, 6ª Ed., Salvador: Jus Podivm, 2011, PP. 402-3.

15 Nesse sentido: TJPR – 3ª C.Cível – AC 0712510-6 – União da Vitória – Rel.: Des. Paulo Roberto Vasconcelos Unânime – J. 07.12.2010; TJPR – 1ª C.Cível – A 889289-7/01 – Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba – Rel.: Fabio Andre Santos Muniz – Unânime – J. 15.05.2012; TJPR – 1ª C.Cível – A 863985-4/01 – Ponta Grossa – Rel.: Fabio Andre Santos Muniz – Unânime – J. 08.05.2012

16 Nesse sentido: STJ, REsp 529.464/PR, Relator Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/09/2003, Dje 13/10/2003.

17 CUNHA, Leonardo Carneiro da., A Fazenda Pública em Juízo, 9ª Ed., São Paulo, Dialética, 2011, PP. 390-1.

Eduardo M.L. Rodrigues de Castro

Procurador do Estado do Paraná Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará - UFC Especialista em Direito e Processo Administrativo pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR Mestrando em Direito do Estado (Direito Tributário) pela Universidade Federal do Paraná - UFPR

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