Implicações penais da reforma tributária

Filipe Magliarelli e Henrique de Palma

Após 30 anos de debates, em dezembro de 2023, foi promulgada a Emenda Constitucional nº 132/2023, que instituiu a reforma do sistema tributário brasileiro. O texto buscou simplificar a cobrança de tributos, por meio da unificação de ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins em uma cobrança única, dividida entre os níveis federal e estadual/municipal. Uma das razões centrais para se fazer uma reforma tributária seria incentivar o crescimento econômico, dar mais transparência e acabar com a guerra fiscal que existia entre os Estados da federação.

De fato, a multiplicidade de tributos e das regras de cobrança costumam ser fontes inesgotáveis de desentendimentos interpretativos entre Fisco e contribuintes, com reflexo não apenas em discussões judiciais que atravancam os tribunais, mas, também, na esfera penal, com informações sendo compartilhadas pelo Fisco com Ministério Público sem um critério aparentemente definido. Ao contrário, tem-se a impressão de que a esfera penal é acionada como regra, sem uma desejável seleção dos casos que demonstram ter efetivo indício de crime.

É importante frisar que a responsabilização penal por sonegação fiscal guarda uma relação de causa e efeito com a esfera administrativa-fiscal. No entendimento do Supremo Tribunal Federal, que é vinculante a todos os tribunais pátrios, não se pode falar na existência de crime tributário (artigo 1º da Lei nº 8.137/90) sem que o tributo esteja definitivamente constituído na esfera administrativa (Súmula Vinculante nº 24). Por outro lado, o pagamento do tributo gera, a qualquer tempo, a extinção da punibilidade. Na prática, faz o crime tributário “desaparecer” em qualquer fase da investigação ou do processo, mesmo depois de condenação definitiva, uma brasilidade que nos orgulha tal como brigadeiro e jabuticaba.

O fato é que, diante de uma relação umbilical entre as esferas administrativa e penal, não tardou para que a esfera criminal servisse como instrumento de pressão para que os contribuintes honrassem suas obrigações fiscais. Essa tendência pode ser observada em vários precedentes que denotam um aparente ativismo dos tribunais brasileiros ao recrudescerem a penalização de acusados de sonegação fiscal, portando-se, ainda que de maneira indireta e não textual, como agentes auxiliares na arrecadação tributária.

A título de exemplo, podemos citar a possibilidade de a Receita Federal compartilhar dados sigilosos dos contribuintes com o Ministério Público sem autorização judicial, além das investigações criminais que foram presididas pela Receita Federal para apurar crimes que, pasme-se, não guardavam qualquer relação com a finalidade fiscal de suas atribuições. A respeito da iniciativa da Receita Federal além de suas atribuições, veio em boa hora recente decisão que anulou as provas produzidas nessas circunstâncias.

Em outra oportunidade, entendeu-se que um dos sócios administradores de uma pessoa jurídica pode ser responsabilizado criminalmente por omissão pela conduta isolada do outro sócio administrador. Isso porque, no teor do precedente mencionado, presumiu-se que a falta de recolhimento do tributo não poderia ter ocorrido sem a ciência e o consentimento de ambos os sócios. Considerando que a responsabilidade penal deve ser comprovada – e não presumida -, tal entendimento deixa dúvidas sobre sua constitucionalidade.

No mesmo compasso, uma vez que o crime de sonegação fiscal apenas se perfaz com o lançamento definitivo do débito tributário, firmou-se o entendimento de que a prescrição só começa a fluir a partir desse evento. Entretanto, já se afirmou haver responsabilidade penal do gestor que tenha agido na época do fato gerador, mesmo que não esteja mais nos quadros da pessoa jurídica quando do lançamento do crédito tributário. Ou seja, considera-se a data do fato gerador para demarcar a responsabilidade do gestor, mas a contagem da prescrição só teria início quando, anos depois, o débito tributário é confirmado, muitas vezes, quando o administrador da época do fato gerador há muito não integra mais os quadros da empresa. Uma aparente incoerência que não passa despercebida.

Nesse cenário, soou como alento a introdução do acordo de não persecução penal – ANPP (artigo 28-A do Código de Processo Penal) pelo pacote anticrime (Lei nº 13.964/22). O ANPP é oferecido aos acusados de crimes cuja pena mínima não exceda quatro anos e exige, entre outros requisitos, a admissão de culpa e o ressarcimento dos danos. Porém, o alento que refletiu inicialmente, no que se refere aos crimes tributários, mostrou-se ser uma simples miragem. Não tardou para membros do Ministério Público condicionarem o acordo à quitação integral do débito tributário, o que é inviável em muitos casos.

Enfim, ainda haverá o período de dez anos para que a reforma tributária seja posta em prática, por isso seria prematuro qualquer prognóstico sobre os eventuais efeitos da reforma na esfera penal. Contudo, partindo do pressuposto de que nenhuma reforma tributária é proposta sem o objetivo de otimizar a arrecadação de tributos (e já se especula eventual aumento da carga tributária), o questionamento que já se mostra oportuno é como Fisco, Ministério Público, Polícias e o Judiciário serão impactados pelas novas regras e como se portarão no exercício da persecução penal no contexto dos crimes tributários.

Só o tempo dirá, portanto, se a reforma tributária, amplamente divulgada como um grande propulsor de novos negócios, poderá servir-se como um cavalo de troia para a responsabilidade penal de empresários e gestores de empresas.

Filipe Magliarelli e Henrique de Palma

são, respectivamente, sócio da área Compliance, Penal Econômico e Investigações do escritório Cescon Barrieu; e sócio da área de Direito Tributário do Cescon Barrieu

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