Guerra dos portos: Afinal, foi ou não prorrogada a obrigatoriedade das empresas enviarem a informação em campo próprio da nota fiscal sobre o valor da importação e outros dados para atender a Resolução nº 13 do Senado?
Ricardo Piza Di Giovanni
Conforme é cediço, o Ajuste SINIEF nº 19 criou a obrigação aos contribuintes, importadores e industrializadores de enviar a Ficha de Conteúdo de Importação – FCI (cláusula 5ª); bem como de enviarem a informação em campo próprio da Nota Fiscal Eletrônica – NF-e: (a) do valor da parcela importada do exterior; (b) do número da FCI; (c) do Conteúdo de Importação expresso em percentual; e (d) do valor da importação (cláusula 7ª).
Na sequência, em 21 de dezembro o Ajuste SINIEF nº 27 adiou para o dia 1º de maio de 2013 o início da obrigatoriedade de preenchimento e entrega da Ficha de Conteúdo de Importação (FCI), bem como da indicação do número da respectiva FCI na Nota Fiscal Eletrônica. Senão veja os termos da cláusula 1ª:
Cláusula primeira Fica adiado para o dia 1º de maio de 2013 o início da obrigatoriedade de preenchimento e entrega da Ficha de Conteúdo de Importação (FCI), prevista nas cláusulas quinta e sexta do Ajuste SINIEF nº 19, de 7 de novembro de 2012.
Parágrafo único. Fica dispensada também, até a data referida no caput, a indicação do número da FCI na nota fiscal eletrônica (NFe) emitida para acobertar as operações a que se refere o mencionado Ajuste.
Portanto, a cláusula primeira é bem clara sobre a prorrogação da obrigatoriedade de preenchimento e entrega de FCI.
Todavia, existem dúvidas sobre a prorrogação ou não das demais obrigações acessórias, principalmente a referente a obrigatoriedade de enviar a informação em campo próprio da Nota Fiscal Eletrônica – NF-e: (a) do valor da parcela importada do exterior; (b) do número da FCI; (c) do Conteúdo de Importação expresso em percentual; e (d) do valor da importação. Alguns intérpretes defendem que a obrigação de informar os custos de importação na Nota Fiscal já se encontra em vigor desde 1º de janeiro de 2013, e que tal obrigação não foi adiada pelo Ajuste SINIEFnº 27, o que estaria incentivando algumas empresas a buscarem, imediatamente, junto ao Poder Judiciário, uma decisão que afaste sua obrigatoriedade quanto às exigências contidas nos incisos I e II da cláusula 7ª do Ajuste SINIEFnº 19, a fim de que se evite a abertura dos custos de importação. Não concordamos com referido posicionamento.
Uma vez que o Ajuste SINIEFnº 27 menciona expressamente que a verificação do cumprimento das obrigações acessórias terá caráter exclusivamente orientador, isso significaria, consequentemente, sob o nosso que o dever de informar na nota fiscal também estaria prorrogado ou no mínimo facultado. Senão vejamos:
Cláusula segunda Acordam os Estados e o Distrito Federal que a verificação do cumprimento das obrigações acessórias instituídas no âmbito do Ajuste SINIEF 19/12 terá, até o dia 1º de maio de 2013, caráter exclusivamente orientador, salvo nos casos de dolo, fraude ou simulação devidamente comprovados pelo Fisco.
Assim, apesar da legislação, mais uma vez, causar insegurança jurídica em razão da falta de clareza em sua redação, entendemos que também a obrigação de informar na nota fiscal estaria prorrogada, ou melhor, não seria obrigatória. Aliás, somente não estaria prorrogada a obrigação principal, qual seja, o pagamento de tributo na alíquota de 4%.
Isto porque a cláusula segunda acima transcrita menciona que a verificação do cumprimento das obrigações acessórias terá até o dia 1º de maio caráter exclusivamente orientador. Ou seja, os Estados acordaram que não irão autuar as empresas por motivo de descumprimento de obrigação acessória. Logo, se as obrigações acessórias não serão alvo de autuação, não se pode dizer que não foram prorrogadas. Entender diferente disso seria contrariar conceito de obrigação acessória e de obrigação principal.
Ora, segundo o artigo 113 do Código Tributário Nacional:
"A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente" . Por sua vez, de acordo com o §2º do mesmo artigo 113, "A obrigação acessória decorre de legislação tributária e tem por objeto prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos".
Isso significa que o Código Tributário Nacional define que as obrigações acessórias seriam aquelas que não tem conteúdo pecuniário e que se traduzem em obrigações de fazer ou não fazer no interesse da fiscalização ou de arrecadação de tributos. Objetivam dar meios à fiscalização para que o recolhimento do tributo seja investigado.
Portanto, a grosso modo, tudo o que não for obrigação de pagar tributo (no caso, na alíquota de 4%) estaria configurado como obrigação acessória, e, consequentemente, estaria prorrogado indiretamente por meio da cláusula 2º o Ajuste SINIEFnº 27 na medida em que este dispõe expressamente que a verificação do cumprimento das obrigações acessórias instituídas no âmbito do Ajuste SINIEFnº 19/12 terá, até o dia 1º de maio de 2013, caráter exclusivamente orientador.
Ademais, qual seria o motivo do AJUSTE SINIEFnº 27 ser publicado? Somente viabilizar mais tempo para montar-se a estrutura de envio de FCI? Se fosse somente isto porque referido ajuste não mencionou tão somente a questão de estar prorrogado o envio de FCI? Por qual motivo teria mencionado também "obrigação acessória"? O que estaria incluso no termo "obrigação acessória"? Entendemos que não seria somente FCI porque, se assim fosse, a norma não teria mencionado obrigação acessória.
De fato, espera-se que até maio de 2013 muitos pontos sejam alterados pela legislação. Admitimos que as empresas possam por cautela optarem em cumprirem desde janeiro de 2013 a determinação de enviar a informação em campo próprio da Nota Fiscal Eletrônica – NF-e: (a) do valor da parcela importada do exterior; (b) do número da FCI; (c) do Conteúdo de Importação expresso em percentual; e (d) do valor da importação. Todavia, essa cautela pode significar gastos desnecessários para as empresas seja no aspecto de custos para alteração do sistema ERP; seja no aspecto de revelação de segredo comercial; seja no aspecto de interposição de medida judicial para afastar essa exigência e, principalmente, seja no aspecto de ter de fazer todas essas operações dentro de um cenário de grande expectativa de mudanças.
Por outro lado, as empresas podem optar em reconhecerem que a cláusula segunda do Ajuste SINIEFnº 27/2012 prorrogou também a obrigatoriedade de informar os dados da importação na medida em que esta obrigatoriedade estaria dentro do conceito de obrigação acessória e, consequentemente, com exigência pela fiscalização tão somente por caráter exclusivamente orientador.
De fato, por questões práticas e conhecidas, serão poucos fornecedores que conseguirão, já a partir de janeiro de 2013, informar na nota fiscal o conteúdo de importação de seus produtos. Se esta informação não virá de seus fornecedores, como uma determinada empresa fará o cálculo do seu próprio Conteúdo de Importação? Para esta pergunta sugerimos a consulta ao artigo "Como calcular o conteúdo de importação na ausência de informações do fornecedor? – Como tratar dessa e de outras lacunas das normas da Resolução nº 13 do Senado? Publicado neste mesmo site.
Ricardo Piza Di Giovanni
Advogado Especialista em Tributário.