A Lei 12.249/10 e o Direito Constitucional de Petição
Guilherme Lopes de Oliveira
Com a promulgação da Lei 12.249, de 11 de junho de 2010, foram alterados, além de outros diversos dispositivos, os parágrafos 15, 16 e 17 do art. 74 da Lei 9.430/96, modificando principalmente, no que concerne às penalidades decorrente dos pedidos de restituição, ressarcimento e compensação, feitos pelo contribuinte ao Fisco Federal.
Mesmo anteriormente aos novos dispositivos, era facultado ao contribuinte proceder com pedidos de restituição ou ressarcimento e aguardar a manifestação da autoridade fazendária, que no prazo de 5 (cinco) anos poderia ou não homologá-los. È permitido ao contribuinte ainda, por sua conta e risco, apresentar pedido de compensação dos créditos objetos de pedidos de restituição ou ressarcimento.
Na ocorrência de indeferimento de pedidos de restituição ou ressarcimento, o contribuinte poderia apresentar defesa e discutir seu crédito até última instância administrativa, ou também pela via judicial, e mesmo tendo decisão contrária definitiva, não seria incorrido em nenhum tipo de penalidade, somente devendo recolher o montante não pago, com as devidas atualizações.
No caso específico, em que o contribuinte tivesse realizado a compensação dos valores decorrente de pedidos de restituição ou ressarcimento ainda não homologados e viesse a ser indeferido, havia previsão de multa de mora no percentual de 20% (vinte por cento) dos valores compensados, ou em casos de compensação feita mediante falsidade, aplicava-se a multa isolada de 75% (setenta e cinco por cento).
Contudo, com os novos dispositivos, passou-se a prever, respectivamente nos parágrafos 15, 16 e 17, da citada Lei 9.430/96: I) multa isolada de 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor do crédito objeto de pedido de ressarcimento indeferido ou indevido; II) multa isolada de 100% (cem por cento) na hipótese de ressarcimento obtido com falsidade no pedido apresentado pelo sujeito passivo; e também III) multa de 50% (cinqüenta por cento) também, sobre o valor do crédito objeto de declaração de compensação não homologada, ressalvado o caso de falsidade da declaração apresentada.
Seguindo esta mesma linha, A Receita Federal do Brasil, editou a em 24 de agosto de 2010, a Instrução Normativa RFB 1.067, prevendo também, a penalidade de 50% (cinqüenta por cento) sobre o valor do crédito objeto de declaração de compensação não-homologada, além de multa isolada de 50% (cinqüenta por cento) e 100% (cem por cento) sobre o valor do crédito objeto de pedido de ressarcimento indeferido ou indevido, este último quando for obtido com falsidade no pedido apresentado pelo sujeito passivo.
O que se extrai destes dispositivos, a primeiro momento, é que nos dois primeiros casos (§§ 15 e 16), a lei se refere tão somente a ressarcimento, que tenha sido indeferido ou indevido, com multa de 50% (cinqüenta por cento), pelo simples indeferimento e 100% (cem por cento) quando indeferido, no caso de implementado mediante falsidade. E no terceiro caso (§17), especificamente quando é feita a compensação e esta não é homologada, estaria se aumentando a multa de 20% (vinte por cento) para 50% (cinqüenta por cento), uma vez que a única previsão de penalidade até então era aquela aplicação, ou ainda, haveria uma margem de interpretação de que as penalidades poderiam ser somadas, chegando a 70% (setenta por cento).
Nos dois últimos casos (§§ 16 e 17), percebe-se que os pedidos realizados e que sejam indeferidos, de fato trarão ao fisco algum tipo de prejuízo. No caso do § 16, pela expressão “ressarcimento obtido”, e no § 17, que trata de compensação, também, pois tal instituto trás em sua sistemática o imediato aproveitamento do crédito. E esse possível prejuízo aos cofres públicos, acaba por trazer sentido e fundamento ao aumento das multas aplicadas, até mesmo como forma de evitar abusos por parte dos contribuinte.
Já no caso da multa aplicada ao simples ressarcimento (§ 15), não há nenhum tipo de prejuízo ao Fisco, e o que se nota, é que provavelmente tentou o legislador e também a autoridade fazendária, na edição da citada IN 1.067, impedir que empresas utilizassem indevidamente a devolução de 50% (cinqüenta por cento) de créditos tributários acumulados em até 30 dias, uma das principais medida do pacote de incentivo às exportações anunciado pelo governo em junho do ano corrente.
Contudo, a aplicação de multa ao indeferimento de simples pedido de ressarcimento, releva flagrante ruptura ao direito de petição, previsto no art. 5º, XXXIV, da Constituição Federal. Além de violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, da razoabilidade e da proporcionalidade, também previstos constitucionalmente.
O direito de petição que visa garantir a qualquer cidadão posicionar-se em defesa de seu direito, contra ilegalidades ou abuso de poder, deve ser exercido em sua plenitude. A aplicação de penalidade pelo indeferimento de simples pedido de ressarcimento, na prática, terá o condão de inibir a iniciativa dos contribuintes no sentido da recuperação dos tributos recolhidos indevidamente. E não pode norma infraconstitucional vir a coibir e criar limitações a o exercício de um direito constitucional, quando a própria Constituição não o fez.
Dentro de um pedido de ressarcimento, diversas questões jurídicas podem ser levantadas, e o Direito, como ciência humana, sempre será passível de diferentes entendimentos. Assim, todo o contribuinte tem o direito de discutir um crédito que no seu entendimento esteja correto, e não pode ser penalizado se caso não estiver, ainda mais com a vultuosa porcentagem de 50% (cinqüenta por cento).
Guilherme Lopes de Oliveira
Advogado em São Paulo. Especialista e Pós-Graduando em Direito Tributário pelo Centro de Extensão Universitária.