Será ruim para todos
Tiago Lunardi Alves
Em meio à grave crise política e econômica nacional com sérias consequências para o mercado imobiliário, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem pela frente um julgamento importante que pode mudar a maneira como os imóveis são vendidos no Brasil, e ainda gerar um passivo bilionário para o setor de construção.
Trata-se da legalidade da estipulação em contrato da responsabilidade do consumidor pelo pagamento da comissão da corretagem quando ele compra o imóvel na planta e diretamente da incorporadora em um estande de vendas. O tema tem gerado uma enxurrada de ações de consumidores contra incorporadores em todo país. Dentre essas, três recursos especiais envolvendo Cyrela, Gafisa e PDG chegaram à Terceira Turma da Segunda Seção do STJ, e ficaram sob a relatoria do Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, que nos autos determinou a suspensão dos processos que tenham por objeto tal matéria.
Para os defensores dos consumidores, quando o imóvel na planta é adquirido no estande de vendas, não há a caracterização de um serviço de corretagem conforme determina o Código Civil, cujo texto estipula que a atividade consiste em uma pessoa não vinculada a outra, contratada para aproximar comprador e vendedor, resultando um negócio dessa relação. No entendimento dos consumidores, não existe a aproximação entre as partes referida na lei, e sim uma venda casada e condição para a assinatura do contrato de compra do imóvel, o que é vedado pelo código de proteção e defesa do consumidor.
Já para as incorporadoras, a presença física do corretor de imóveis no estande de vendas não descaracteriza o serviço de corretagem nem altera a pactuação das partes contratantes no tocante à comissão de corretagem. Ainda que o corretor se utilize das instalações do plantão e receba informações e instruções sobre o produto diretamente da construtora, tal fato não é suficiente para descaracterizar a intermediação imobiliária, pois é justamente a partir dessas informações recebidas pelo corretor que os adquirentes iniciam o processo de “conhecimento do produto”.
O julgamento ainda não tem data marcada, mas a expectativa é que seja ocorra no primeiro semestre de 2016. O STJ vai analisar a validade da cláusula que transfere ao consumidor a obrigação de pagar a comissão de corretagem e o prazo de prescrição para o consumidor pedir eventual restituição. Se condenadas, as empresas podem ser obrigadas a devolver valor pago por consumidores por vendas nos últimos três a cinco anos, com potencial concreto de gerar uma conta bilionária a ser cobrada das empresas de construção, motivando processos por vendas ocorridas vários anos atrás.
Diante das condições atuais do mercado imobiliário, as incorporadoras não têm condições de absorver esse custo que certamente será repassado para o preço do imóvel e, ao fim e ao cabo, o consumidor acabará pagando a comissão. Mesmo com a inclusão da comissão no preço das unidades, a decisão do STJ trará efeitos nefastos às incorporadoras, pois acabarão pagando tributos sobre a comissão que não compõe sua receita de venda e sim custo, trazendo um ônus fiscal indevido.
Enfim, ruim para todos, menos para o governo.
Tiago Lunardi Alves
Sócio do escritório de advocacia Dupont Spiller
Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais (PUCRS)
LL.M Direito Corporativo (IBMEC – 2012)
Integrante permanente do grupo de estudos jurídicos do Sindicato das Indústrias da Construção Civil no Estado do Rio Grande do Sul (Sinduscon/RS), com atuação intensa no setor imobiliário. Presta assessoria para desenvolvimento de modelos de negócios (Consórcios, SPEs, SCPs), visando a implementação de empreendimentos ou investimentos no setor imobiliário. Desempenha trabalho preventivo e consultivo participando das decisões estratégicas junto aos clientes.