Medida Provisória 685/2015 – o Programa de redução de litígios tributários e a obrigação de informar os planejamentos tributários
Milene Regina Amoriello Spolador Ribeiros
A MP 685/2015 instituiu o Programa de Redução de Litígios Tributários, a obrigação de informar planejamentos tributários à Receita Federal do Brasil e autorizou órgãos públicos a corrigirem monetariamente algumas taxas.
Com relação ao Programa de Redução de Litígios Tributários, em suma, concedeu-se autorização para que sujeito passivo com débitos vencidos até 30 de junho de 2015, e em discussão administrativa ou judicial, possa quitar o correspondente a, no máximo, 57% dos débitos utilizando prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL, existindo, ainda, a seguinte autorização para a utilização destes prejuízos fiscais e base negativa:
Art. 1º: (…)
§ 2º Os créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL poderão ser utilizados, nos termos do caput, entre pessoas jurídicas controladora e controlada, de forma direta ou indireta, ou entre pessoas jurídicas que sejam controladas direta ou indiretamente por uma mesma empresa, em 31 de dezembro de 2014, domiciliadas no Brasil, desde que se mantenham nesta condição até a data da opção pela quitação.
§ 3º Poderão ainda ser utilizados pela pessoa jurídica a que se refere o § 1º os créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL do responsável tributário ou corresponsável pelo crédito tributário em contencioso administrativo ou judicial.
§ 4º Para os fins do disposto no § 2º, inclui-se também como controlada a sociedade na qual a participação da controladora seja igual ou inferior a cinquenta por cento, desde que existente acordo de acionistas que assegure de modo permanente à sociedade controladora a preponderância individual ou comum nas deliberações sociais, assim como o poder individual ou comum de eleger a maioria dos administradores.
§ 5º Os créditos das pessoas jurídicas de que tratam os §§ 2º e 3º somente poderão ser utilizados após a utilização total dos créditos próprios.
Ou seja, utilizada a totalidade dos créditos próprios, a empresa devedora poderá utilizar, ainda, os créditos de pessoa jurídica controlada e controladora (entendendo ser também controlada a sociedade na qual a participação da controladora seja igual ou inferior a 50%), créditos do responsável tributário que figure como sujeito passivo solidário no processo administrativo ou judicial.
Para adentrar em tal programa, o sujeito passivo deve desistir dos recursos administrativos ou judiciais e apresentar requerimento até o dia 30 de setembro, requerimento este que importa confissão da dívida indicada, e pagar, em espécie, o equivalente a no mínimo 43% do valor consolidado do débito indicado para quitação até o último dia útil do mês em que o requerimento foi apresentado.
Com relação à declaração dos planejamentos tributários, a citada MP prevê o seguinte:
Deverão ser declaradas à Receita Federal do Brasil, até o dia 30 de setembro de cada ano, todas as operações realizadas no ano-calendário anterior e que envolva atos ou negócios jurídicos que acarretem supressão, redução ou diferimento de tributo, desde que os atos praticados (art. 7º):
1º – não possuam razões extratributárias relevantes: aqui se pode entender se tratar de operações que não possuam propósito negocial, porém, não está claro qual o parâmetro que será utilizado para a Receita Federal do Brasil para determinar que determinada operação não possui razões extratributárias relevantes, ou seja, é uma previsão bastante subjetiva.
2º – utilize forma não usual, ou se utilize de negócio jurídico indireto ou que contiver cláusula que desnature os efeitos de um contrato típico, ainda que parcialmente: aqui pode se dizer que se trata basicamente das “variações” da simulação, sendo que as três figuras citadas podem ser resumidas em apenas uma, o negócio jurídico indireto.
Isso porque o negócio jurídico indireto ocorre quando se usa uma forma não usual para se atingir um determinado objetivo, por exemplo, ao invés de fazer uma doação de um imóvel, para não recolher o ITCMD, as partes firmam um contrato de comodato vitalício – o objetivo foi atingido, embora se tenha utilizado de uma forma que não seria a usual. É importante salientar que o negócio jurídico indireto se utiliza de formas que não são proibidas por lei.
De acordo com a doutrina, o negócio jurídico indireto se diferencia da simulação porque naquele o resultado do negócio é desejado pelas partes, e, na simulação propriamente dita, isso não ocorreria – mas são diferenças bastante sutis.
Porém, tanto na simulação quanto no negócio jurídico indireto, o Fisco tem a prerrogativa de desconsiderar o negócio jurídico por entender que o único propósito do mesmo foi a economia de impostos. Assim, no exemplo acima, o Fisco desconsideraria o comodato vitalício, tratando a operação como doação e cobrando o imposto que entendesse devido.
A forma não usual, o negócio jurídico indireto e a cláusula que desnature os efeitos de um contrato típico dão margem para a anulação do ato jurídico e, numa primeira análise, é possível afirmar que existe aqui uma tentativa de fazer com que o contribuinte acabe produzindo prova contra ele mesmo, o que seria de uma constitucionalidade duvidosa, além de se estar, mais uma vez, à mercê da subjetividade do Fisco.
3º – tratar de atos ou negócios jurídicos específicos previstos em ato da Receita Federal do Brasil: este item dependerá da publicação de uma relação de atos e negócios jurídicos que a Receita Federal do Brasil entender relevantes, como operações de incorporação, fusão e cisão.
O art. 8º da citada Medida Provisória traz, ainda, a previsão de que a declaração do sujeito passivo que relatar atos ou negócios jurídicos ainda não ocorridos será tratada como consulta à legislação tributária.
Caso a Receita Federal do Brasil entenda não ser válido o negócio jurídico declarado, para fins tributários, o contribuinte será intimado a recolher, no prazo de 30 dias, os tributos devidos, acrescidos, neste primeiro momento, apenas de juros de mora (art. 9º).
Porém, chama-se a atenção para o disposto no parágrafo único do art. 9º, tendo em vista que o mesmo traz a previsão de que a exigência inicial apenas do principal e juros de mora só se aplica caso as operações não estejam sob procedimento de fiscalização.
O art. 11 prevê, ainda, que a declaração será ineficaz quando:
1. apresentada por quem não for o sujeito passivo das obrigações tributárias eventualmente resultantes das operações referentes aos atos ou negócios jurídicos declarados;
2. omissa em relação a dados essenciais para a compreensão do ato ou negócio jurídico;
3. contiver hipótese de falsidade material ou ideológica; e
4. envolver interposição fraudulenta de pessoas.
Nestes casos, restará caracterizada omissão dolosa do sujeito passivo com intuito de sonegação ou fraude e será exigido, além do imposto e juros, multa de ofício correspondente a 150%.
Salienta-se, ainda, que a forma com que esta declaração deverá ser apresentada será regulamentada pela Receita Federal do Brasil.
Com relação às taxas que terão o valor corrigido, destaca-se a taxa de fiscalização da vigilância sanitária, taxa de fiscalização da aviação civil, taxa de avaliação da conformidade do CONMETRO e INMETRO e taxa de serviço metrológico, e as taxas relacionadas ao registro e porte de arma de fogo.
Milene Regina Amoriello Spolador Ribeiros
Advogada atuante nas áreas tributária e empresarial, vogal do Conselho de Contribuintes e Recursos Fiscais do Estado do Paraná nos mandatos 2011/2013 e 2013/2015, graduada em direito pela Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro e pós graduada em Direito Empresarial com ênfase em Direito Tributário pela PUC/PR, autora de artigos jurídicos e pareceres, coordenadora da obra “Guia Prático Alianças Estratégicas com empresas Brasileiras: uma visão legal”.