Produção antecipada de provas e processo administrativo

Cristiano Cury Dib, Pedro Henrique Siqueira de Moraes

O presente artigo pretende analisar a possibilidade de realização da produção antecipada de provas previstas nos artigos 381 a 383 do Código de Processo Civil no curso do processo administrativo tributário sem que isso implique renúncia.

A questão é relevante e merece nossa detida atenção, uma vez que a Súmula 1 do Carf afirma tratar-se de renúncia à instância administrativa a propositura de qualquer demanda judicial pelo contribuinte, antes ou depois do lançamento tributário, verbis:

“Importa renúncia às instâncias administrativas a propositura pelo sujeito passivo de ação judicial por qualquer modalidade processual, antes ou depois do lançamento de ofício, com o mesmo objeto do processo administrativo, sendo cabível apenas a apreciação, pelo órgão de julgamento administrativo, de matéria distinta da constante do processo judicial.”

Em que pese afirmar-se que no processo administrativo impera o princípio da busca da verdade material, com isso não se pode concordar, uma vez que as ocorrências do mundo fenomênico se perdem no tempo e no espaço, de modo que somente mediante os relatos linguísticos temos acesso aos eventos do mundo social. Assim, o evento ocorrido no mundo social somente assume relevância jurídica mediante a edição da linguagem competente (prova) que constitua o fato jurídico.

Não é qualquer prova que o sistema processual atribui a aptidão para constituir fatos jurídicos, de maneira que no processo administrativo a verdade é aquela produzida por meio da linguagem das provas.

Porém, quem atua em ambiente conflituoso administrativo, muitas vezes vê tolhido o seu amplo direito à produção das provas.

Tome-se como exemplo a reiterada objeção à produção de prova pericial, ou quando se a permite restringe-se a designação de agente fiscal como perito, descredibilizando eventual opinião ante a falta de parcialidade almejada.

Isso implica reconhecer que, no processo administrativo, estimula-se apenas a produção de provas documentais atreladas com os argumentos aduzidos na peça de defesa.

Reputamos que saída para essa situação é o acionamento do Poder Judiciário para a produção antecipada de prova nos termos dos artigos 381 a 383 do Código de Processo Civil/2015.

A produção antecipada de provas pode ser requerida quando houver receio da impossibilidade ou dificuldade na verificação de certos fatos, possibilidade de a prova produzida viabilizar a autocomposição ou outro meio de solução da controvérsia ou prévio conhecimento dos fatos que possa justificar ou evitar o ajuizamento de uma demanda judicial [1].

Trata-se, portanto, de medida processual judicial que objetiva exclusivamente produzir prova, isto é, constituir fatos jurídicos, nada tratando a respeito de controvérsias a seu respeito, sobre a aplicação da legislação tributária e muito menos sobre obrigação tributária.

O objetivo da medida é confirmado diante dos termos do § 2º do artigo 382 do CPC/2015, segundo o qual o ato decisório não emite pronunciamento a respeito da ocorrência ou não do fato e nem sobre seus efeitos jurídicos [2].

Isso autoriza concluir que não há decisão sobre controvérsia tributária na produção antecipada de prova, o que afasta a possibilidade de aplicação da Súmula 1 do Carf, ou seja, de extinção do processo administrativo por concomitância.

É fácil notar a inaplicabilidade da referida súmula pois o objetivo do processo administrativo é anular o crédito tributário, enquanto o da ação é a produção de prova que servirá para a análise da questão controvertida travada no contencioso administrativo.

Em conclusão verifica-se a plena viabilidade da utilização da ação de produção antecipada de provas, sem que isso comprometa a análise da defesa do contribuinte, ao contrário, trata-se de importante instrumento de concretização do devido processo administrativo tributário.

[1] Art. 381. A produção antecipada da prova será admitida nos casos em que:
I – haja fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de certos fatos na pendência da ação;
II – a prova a ser produzida seja suscetível de viabilizar a autocomposição ou outro meio adequado de solução de conflito;
III – o prévio conhecimento dos fatos possa justificar ou evitar o ajuizamento de ação.

[2] Art. 382. (…)
§2º O juiz não se pronunciará sobre a ocorrência ou a inocorrência do fato, nem sobre as respectivas consequências jurídicas.

Cristiano Cury Dib, Pedro Henrique Siqueira de Moraes

Cristiano Cury Dib
é mestrando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet), professor seminarista do Curso de Especialização do Ibet e advogado.

Pedro Henrique Siqueira de Moraes
é mestrando em Direito Tributário pelo Ibet e advogado.

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