Receita limita uso de créditos por mineradoras
Por Beatriz Olivon — De Brasília
A Receita Federal esclareceu às mineradoras que despesas com a “descaracterização de barragens a montante” – desativação – não geram créditos de PIS e Cofins. Indiretamente, o entendimento aumenta a carga tributária dessas companhias. A resposta do Fisco consta na Solução de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit) nº 108, de 2025, que orienta os fiscais do país e, segundo tributaristas, pode ser um sinal de alerta para outros setores.
A empresa que fez a consulta está em processo de descaracterização de algumas barragens. Explicou à Receita que as barragens de rejeitos de mineração construídas pelo método a montante têm as estruturas de contenção construídas sobre os próprios rejeitos. Após acidentes recentes com barragens do tipo, ficou proibido o uso deste método de construção e tornou-se obrigatória a desativação das existentes.
A empresa argumentou ao Fisco que teria direito aos créditos porque, para cumprir a nova legislação regulatória e ambiental, precisa comprar uma série de bens e serviços como construção civil, demolição, estudos geológicos e reflorestamento.
Apontou ainda que esses bens e serviços estão inseridos no seu processo produtivo, sendo essenciais para a atividade principal, considerando-se as exigências normativas e a própria natureza da atividade mineradora.
Na solução de consulta, a Receita considera que a descaracterização de barragens construídas a montante resulte da vedação desse método construtivo por normas legais. Contudo, reforça fundamentos e conclusões adotados em uma outra Solução de Consulta Cosit, de nº 193, de 2024, que tratou da “desmobilização de minas já exauridas”.
Conforme o entendimento de 2024, nos casos de bens e serviços que a legislação específica exige que a companhia use em suas atividades, a permissão para o aproveitamento de créditos pela compra de insumos vale quanto “aos itens exigidos para que o bem produzido ou o serviço prestado possa ser disponibilizado para venda, ainda que já finalizada a produção ou prestação”.
“Porém, esta permissão não alcança as hipóteses nas quais a circunstância geradora dos dispêndios ocorre após a venda do produto ou a prestação do serviço”, afirma a Receita sobre os custos para a desativação de barragens. Para o Fisco, o uso de créditos de PIS/Cofins não é possível, nesse caso, porque são “despesas com itens estranhos à produção de bens destinados à venda ou à prestação de serviços”.
Para Tiago Severini, sócio do Vieira Rezende Advogados, “a Receita entende que sendo atividade feita depois de gerar receitas não gera créditos, como se essa atividade não fosse necessária, mas ela é”. “É obrigatório, tanto pela parte regulatória como pela ambiental”, acrescenta.
Segundo o advogado, a vedação ao uso de créditos desses gastos poderá atrapalhar novos investimentos. Isso porque, com o crédito não reconhecido, como a empresa já gerou receita, vai diminuir a margem. “E no projeto seguinte ela vai considerar que não tem direito ao crédito no final, o que aumenta o custo do projeto e, assim, ele pode não ser viável economicamente”, diz.
Por meio dessa mesma solução de consulta sobre descaracterização de barragens, a Receita Federal também dá uma sinalização negativa para a desativação referente a outras indústrias, como a de óleo e gás, segundo Severini. Ele explica que, nesse caso, as despesas também serão inevitavelmente posteriores ao momento de geração de receitas atreladas ao respectivo projeto.
O advogado Rubens Lopes, do escritório WFaria Advogados, também destaca que existem outros tipos de barragens e situações similares, que não estão expressos nessa análise da Receita mas podem ser abrangidos pelo mesmo entendimento. “Na prática, esses gastos [para a desativação] não estão embutidos nos gastos com o que se usa para extrair minério, mas é essencial para a atividade porque há uma obrigação regulatória”, afirma. “E sem o serviço, a barragem pode ceder e causar dano ambiental”, diz o advogado.
“Além disso, sendo essencial e relevante, conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), são insumos para fins de créditos de PIS e Cofins”, afirma Lopes REsp nº 1221170).
Por meio de nota, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) disse que as mineradoras estão custeando estas despesas, com o próprio caixa, “empenhadas em realizar a descaracterização nos prazos acordados com os órgãos responsáveis”. (Colaborou Jéssica Sant’ana)