STF retomará julgamento da Vale sobre tributação de lucros no exterior
Por Marcela Villar, Valor — São Paulo
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomará no mês que vem o julgamento do caso da Vale sobre a tributação de coligadas no exterior quando há tratados internacionais para afastar a bitributação. A análise ocorrerá entre os dias 6 e 13 de junho, no Plenário Virtual da Corte. O impacto para a União, em caso de derrota, é de R$ 22 bilhões, segundo anexo de riscos fiscais da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano de 2025.
O caso, apesar de não ter repercussão geral, será um importante precedente, pois impacta todas as multinacionais.
O placar está em dois votos a um para a Fazenda Nacional. Enquanto os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes foram a favor do governo federal, o relator, ministro André Mendonça, foi a favor da mineradora. O julgamento começou em maio do ano passado, mas foi interrompido por sucessivos pedidos de vista — o mais recente do ministro Nunes Marques, que será o primeiro a se manifestar quando o julgamento retomar.
A tese pode gerar um rombo de R$ 142,5 bilhões para a União, conforme estimativa da Receita Federal na Nota Cetad/Coest nº 14, de 2023. Os valores se referem à devolução ou perda de arrecadação de Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL entre os anos de 2017 e 2021. Também poderia reduzir o caixa da Fazenda Nacional em R$ 28,5 bilhões anualmente, como mostrou o Valor.
Os ministros julgam a validade da incidência do IRPJ e da CSLL sobre empresas nacionais a partir dos lucros de coligadas no exterior em países que têm tratados com o Brasil para evitar a dupla tributação. Segundo advogados, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é mais favorável ao contribuinte, reconhecendo a prevalência dos tratados internacionais.
É a primeira vez que o STF julgará o tema. Para o Fisco, não se está tributando o lucro das controladas no exterior, mas sim o da controladora no Brasil, que reflete o resultado contábil das empresas estrangeiras através do Método de Equivalência Patrimonial (MEP). O método, previsto na Medida Provisória (MP) nº 2158/2011, visa aferir o valor do investimento de uma empresa quando possui participação societária em outra.
Já a Vale questiona a “tributação automática” do IRPJ e CSLL sobre lucros auferidos por controladas da Bélgica, na Dinamarca, em Luxemburgo e nas Bermudas. Embora, as decisões de primeiro e segundo graus tenham sido favoráveis à União, o STJ reverteu o entendimento em parte – manteve a cobrança só nas Bermudas, pois não há acordo bilateral com o Brasil e é um paraíso fiscal.
Votação
Para os ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, o acréscimo patrimonial com o lucro das empresas no exterior é incorporado pela sociedade controladora ou coligada, no Brasil, antes da distribuição dos lucros. Por isso, não se trata de interpretação de tratados internacionais – seriam inaplicáveis ao caso.
“O que ocorre é uma tributação de um investimento auferido por meio de uma entidade relacionada no exterior a uma alíquota máxima brasileira ou estrangeira (a que for maior). Afinal, como o Brasil admite o crédito dos tributos pagos no exterior no limite dos valores devidos no Brasil, o que efetivamente é pago de imposto de renda e CSLL é a diferença entre a tributação estrangeira (caso ela seja inferior) e a brasileira”, afirma Mendes em seu voto.
Já o relator, André Mendonça, entendeu que a tese seria infraconstitucional. Mas se ficasse vencido nesse ponto, seria a favor da Vale. Para Mendonça, os tratados inviabilizam a tributação dos valores no Brasil.
“Ao se afastarem os efeitos do artigo 7º desses tratados, além do inadimplemento unilateral do pacto, frustra-se a confiança dos contribuintes que estruturaram suas operações à luz da legislação e da interpretação sobre ela vigentes ao tempo de suas operações. Dessarte, e por qualquer ângulo que se possa visualizar a questão, não colhe razão ao recurso da União”, diz o relator, no voto (RE 870214).