Lawtech usa data analytics para prever decisões tributárias bilionárias do STF
Por Laura Ignacio — São Paulo
No filme “Minority Report”, do diretor Steven Spielberg, estrelado por Tom Cruise, seres chamados de “precogs” previam assassinatos e a polícia prendia os futuros criminosos preventivamente, banindo esse tipo de crime da Washington do ano de 2054. Inspirada na película, com base em dados colhidos de quase cem experts, uma lawtech brasileira tem usado data analytics com jurimetria para tentar dar maior previsibilidade sobre causas tributárias bilionárias em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF).
Primeiro, a lawtech Turivius desenvolveu um sistema que faz a leitura de julgados de tribunais de segunda instância para apontar qual a probabilidade de vitória sobre uma determinada discussão judicial. “Por serem processos volumosos, eles permitem a análise estatística de uma série histórica, sobre temas específicos, para se chegar a uma probabilidade de êxito”, diz Danilo Limoeiro, CEO da Turivius Legal Intelligence. Há várias outras empresas de jurimetria no mercado.
Mais recentemente, em parceria com a Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L), a lawtech desenvolveu o Projeto Agatha. Trata-se de fazer um levantamento de dados que usa também a chamada “análise preditiva coletiva” para antecipar decisões judiciais complexas em temas tributários. Essa técnica já é usada pela CIA e o mercado financeiro, diz Limoeiro, ao reunir previsões de experts para resultados mais precisos.
“O papel da AB2L é incentivar inovação para todas as áreas do direito. Criamos um grupo de trabalho para mapear a questão da insegurança jurídica no Brasil e nasceu este projeto focado nos desafios na área tributária”, diz Daniel Marques, presidente da entidade.
Os “precogs” do Projeto Aghata são 94 tributaristas — advogados renomados, sócios de grandes escritórios e diretores de multinacionais —, com uma média de 13 anos de experiência na área. “Nossa estatística leva em consideração o nível de experiência dos respondentes: quanto mais anos atuando na área tributária, maior o peso atribuído à sua resposta”, explica Danilo Limoeiro.
Nas edições anteriores, diz ele, o Projeto Agatha atingiu uma taxa de acerto de 84% em decisões de grande impacto.
Agora, na 4ª rodada do projeto, a Turivius focou em temas tributários estratégicos, como a incidência de PIS/Cofins sobre receita de locação de bens móveis e imóveis (Temas 684 e 630 de repercussão geral), decisão que poderia gerar uma perda de R$ 36,2 bilhões para a União. Segundo a pesquisa, 67% dos especialistas acreditavam que o resultado seria contrário ao contribuinte, o que foi validado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Outro tema de destaque da pesquisa é a dedução de despesas com educação no IRPF, que discute a constitucionalidade das limitações impostas atualmente (ADI 4927). O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrou com ação direta de inconstitucionalidade sobre as restrições à dedução de gastos com ensino, uma discussão de impacto estimado em R$ 105 bilhões para a União. Nesse caso, 58% enxergam um desfecho favorável ao contribuinte.
Já quanto à discussão do PIS/Cofins sobre importação (Tema 79) e a retroatividade da Lei nº 10.865/2004, definindo valor aduaneiro — um tema que pode movimentar R$ 325 bilhões e impactar diretamente empresas importadoras do país — 51% dos especialistas do projeto apontam uma decisão contrária ao contribuinte.
O Projeto Aghata ainda analisou o processo no STF sobre a constitucionalidade da alíquota de 25% do IR na fonte sobre pensões e proventos de residentes no exterior (ADI 4927). Nesse caso, 53% acredita que o resultado será contrário ao contribuinte.
Por fim, sobre a exclusão do PIS/Cofins de sua própria base de cálculo, uma das teses filhote da “tese do século”, cujo impacto estimado é de R$ 65,7 bilhões, 51% dos pesquisados no Projeto Aghata apostam que o julgamento será favorável ao contribuinte (Tema 1067).