STJ vai analisar regras do Perse por meio de recursos repetitivos

Por Luiza Calegari e Arthur Rosa — De São Paulo O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar como repetitivos recursos que discutem dois pontos importantes do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse): se é necessário o contribuinte estar previamente inscrito no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), do Ministério do Turismo, para poder usufruir dos benefícios previstos e se os optantes do Simples Nacional também têm direito à alíquota zero de Imposto de Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins. Essas questões serão definidas pelos ministros da 1ª Seção. O Perse foi criado por meio da Lei nº 14.148, de 2021, para compensar os setores de eventos e turismo pelo impacto financeiro causado pelas medidas de isolamento social decretadas em razão da pandemia da covid-19. Além da alíquota zero dos tributos federais, o programa estabeleceu o parcelamento de débitos tributários e de FGTS em 145 meses, com até 70% de desconto. Com a regulamentação da norma que, segundo especialistas, acresceram exigências não previstas, e alterações trazidas por novas leis do Perse – nº 14.592, de 2023, e nº 14.859, editada neste ano -, vários pontos do programa foram questionados na Justiça. Esses dois abrangidos pelos recursos repetitivos, afirmam, são apenas parte do problema. A exigência do Cadastur, por exemplo, foi levada ao Judiciário antes da edição das novas leis por duas associações de bares e restaurantes, a Associação Nacional de Restaurantes (ANR) e a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel). Foram ajuizadas, segundo o advogado que as defende, Sandro Machado dos Reis, sócio do Bichara Advogados, quatro ações, duas para cada entidade – uma para empresas nos regimes do lucro presumido e real e outra para as que estão no Simples. Há, por ora, uma sentença favorável ao setor, concedida pela 5ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte, que beneficia as empresas no lucro real e lucro presumido. O juiz Fabiano Verli entendeu que quando o Ministério da Economia, por meio da Portaria ME 7.163/21, além de prever as atividades (CNAEs) habilitadas ao benefício, estabeleceu a exigência de prévia regularidade no Cadastur, “extrapolou o poder regulamentar atribuído pela lei, razão pela qual tal disposição padece de vício” (processo nº 1031844-60.2022.4.01.3800). Para Reis, ambos os temas elencados pelo STJ “são muito relevantes para os contribuintes”. Na lei [nº 14.148, de 2021], não houve qualquer restrição, especialmente no que se refere ao Cadastur”, diz ele, acrescentando que, porém, “o tema relativo a ilegalidade de atos infralegais que impuseram a segregação de receitas não está dentre os temas afetados”. O advogado Ilan Gorin, da Gorin Advocacia, lembra que esse tema estava entre os que o presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, listou para julgamento por meio de recursos repetitivos. Sugeriu-se abordar se a Instrução Normativa nº 2.114, de 2022, editada pela Receita Federal, teria promovido restrições indevidas, por excluir as optantes do Simples Nacional e dispor sobre quais receitas poderiam ser incluídas no Perse. “São restrições que não estão previstas na lei original do Perse”, afirma o advogado, que espera que a discussão sobre a possibilidade de uma empresa mista ter o direito ao benefício fiscal sobre todo o seu faturamento esteja no voto da relatora da proposta de afetação, a ministra Maria Thereza de Assis Moura, que ainda será publicado. Gorin ainda tem a expectativa de que sejam acrescentados ao julgamento dois temas importantes, “por estarem interligados”: a omissão dos CNAEs das atividades indiretas e a manutenção do benefício original por cinco anos – discussão que envolve o artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN). A decisão de afetar como repetitivos os recursos sobre o Perse – seis no total- foi definida em sessão virtual realizada entre os dias 11 e 17 (REsp 2144088). A decisão, quando tomada, deverá ser seguida por todas as instâncias do Judiciário. Ambos os temas são muito relevantes para os contribuintes” — Sandro M. dos Reis O julgamento do STJ, lembram advogados, pode impactar o programa de autorregularização lançado pela Receita Federal – Lei nº 14.859, de maio. O prazo para adesão vai até 18 de novembro. Podem ser incluídos os débitos apurados entre março de 2022 e maio deste ano do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Embora não haja estimativas de arrecadação ou do volume de empresas em situação irregular, a Receita Federal divulgou que as isenções relacionadas a esse programa chegaram a R$ 7,9 bilhões no acumulado de janeiro a junho deste ano. Para Gabriel Paranaguá, sócio do Felsberg Advogados, a afetação de recursos especiais pelo STJ poderá desestimular a adesão por contribuintes que eventualmente sejam impactados pelo posicionamento que será adotado pelos ministros. “Aqueles que eventualmente tenham aplicado o Perse às atividades restringidas sem base legal, poderão desistir de seguir com a autorregularização e aguardar a decisão do STJ para confirmar se estavam certas ou não em sua interpretação”, diz. Frederico Bastos, sócio do escritório BVZ Advogados, afirma que a afetação deve influenciar a decisão principalmente dos contribuintes que estão no regime do Simples e os que não tinham inscrição prévia no Cadastur. “Isso porque a decisão do repetitivo recairá sobre esses dois pontos específicos.” Eduardo Rehder Galvão, do GBA Advogados Associados, entende, porém, que o julgamento do STJ “não influirá na tomada de decisão do empresário que optou lá atrás em correr o risco inserindo sua empresa em um programa que ele sabia que não fazia jus ou que ele entendia que poderia ser questionado”. “O que aconteceu no Perse é um fenômeno tipicamente brasileiro. Empresas sabiam que estavam aderindo a um regime tributário que exigia critérios que elas não atendiam. Uma medida emergencial que foi adotada por alguns para tentar reduzir a tributação, mesmo sabendo que, no futuro, poderia existir questionamentos por parte da Receita Federal. Essas empresas vão aderir ao programa de autorregularização”, afirma o advogado. Para aderir, é preciso quitar 50% do montante devido do imposto à vista. O restante pode ser parcelado em até 48 vezes. Não incidirá nenhum juro de mora ou multa sobre o valor devido, e as empresas podem usar o prejuízo fiscal e a base de cálculo negativa da CSLL convertido em crédito para abater até metade do valor da dívida consolidada.

Fonte: Valor Econômico

Data da Notícia: 19/09/2024 00:00:00

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