Agro, comércio e serviço podem pagar a conta da indústria na reforma tributária

Ives Gandra da Silva Martins

A Câmara dos Deputados reformulou consideravelmente a PEC 45, mas manteve intacto o seu número para não dar a impressão de uma nova proposta ao projeto constitucional. Teve o poderoso apoio da indústria brasileira, única a ser beneficiada com redução da sua carga tributária, e, com forte protagonismo do presidente da Câmara, conseguiu aprovar em primeira discussão o novo regime tributário para o país, sem obedecer, para o segundo turno, a aprovação após cinco dias, fazendo sua ratificação em poucas horas.

A ideia básica da proposta seria simplificar o sistema de tributação circulatória de bens e serviços com uma única alíquota sem exceções, em torno de 25%, substituindo os antigos tributos ICMS, ISS, PIS/Cofins pelo novo com o duplo nome de CBS e IBS, e transformando o IPI num imposto seletivo.

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Por prever o sistema de incidência no destino e a dualidade de imposição da União (CBS), Estados e Municípios (IBS), criou-se um Conselho Federativo com poderes impositivos substitutivos da competência de tributos de 26 estados, Distrito Federal e 5.570 municípios.

Tal novo poder impositivo de um conselho constituído de 26 estados, DF e 28 representantes dos 5.570 municípios definirá, de acordo com a PEC, as regras do novo tributo em consonância com a União no CBS, tornando-o, também, agente receptor e distribuidor do novo tributo, cabendo às entidades federativas apenas o direito de alterar as alíquotas, se quiserem, deixando, pois, de terem a competência plena que tinham.

Para a simplificação, que seria o objetivo maior do novo sistema, como mostrou Everardo Maciel em recente artigo, triplicaram os artigos da Constituição dedicadas à matéria tributária e mantiveram vigente o sistema atual até 2033, devendo conviver com o CBS a partir de 2026 e o IBS a partir de 2029. Vale dizer, para simplificar, criaram um sistema que vigorará junto com o atual pelos próximos dez anos.

Felipe Salto, em artigo recente, mostrou que PIS/Cofins, ICMS e ISS representam aproximadamente 11,8% do PIB e que a alíquota única para manter o mesmo nível de arrecadação com um imposto sem tratamentos especiais, deveria ser de 23,6% (CBS/ IBS).

Foram, todavia, abertas inúmeras exceções para a agropecuária, educação, saúde, clubes esportivos, igrejas, parques e restaurantes, com o que esta alíquota do novo IVA brasileiro deverá estar em torno de 33,5%.

Novas pressões deverão ocorrer no Senado. O setor de serviços perde o ISS de no máximo 5% e de Cofins cumulativo de 3%, além do PIS, e suportará, possivelmente, 33,5% no mais alto IVA do mundo.

Fundos compensatórios serão criados, sendo que muitos estados e municípios serão beneficiados com o novo sistema e os que perderem receitas serão compensados pela União. Quando uns ganham e outros não perdem, quem terá que suportar este aumento deverá ser o contribuinte.

Tudo o que escrevi são suposições, pois apesar do cinematográfico aumento dos dispositivos constitucionais, não se tem nenhum projeto de lei complementar ou de legislação originária para saber como, nos detalhes, funcionará a nova estrutura tributária e muito menos as projeções financeiras de quem ganha, de quem perde e da alíquota básica.

Por esta razão, em recente Congresso Tributário do Instituto Geraldo Ataliba, a esmagadora maioria dos conferencistas, todos de renome nacional e internacional, condenou o açodamento da aprovação da reforma sem os referidos textos, sobre colocar em dúvida que o sistema proposto seria mais simples, mas tendo a certeza que a agropecuária, comércio e serviços serão pesadamente tributados para beneficiarem-se, com redução, a indústria e, indiretamente, o sistema financeiro.

Ives Gandra da Silva Martins

Professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da Universidade do Minho (Portugal), presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP, ex-presidente da Academia Paulista de Letras (APL) e do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp).

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